Planejar é preciso
Pedro J. Bondaczuk
O Brasil vai colher 50 milhões
de toneladas de grãos na presente safra, foi a notícia que
circulou, durante a semana, nos jornais e nos noticiários de rádio
e de televisão. Ou seja, a colheita estará dentro da média
verificada desde o início desta década, com uma quebra de somente
pouco mais de 10% em relação a 1985.
A esta altura, o crítico, que
esperava uma autêntica hecatombe, em decorrência da propalada seca
do final do ano passado e início do corrente, na região Centro-Sul,
fica perplexo, estarrecido e, por que não dizer, irritado. Percebe
que as notícias alarmistas, que falavam numa destruição de até
70% ou mais do que fora plantado, não passou de mais uma manobra
daqueles que lucravam com a inflação.
Não é segredo para ninguém
que essas previsões catastróficas "engordaram" as taxas
inflacionárias e levaram o País, praticamente, ao impasse, no mês
de janeiro. Conclui-se que prever o quanto será o montante de uma
colheita, antes ou durante o momento do plantio, é um exercício
inócuo de adivinhação, quando não um jogo envolvendo interesses
que não atendem, em absoluto, às necessidades nacionais.
O próprio bom senso diz isso,
pois por mais avançada que seja a tecnologia, o homem ainda não tem
condições de fazer qualquer prognóstico confiável acerca dos
caprichos da natureza e muito menos de controlar os seus
desequilíbrios.
Essa expectativa, alimentada
por inescrupulosos que sonhavam com um total desarranjo econômico,
se incorporou à inflação a partir de novembro, fazendo com que as
taxas, desde então, seguissem batendo sucessivos recordes
históricos, já que a famigerada correção monetária incorporava
aos índices inflacionários do presente, tanto as do passado, quanto
as do futuro (estas últimas ditadas pela fértil imaginação dos
especuladores).
Depreende-se que o que ficou
convencionado como "choque agrícola", não passou de
manobra especulativa. E toda a sociedade caiu nessa esparrela. Pior
do que isso, pagou, e muito caro, por alguma coisa que sequer havia
acontecido. O que se verifica, passado o período da boataria, é que
a safra de alguns grãos, mais especialmente o trigo, será
recordista neste ano, embora o País não tenha nenhuma estrutura de
armazenamento.
Quanta comida, que poderia
chegar mais barata à mesa do brasileiro, e trazer vantagens para
quem a produz, para o que a comercializa e, por vias indiretas, para
o próprio governo (através dos impostos), não será perdida,
devorada pelos ratos, insetos ou apodrecida nos campos!
São ações desse tipo que
levam às maiores dificuldades econômicas. Por que não fazer o jogo
milenar da economia dentro de regras honestas, que atendam aos
interesses gerais, ao invés dos de uma meia dúzia de pessoas, que
estão pouco ligando para as precárias (diríamos, até,
catastróficas) condições sociais do brasileiro? Ninguém, com o
juízo no lugar, é contra o lucro, o grande combustível que move os
negócios, cria empregos e gera o desenvolvimento. Mas desde que
estes sejam lícitos, legais, frutos da eficiência e do trabalho e
não de manobras criminosas.
O jornal "DCI", de
12 de maio passado, estampou um escândalo, que ainda vem acontecendo
bem debaixo das nossas barbas, gerando prejuízos desnecessários
para o bolso do contribuinte. Refere-se ao trigo, cuja safra, tudo
indica, será mesmo recordista. Segundo a matéria, o preço desse
produto, há muito, foi fixado em dólares.
Como a moeda brasileira
sofria, até 28 de fevereiro passado, minidesvalorizações diárias,
o ganho dos produtores (dos grandes, é evidente), foram fantásticos,
por um longo período. Até aí, nada de mais. Todavia, um estudo da
própria Secretaria do Planejamento (Seplan) concluiu que a política
do Banco Central dos últimos anos supervalorizou o dólar em até
50%.
O empresário agrícola, que
se beneficiou com essa supervalorização, recebeu, portanto, do
governo, esse excedente em cruzeiros. Como o Estado não produz
riqueza, só a administra e a transfere de setor, quem deu esse lucro
gordo aos participantes desse monumental cambalacho fomos todos nós!
Apesar do congelamento,
determinado em 28 de fevereiro, o governo continua pagando esse trigo
que adquire em dólares. Ou seja, aqueles 50% a mais continuam
incorporados no preço, que está, cotado na moeda norte-americana,
valendo o dobro do cobrado no mercado internacional.
Chega-se à incômoda
conclusão de que, mais do que alterar sistemas, normas e métodos, é
necessário mudar a nossa mentalidade. O senso de orgulho nacional
está morrendo e grande parte da culpa cabe, certamente, aos
responsáveis pela área da Educação.
Hoje em dia, se você
demonstrar orgulho, amor e fé no seu país, será imediatamente
tachado de retrógrado, ufanista e outras baboseiras do gênero,
vazias e até burras. Por acaso o norte-americano age assim? Ou o
soviético, o cubano, o afegão, o bengalês ou seja que povo for?
O que está havendo conosco
para não termos escrúpulos sequer em sabotar a economia da nossa
própria Pátria? Nos transformamos em Judas, vendendo a terra que
nos viu nascer, suas tradições, sua cultura e sua gente, por
míseros "30 dinheiros"? Parece que sim...
(Artigo publicado na página
14, Economia, do Correio Popular, em 18 de maio de 1986)
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