Reforma vira ajuste
Pedro J. Bondaczuk
A reforma tributária de que o
País carece, que simplifique o sistema de arrecadação, reduza a
carga de tributos sobre as atividades produtivas e estabeleça uma
justiça fiscal, vai ficar, mesmo, para a revisão constitucional de
outubro. Este projeto que está tramitando no Congresso, aos trancos
e barrancos, pode ser classificado, quando muito, de um ajuste.
Seu objetivo é claro:
conseguir alguns trocadinhos a mais para os tão depauperados cofres
públicos para o que o governo quer lançar mão de um expediente já
bastante antigo, embora prestes a ser adotado pela primeira vez entre
nós. Refiro-me à criação do polêmico e de duvidosa eficácia
Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira, o tão comentado
IPMF.
A Argentina tentou usar essa
tributação sobre cheques como tributo único, e não funcionou.
Segundo a lógica do que se convencionou chamar de “efeito Orloff”
– cujo nome deriva de uma brincadeira que diz que os argentinos
bebem e nós brasileiros é que temos a ressaca – provavelmente o
resultado no Brasil será igualmente decepcionante.
Só não vai ser desastroso
porque não irá substituir nenhum dos impostos já existentes. E
muito menos será único. Vai ser somente um a mais a atormentar a
vida do cidadão, principalmente daquele que é tributado na fonte e
não consegue escapar de pagar tudo o que o governo inventa.
A propósito do “efeito
Orlof”, convém ressaltar que, desde 1985, a partir da chamada Nova
República, o País vem imitando sempre o que a Argentina tenta, em
matéria de alquimia econômica. Quando nossos irmãos portenhos
criaram o austral, de curta existência, surgiu, entre nós, o
cruzado. Em ambos os casos, as novas moedas foram acompanhadas de
respectivos choques, com direito a congelamento de preços e salários
e tudo o mais.
Tempos após ser decretado o
pacote de verão na Argentina, lá fomos nós atrás de imitação. E
os dois fracassaram. Acerca do ajuste fiscal, não se pode negar que
o governo tem necessidade de fazer caixa para evitar mais emissões
de cruzeiros e novos déficits e, conseqüentemente, uma aceleração
ainda mais aguda da inflação.
Todavia, diz a prudência, a
providência que deveria ser tomada é o combate sem tréguas à
sonegação. A própria Receita Federal estimou que, para cada
cruzeiro arrecadado, outro é sonegado. É demais!
Ninguém gosta de pagar
imposto, caso contrário ele não teria este nome, que significa algo
forçado, fruto de coação. Seu sinônimo, o tributo, originou-se,
conforme Aurélio Buarque de Holanda , em seu dicionário, do termo
latino “tributu”, cujo significado original é “riquezas que um
Estado paga a outro em sinal de dependência”.
A resistência ao pagamento
cresceu mais ainda, ela que em condições normais já não é
pequena, depois dos recentes escândalos que redundaram, inclusive,
no impeachment do ex-presidente Fernando Collor. É claro que o
governo precisa de recursos para cumprir seu papel. Só que, para a
sociedade ficar convencida de que deve arcar com ônus maior do que
aquele com o qual já arca, é indispensável que o Estado preste
contas de cada centavo arrecadado e informe para onde é destinado.
Ou seja, que o governo readquira (ou conquiste) um mínimo de
credibilidade.
(Artigo publicado na página
2, Opinião, do Correio Popular, em 3 de fevereiro de 1993).
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