Tuesday, January 13, 2015

Derrota com sabor de vitória


Pedro J. Bondaczuk


Os ditadores de todos os matizes ideológicos têm um talento todo especial para distorcer a verdade. Aliás, é através desse expediente que conseguem tapear as pessoas de boa fé acerca da sua "sinceridade". Por isso, perseguem os mais esclarecidos, colocando-os em prisões, quando não dando cabo de suas vidas. É por meio de engodos, por exemplo, que conseguem negar até mesmo o caráter tirânico e ditatorial dos seus regimes.

O presidente chileno, Augusto Pinochet, por exemplo, durante a recente campanha para o plebiscito da semana passada, assegurou, na televisão, que não era um ditador. E pela expressiva votação que conseguiu nesse referendo, conclui-se que uma quantidade muito alta de chilenos acreditou em suas assertivas.

Agora, o governo do general está tentando subverter até os princípios da matemática. Garante que foi o vencedor da votação da semana passada, já que o atual mandatário, sozinho, conseguiu quase o mesmo número de votos que os 16 partidos oposicionistas reunidos.

Só que o Palácio de la Moneda não menciona o fato de que, escudado num dispositivo de uma Constituição que ele próprio elaborou, Pinochet saiu como candidato único. Portanto, não estava disputando com nenhum "nome" opositor. O plebiscito era simplesmente para aceitar ou rejeitar seu continuísmo. E o povo chileno rechaçou sua pretensão de permanecer governando a nação até 1997.

É escusado dizer que num regime como o que vigora nesse país, a oposição tem uma tarefa monumental pela frente. A vitória do "não" está longe de ter significado o fim da ditadura. Os 16 partidos que compuseram a frente que levou a tese do não-continuísmo ao sucesso, não poderá se fraccionar, sob pena de, numa manobra qualquer, o general-presidente se lançar como candidato em 1989 e ganhar o pleito.

Nenhum observador político tem dúvidas em assegurar que o mandatário não vai largar o poder com tamanha facilidade. Se é que o vai deixar. Portanto, as querelas, as "picuinhas" sem grande importância e as ambições pessoais dos dirigentes oposicionistas terão que ficarf para quando o país estiver completamente redemocratizado.

Qualquer ação que rompa essa norma será fatal. Pinochet argumentou, para dizer que não era ditador, que nenhum caudilho leva a efeito um plebiscito, como o acontecido na semana passada, por temer o veredito das urnas. Ferdinand Marcos, nas Filipinas, no entanto, cansou de lançar mão desse expediente. Nas várias Repúblicas marxistas da África, esse recurso tem sido fartamente usado por tiranos, detentores de máquinas poderosas e de um aparato de comunicação magnífico, para permanecer em seus postos. Portanto, é mister que a oposição chilena não se desmobilize. E, com prudência, sabedoria política e espírito cívico, reponha o Chile no caminho sadio da autêntica democracia.

(Artigo publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 11 de outubro de 1988)


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