Friday, July 07, 2017

Inelegibilidade de Collor



Pedro J. Bondaczuk



O empate, no Supremo Tribunal Federal, no julgamento do mandado de segurança contra a inelegibilidade do ex-presidente Fernando Collor, constituiu-se na mais recente decepção para aqueles que julgavam que o País, finalmente, havia resolvido de vez moralizar a vida pública.

Faz sentido, porém, a argumentação dos advogados Evandro Lins e Silva e Saulo Ramos, de que a indecisão do STF, por si mesma, já significa uma sentença. Representa que o recurso impetrado contra a decisão adotada pelo Senado há um ano não foi acolhido. Seria dispensável, por conseguinte, a convocação dos três juizes do Superior Tribunal de Justiça para que desempatassem a questão.

Por que protelar o caso até fevereiro (quando termina o recesso do Judiciário) num momento particularmente delicado da vida nacional? Como deixar de acatar o veredito dos senadores, que tornou Collor inelegível por oito anos? A argumentação dos advogados do ex-presidente é a de que se tratou de um “julgamento político”.

Todos os que envolvem figuras públicas, mormente a autoridade máxima da Nação, têm tal característica, aqui e em qualquer outro país. A indecisão do STF, somada aos visíveis e ostensivos boicotes à Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga o esquema de corrupção montado para manipular o Orçamento da União, aumenta o desencanto dos brasileiros. Instala um perigoso sentimento de descrédito popular, não apenas nos homens públicos, mas nas próprias instituições.

O escritor norte-americano Aldous Huxley escreveu que “não é quem está certo que importa: é o que está certo”. As pessoas passam, mas as idéias, os princípios e as obras permanecem. Uma eventual acolhida do mandado de segurança, por parte do STF, permitindo que o ex-presidente se candidate para disputar uma cadeira na Câmara de Deputados, nas próximas eleições, significará, posto que por vias indiretas, um incentivo à impunidade.

Caso Collor seja eleito – o que não é muito difícil no atual sistema eleitoral, eivado de distorções – passará a gozar de imunidade parlamentar. O processo contra ele, que corre na Justiça, permanecerá paralisado. Ficará, portanto, firmada jurisprudência a respeito.

Sempre que algum político eleito estiver na iminência de ser cassado, recorrerá ao expediente da renúncia e permanecerá impune. Por não se tornar inelegível, poderá disputar um mandato novinho em folha e jamais virá a ser alcançado pelo braço da lei.

Está certo esse procedimento? É justo, é honesto, é lógico? Claro que não. Nem é preciso ser uma sumidade jurídica para chegar a uma conclusão tão óbvia. Está aí uma resposta aos que questionam a razão de na Itália a Operação Mãos Limpas ser bem sucedida e no Brasil não.

Nosso sistema de administração da Justiça é moroso em excesso, exageradamente formal e, por isso, ineficiente. Entende-se o desabafo feito na quinta-feira passada pelo líder do governo no Senado, Pedro Simon, que constatou, com desalento: “Ladrão de galinha vai para a cadeia, enquanto com os grandes, que estão roubando a vida do povo, não acontece nada”.

Há uma solução eficaz para esta distorção, e ela está nas mãos dos eleitores. Para que o expediente funcione, todavia, é preciso que o direito do voto seja usado com sabedoria, com consciência e com honestidade. O cidadão pode tornar um político corrupto, ou pelo menos suspeito, inelegível por quanto tempo desejar, e não apenas pelos oito anos impostos pelo Senado a Collor: basta que não vote nele.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 11 de novembro de 1993).



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