Neoliberalismo e modernidade
Pedro J. Bondaczuk
A iminência da votação na
Câmara dos Deputados da autorização ou não para o Senado
instaurar um processo de impeachment contra o presidente Fernando
Collor, por seu suposto envolvimento no escândalo PC Farias,
prevista para ocorrer na próxima semana, e a possibilidade do
afastamento por 180 dias do chefe do Poder Executivo levam muita
gente a especular sobre o perfil político do vice-presidente Itamar
Franco.
O que se pode esperar dele
caso venha a assumir a Presidência? Qual será sua política
econômica? Qual o destino do processo modernizante ensaiado no atual
governo? São questões importantes que se impõem na atualidade.
Itamar sempre foi tido como
nacionalista ortodoxo e defensor da presença do Estado na economia.
O vice-presidente, porém, em entrevista concedida no domingo ao
"Jornal do Brasil", negou que seja esta a sua postura.
Autodefiniu-se como um "neoliberal", termo que está muito
em moda.
Fala-se muito em
neoliberalismo, em modernidade, em mercado, como se fossem palavras
mágicas, "abra cadabras" que, de repente, seriam capazes
de, num piscar de olhos, acabar com o caos social existente no País.
Poucos, no entanto, se arriscam a explicar o que para eles esses
conceitos significam.
O mundo, nestes anos finais do
segundo milênio da era cristã, caracterizados por um vazio de
lideranças e, principalmente, por uma certa falência de esperanças
--- após 92 anos tidos como os mais violentos e contraditórios da
História --- vive um momento de questionamento.
Daquilo que for feito agora
dependerá o tipo de vida das gerações futuras. Como viverão
nossos filhos e netos? Habitarão um planeta razoavelmente
preservado, equilibrado e com um pouquinho de justiça social, ou
batalharão numa selva, ressequida e emporcalhada, onde milhões,
quiçá bilhões de seres famintos e esqueléticos disputarão a
dentadas seus alimentos?
Que tipo de civilização
pretendemos construir? A seqüencia da atual, onde 3,7 bilhões de
indivíduos só têm obrigações e dissabores para satisfazer os
caprichos e os luxos dos outros 1,8 bilhão, tendo que se contentar
com os restos que esses privilegiados lhes destinam?
É evidente que uma comunidade
caótica, desse tipo, não terá como se manter, nem a poder de
armas. Não há força capaz de deter por muito tempo o desespero.
O presidente dos Laboratórios
B. Braun, Mário Kossatz, em entrevista publicada na revista
"Inovação Empresarial", coloca com rara lucidez essa
questão, válida tanto para o Brasil, quanto para o restante da
humanidade.
"A indiferença, a
omissão, a intolerância, a corrupção e a violência
institucionais , o vazio ético e existencial, a miséria e a fome
estão por demais presentes no mundo de hoje, exigindo uma profunda
reflexão sobre a natureza e os caminhos da modernidade pretendida.
Uma sociedade moderna deve ser, antes de mais nada, uma sociedade
justa, livre, avessa à violência e voltada para o pleno
desenvolvimento de todos os seus cidadãos", assinala o
empresário.
Tomara que seja esse, também,
o entendimento de Itamar Franco sobre o neoliberalismo e que se
empenhe em aplicar os saudáveis princípios de justiça social caso
substitua Collor no poder.
(Artigo publicado na página
2, Opinião, do Correio Popular, em 23 de setembro de 1992).
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