Thursday, July 20, 2017

Planejar é preciso


Pedro J. Bondaczuk


O Brasil vai colher 50 milhões de toneladas de grãos na presente safra, foi a notícia que circulou, durante a semana, nos jornais e nos noticiários de rádio e de televisão. Ou seja, a colheita estará dentro da média verificada desde o início desta década, com uma quebra de somente pouco mais de 10% em relação a 1985.

A esta altura, o crítico, que esperava uma autêntica hecatombe, em decorrência da propalada seca do final do ano passado e início do corrente, na região Centro-Sul, fica perplexo, estarrecido e, por que não dizer, irritado. Percebe que as notícias alarmistas, que falavam numa destruição de até 70% ou mais do que fora plantado, não passou de mais uma manobra daqueles que lucravam com a inflação.

Não é segredo para ninguém que essas previsões catastróficas "engordaram" as taxas inflacionárias e levaram o País, praticamente, ao impasse, no mês de janeiro. Conclui-se que prever o quanto será o montante de uma colheita, antes ou durante o momento do plantio, é um exercício inócuo de adivinhação, quando não um jogo envolvendo interesses que não atendem, em absoluto, às necessidades nacionais.

O próprio bom senso diz isso, pois por mais avançada que seja a tecnologia, o homem ainda não tem condições de fazer qualquer prognóstico confiável acerca dos caprichos da natureza e muito menos de controlar os seus desequilíbrios.

Essa expectativa, alimentada por inescrupulosos que sonhavam com um total desarranjo econômico, se incorporou à inflação a partir de novembro, fazendo com que as taxas, desde então, seguissem batendo sucessivos recordes históricos, já que a famigerada correção monetária incorporava aos índices inflacionários do presente, tanto as do passado, quanto as do futuro (estas últimas ditadas pela fértil imaginação dos especuladores).

Depreende-se que o que ficou convencionado como "choque agrícola", não passou de manobra especulativa. E toda a sociedade caiu nessa esparrela. Pior do que isso, pagou, e muito caro, por alguma coisa que sequer havia acontecido. O que se verifica, passado o período da boataria, é que a safra de alguns grãos, mais especialmente o trigo, será recordista neste ano, embora o País não tenha nenhuma estrutura de armazenamento.

Quanta comida, que poderia chegar mais barata à mesa do brasileiro, e trazer vantagens para quem a produz, para o que a comercializa e, por vias indiretas, para o próprio governo (através dos impostos), não será perdida, devorada pelos ratos, insetos ou apodrecida nos campos!

São ações desse tipo que levam às maiores dificuldades econômicas. Por que não fazer o jogo milenar da economia dentro de regras honestas, que atendam aos interesses gerais, ao invés dos de uma meia dúzia de pessoas, que estão pouco ligando para as precárias (diríamos, até, catastróficas) condições sociais do brasileiro? Ninguém, com o juízo no lugar, é contra o lucro, o grande combustível que move os negócios, cria empregos e gera o desenvolvimento. Mas desde que estes sejam lícitos, legais, frutos da eficiência e do trabalho e não de manobras criminosas.

O jornal "DCI", de 12 de maio passado, estampou um escândalo, que ainda vem acontecendo bem debaixo das nossas barbas, gerando prejuízos desnecessários para o bolso do contribuinte. Refere-se ao trigo, cuja safra, tudo indica, será mesmo recordista. Segundo a matéria, o preço desse produto, há muito, foi fixado em dólares.

Como a moeda brasileira sofria, até 28 de fevereiro passado, minidesvalorizações diárias, o ganho dos produtores (dos grandes, é evidente), foram fantásticos, por um longo período. Até aí, nada de mais. Todavia, um estudo da própria Secretaria do Planejamento (Seplan) concluiu que a política do Banco Central dos últimos anos supervalorizou o dólar em até 50%.

O empresário agrícola, que se beneficiou com essa supervalorização, recebeu, portanto, do governo, esse excedente em cruzeiros. Como o Estado não produz riqueza, só a administra e a transfere de setor, quem deu esse lucro gordo aos participantes desse monumental cambalacho fomos todos nós!

Apesar do congelamento, determinado em 28 de fevereiro, o governo continua pagando esse trigo que adquire em dólares. Ou seja, aqueles 50% a mais continuam incorporados no preço, que está, cotado na moeda norte-americana, valendo o dobro do cobrado no mercado internacional.

Chega-se à incômoda conclusão de que, mais do que alterar sistemas, normas e métodos, é necessário mudar a nossa mentalidade. O senso de orgulho nacional está morrendo e grande parte da culpa cabe, certamente, aos responsáveis pela área da Educação.

Hoje em dia, se você demonstrar orgulho, amor e fé no seu país, será imediatamente tachado de retrógrado, ufanista e outras baboseiras do gênero, vazias e até burras. Por acaso o norte-americano age assim? Ou o soviético, o cubano, o afegão, o bengalês ou seja que povo for?

O que está havendo conosco para não termos escrúpulos sequer em sabotar a economia da nossa própria Pátria? Nos transformamos em Judas, vendendo a terra que nos viu nascer, suas tradições, sua cultura e sua gente, por míseros "30 dinheiros"? Parece que sim...

(Artigo publicado na página 14, Economia, do Correio Popular, em 18 de maio de 1986)



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