Thursday, July 06, 2017

Reforma vira ajuste

Pedro J. Bondaczuk

A reforma tributária de que o País carece, que simplifique o sistema de arrecadação, reduza a carga de tributos sobre as atividades produtivas e estabeleça uma justiça fiscal, vai ficar, mesmo, para a revisão constitucional de outubro. Este projeto que está tramitando no Congresso, aos trancos e barrancos, pode ser classificado, quando muito, de um ajuste.

Seu objetivo é claro: conseguir alguns trocadinhos a mais para os tão depauperados cofres públicos para o que o governo quer lançar mão de um expediente já bastante antigo, embora prestes a ser adotado pela primeira vez entre nós. Refiro-me à criação do polêmico e de duvidosa eficácia Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira, o tão comentado IPMF.

A Argentina tentou usar essa tributação sobre cheques como tributo único, e não funcionou. Segundo a lógica do que se convencionou chamar de “efeito Orloff” – cujo nome deriva de uma brincadeira que diz que os argentinos bebem e nós brasileiros é que temos a ressaca – provavelmente o resultado no Brasil será igualmente decepcionante.

Só não vai ser desastroso porque não irá substituir nenhum dos impostos já existentes. E muito menos será único. Vai ser somente um a mais a atormentar a vida do cidadão, principalmente daquele que é tributado na fonte e não consegue escapar de pagar tudo o que o governo inventa.

A propósito do “efeito Orlof”, convém ressaltar que, desde 1985, a partir da chamada Nova República, o País vem imitando sempre o que a Argentina tenta, em matéria de alquimia econômica. Quando nossos irmãos portenhos criaram o austral, de curta existência, surgiu, entre nós, o cruzado. Em ambos os casos, as novas moedas foram acompanhadas de respectivos choques, com direito a congelamento de preços e salários e tudo o mais.

Tempos após ser decretado o pacote de verão na Argentina, lá fomos nós atrás de imitação. E os dois fracassaram. Acerca do ajuste fiscal, não se pode negar que o governo tem necessidade de fazer caixa para evitar mais emissões de cruzeiros e novos déficits e, conseqüentemente, uma aceleração ainda mais aguda da inflação.

Todavia, diz a prudência, a providência que deveria ser tomada é o combate sem tréguas à sonegação. A própria Receita Federal estimou que, para cada cruzeiro arrecadado, outro é sonegado. É demais!

Ninguém gosta de pagar imposto, caso contrário ele não teria este nome, que significa algo forçado, fruto de coação. Seu sinônimo, o tributo, originou-se, conforme Aurélio Buarque de Holanda , em seu dicionário, do termo latino “tributu”, cujo significado original é “riquezas que um Estado paga a outro em sinal de dependência”.

A resistência ao pagamento cresceu mais ainda, ela que em condições normais já não é pequena, depois dos recentes escândalos que redundaram, inclusive, no impeachment do ex-presidente Fernando Collor. É claro que o governo precisa de recursos para cumprir seu papel. Só que, para a sociedade ficar convencida de que deve arcar com ônus maior do que aquele com o qual já arca, é indispensável que o Estado preste contas de cada centavo arrecadado e informe para onde é destinado. Ou seja, que o governo readquira (ou conquiste) um mínimo de credibilidade.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 3 de fevereiro de 1993).



Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk

No comments: