Derrota
com sabor de vitória
Pedro J. Bondaczuk
Os ditadores de todos os matizes ideológicos têm um
talento todo especial para distorcer a verdade. Aliás, é através desse
expediente que conseguem tapear as pessoas de boa fé acerca da sua
"sinceridade". Por isso, perseguem os mais esclarecidos, colocando-os
em prisões, quando não dando cabo de suas vidas. É por meio de engodos, por
exemplo, que conseguem negar até mesmo o caráter tirânico e ditatorial dos seus
regimes.
O presidente chileno, Augusto Pinochet, por exemplo,
durante a recente campanha para o plebiscito da semana passada, assegurou, na
televisão, que não era um ditador. E pela expressiva votação que conseguiu
nesse referendo, conclui-se que uma quantidade muito alta de chilenos acreditou
em suas assertivas.
Agora, o governo do general está tentando subverter
até os princípios da matemática. Garante que foi o vencedor da votação da
semana passada, já que o atual mandatário, sozinho, conseguiu quase o mesmo
número de votos que os 16 partidos oposicionistas reunidos.
Só que o Palácio de la Moneda não menciona o fato de
que, escudado num dispositivo de uma Constituição que ele próprio elaborou,
Pinochet saiu como candidato único. Portanto, não estava disputando com nenhum
"nome" opositor. O plebiscito era simplesmente para aceitar ou
rejeitar seu continuísmo. E o povo chileno rechaçou sua pretensão de permanecer
governando a nação até 1997.
É escusado dizer que num regime como o que vigora
nesse país, a oposição tem uma tarefa monumental pela frente. A vitória do
"não" está longe de ter significado o fim da ditadura. Os 16 partidos
que compuseram a frente que levou a tese do não-continuísmo ao sucesso, não
poderá se fraccionar, sob pena de, numa manobra qualquer, o general-presidente se
lançar como candidato em 1989 e ganhar o pleito.
Nenhum observador político tem dúvidas em assegurar
que o mandatário não vai largar o poder com tamanha facilidade. Se é que o vai
deixar. Portanto, as querelas, as "picuinhas" sem grande importância
e as ambições pessoais dos dirigentes oposicionistas terão que ficarf para
quando o país estiver completamente redemocratizado.
Qualquer ação que rompa essa norma será fatal.
Pinochet argumentou, para dizer que não era ditador, que nenhum caudilho leva a
efeito um plebiscito, como o acontecido na semana passada, por temer o veredito
das urnas. Ferdinand Marcos, nas Filipinas, no entanto, cansou de lançar mão
desse expediente. Nas várias Repúblicas marxistas da África, esse recurso tem
sido fartamente usado por tiranos, detentores de máquinas poderosas e de um
aparato de comunicação magnífico, para permanecer em seus postos. Portanto, é
mister que a oposição chilena não se desmobilize. E, com prudência, sabedoria
política e espírito cívico, reponha o Chile no caminho sadio da autêntica
democracia.
(Artigo publicado na página 13, Internacional, do
Correio Popular, em 11 de outubro de 1988)
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