Wednesday, July 26, 2017

Neoliberalismo e modernidade


Pedro J. Bondaczuk


A iminência da votação na Câmara dos Deputados da autorização ou não para o Senado instaurar um processo de impeachment contra o presidente Fernando Collor, por seu suposto envolvimento no escândalo PC Farias, prevista para ocorrer na próxima semana, e a possibilidade do afastamento por 180 dias do chefe do Poder Executivo levam muita gente a especular sobre o perfil político do vice-presidente Itamar Franco.

O que se pode esperar dele caso venha a assumir a Presidência? Qual será sua política econômica? Qual o destino do processo modernizante ensaiado no atual governo? São questões importantes que se impõem na atualidade.

Itamar sempre foi tido como nacionalista ortodoxo e defensor da presença do Estado na economia. O vice-presidente, porém, em entrevista concedida no domingo ao "Jornal do Brasil", negou que seja esta a sua postura. Autodefiniu-se como um "neoliberal", termo que está muito em moda.

Fala-se muito em neoliberalismo, em modernidade, em mercado, como se fossem palavras mágicas, "abra cadabras" que, de repente, seriam capazes de, num piscar de olhos, acabar com o caos social existente no País. Poucos, no entanto, se arriscam a explicar o que para eles esses conceitos significam.

O mundo, nestes anos finais do segundo milênio da era cristã, caracterizados por um vazio de lideranças e, principalmente, por uma certa falência de esperanças --- após 92 anos tidos como os mais violentos e contraditórios da História --- vive um momento de questionamento.

Daquilo que for feito agora dependerá o tipo de vida das gerações futuras. Como viverão nossos filhos e netos? Habitarão um planeta razoavelmente preservado, equilibrado e com um pouquinho de justiça social, ou batalharão numa selva, ressequida e emporcalhada, onde milhões, quiçá bilhões de seres famintos e esqueléticos disputarão a dentadas seus alimentos?

Que tipo de civilização pretendemos construir? A seqüencia da atual, onde 3,7 bilhões de indivíduos só têm obrigações e dissabores para satisfazer os caprichos e os luxos dos outros 1,8 bilhão, tendo que se contentar com os restos que esses privilegiados lhes destinam?

É evidente que uma comunidade caótica, desse tipo, não terá como se manter, nem a poder de armas. Não há força capaz de deter por muito tempo o desespero.

O presidente dos Laboratórios B. Braun, Mário Kossatz, em entrevista publicada na revista "Inovação Empresarial", coloca com rara lucidez essa questão, válida tanto para o Brasil, quanto para o restante da humanidade.

"A indiferença, a omissão, a intolerância, a corrupção e a violência institucionais , o vazio ético e existencial, a miséria e a fome estão por demais presentes no mundo de hoje, exigindo uma profunda reflexão sobre a natureza e os caminhos da modernidade pretendida. Uma sociedade moderna deve ser, antes de mais nada, uma sociedade justa, livre, avessa à violência e voltada para o pleno desenvolvimento de todos os seus cidadãos", assinala o empresário.

Tomara que seja esse, também, o entendimento de Itamar Franco sobre o neoliberalismo e que se empenhe em aplicar os saudáveis princípios de justiça social caso substitua Collor no poder.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 23 de setembro de 1992).



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