Insatisfação sem fim
Pedro J. Bondaczuk
O sucesso – já escrevi inúmeras vezes, mas faço questão de
reiterar o quanto julgar oportuno – ou seja, o reconhecimento
público do nosso valor pessoal ou de alguma obra que eventualmente
tenhamos produzido, é, quase sempre, sumamente caprichoso. Em
determinadas circunstâncias, tarda a chegar e é possível (ou
provável?) que pareça que não chegará nunca. Não raro, ocorre
quando não mais podemos gozar a inenarrável sensação de triunfo,
ou seja, postumamente, o que é uma ironia da vida.
Mas, se o que fizermos tiver, de fato, qualidade (ou, principalmente,
utilidade), se nossa realização vier a se destacar de obras
semelhantes, porém inferiores em um (ou em vários) determinado
detalhe, produzidas por outros, ou se for originalíssima, jamais
conseguida por ninguém, o sucesso raramente deixa de acontecer. É
até questão matemática, de probabilidade. É como somar um mais
um: o resultado correto será sempre dois.
Destaco que a obra em questão sequer precisa ser material, ou seja,
uma edificação, uma teoria, uma descoberta, um livro, uma pintura,
uma sinfonia etc.etc.etc. Pode ser uma vida exemplar e sem máculas
(o que é, até, muito mais raro do que um feito científico,
artístico ou de qualquer outra natureza).
Para sermos bem-sucedidos, não devemos ter pressa em definir (ou em
concluir) um projeto de vida que se transforme no nosso legado à
posteridade. Além disso, temos que ser sumamente rigorosos com
nossos atos, pensamentos e sentimentos, implacáveis até, mais
críticos em relação a eles do que poderia ser nosso mais acérrimo
adversário.
A autocomplacência, quase sempre, tende a nos ser danosa e conduzir
a equívocos irreparáveis, sem conserto ou emendas. Por causa da
vaidade, portanto, podemos arruinar toda uma obra (ou uma vida) que
tinha tudo para ser perfeita. Não raro o fazemos.
Não podemos perder de vista a realidade de que, duremos o quanto
durarmos, não somos mais do que casuais passageiros, meros turistas
neste mundo ora maravilhoso e cheio de mistérios, ora hostil e
assustador. Temos que nos lembrar, sempre e sempre, se preciso todos
os dias, que a qualquer momento, num piscar de olhos, podemos deixar
de existir. E que, se não justificarmos, de alguma forma, nossa
passagem por aqui, corremos o risco de, passados alguns anos (ou
meros meses, não raro) não restar o mínimo vestígio de nós em
lugar algum.
É uma possibilidade que nos dói, mas é real. Podemos (ao menos em
teoria) modificar isso de alguma maneira. Claro que é irreal, por
ser impossível, aspirar à imortalidade física. Mas temos condições
de imortalizar a memória. Como? Mediante obras e, sobretudo, uma
vida exemplar.
Queiramos ou não, começamos a morrer já a partir do nascimento. A
distância do berço à tumba é curtíssima, mesmo que leve um
século para ser percorrida. Quando nascemos, começa uma contagem
regressiva ininterrupta, que não sabemos o quanto irá durar. Pode
ter a duração de cem anos, ou pouco mais, como pode acabar na
semana seguinte, no próximo dia, na próxima hora ou, quem sabe, no
próximo minuto. Mesmo quando o processo é lento, reitero, é
impossível de ser detido. É inexorável.
Tardamos a compreender (e alguns não compreendem nunca) que não
estamos no mundo para “juntar” bugigangas, que entendemos que
sejam (e denominamos de) riquezas. Nunca, em lugar algum e em
circunstância nenhuma, alguém levou (e nós também não levaremos)
qualquer objeto material, por mais valor que lhe emprestemos, para
além-túmulo. E mesmo que levássemos... eles de nada nos serviriam.
Viemos ao mundo, pelo contrário, para “espalhar”, repartir,
semear, partilhar, deixar: obras, conceitos, ideias, pensamentos e,
sobretudo, exemplos. Quanto mais fizermos isso, mais perto do
sucesso, como o entendo, estaremos. Nossas possibilidades de
perpetuação da memória crescerão exponencialmente, embora jamais
haja a mínima certeza de que isso venha, de fato, a acontecer.
O verdadeiro sucesso não é aquele comparável a um raio, em noite
de tempestade. Não brilha, rapidamente, como um piscar de olhos, no
céu, para depois desaparecer. A este tipo de êxito, eventual e
fugaz, costumo denominar de “brilhareco”. O sucesso que importa é
como os raios do sol. É como o brilho das estrelas. Supera o tempo,
as eras, as gerações e o esquecimento. Não se ofusca jamais, não,
pelo menos, enquanto existir o universo. É este o sucesso que
aspiro, mesmo que minhas chances sejam remotíssimas, ínfimas, quase
nulas, não mais do que mera possibilidade estatística. Daí
cultivar essa minha insatisfação sem fim…
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