Nem sempre convém mudar o técnico
Pedro J. Bondaczuk
A economia
brasileira, no primeiro trimestre de 1987, acumulou revés sobre
revés, projetando um quadro assustador para o restante do ano. A
inflação está numa espiral ascendente, atingindo novo patamar,
onde instalou-se comodamente, sem nenhuma perspectiva de que, a médio
prazo, possa vir a descer.
O
saldo da balança comercial, com os inexpressivos US$ 136 milhões de
março, continua emagrecendo, ora por um motivo, ora por outro,
fechando o período de 90 dias com um total em torno de US$ 500
milhões, o que representa, somente, um quinto da marca de US$ 2,5
bilhões de 1986.
A
despeito de todos os esforços do governo, já se manifestam
inquietadores sintomas de recessão, com suas perigosas seqüelas
sociais: desemprego e achatamento salarial. As coisas, como qualquer
um pode perceber, andam de mal a pior.
Em
circunstância como esta, a sociedade costuma agir como um time de
futebol. Quando um determinado clube acumula, ao longo de uma
competição, uma sucessão de derrotas, qual é a tendência
predominante da torcida? É, salvo raríssimas exceções, a de
exigir a imediata substituição do treinador.
Para
o apaixonado torcedor, é indiferente se o plantel é ruim, se
algumas estrelas bem-remuneradas estão fazendo corpo mole, se as
arbitragens são danosas. O que ele quer é resultados. E quanto mais
imediatos, melhor. Esse imediatismo, quer no esporte, quer em outras
atividades, impede um planejamento de longo prazo, sem o qual nada de
duradouro e eficiente se verifica.
Por
essa razão, a sociedade está agindo, neste momento (pelo menos uma
parcela ponderável dela) como age qualquer torcedor do Corinthians,
do Palmeiras, da Ponte Preta ou do Guarani. Se a inflação, conforme
projeções da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas da USP,
está caminhando para 300% ao ano; se o saldo da balança comercial
dificilmente conseguirá atingir a meta mínima de US$ 8 bilhões em
1987; se as taxas de juros, com tabelamento de “spreads” e tudo,
permanecem em níveis estratosféricos e se tantos outros
acontecimentos de caráter econômico, danosos para grupos
particulares ou para a população em geral se verificam, o culpado,
invariavelmente, é o técnico.
Num
time de futebol, quando os reveses se acumulam, em geral a sua
diretoria costuma atender à torcida e demitir o treinador. Na
economia, a sociedade deseja que se faça o mesmo com o ministro da
Fazenda, Dílson Funaro. Mas será que a solução passaria,
realmente, por aí?
Seria
essa a medida mais adequada para o momento, quando o País tenta,
desesperadamente, renegociar a sua dívida externa em posição mais
vantajosa, para recuperar o crédito perdido lá fora? Os grupos de
pressão que estão propugnando por esta troca estariam agindo de
acordo com os interesses nacionais ou estariam fazendo o jogo dos
banqueiros, por motivos que não cabem aqui analisar?
Nosso
problema, por uma eventualidade, não estaria, também, no plantel?
Tomemos, por exemplo, a desastrosa performance da balança comercial
brasileira. Desde o início do ano (e nós previmos isto numa página
especial, publicada pelo Correio Popular em janeiro, intitulada
“Perspectivas 1987”), greves e mais greves vêm se sucedendo,
muitas delas de caráter meramente político.
Todos
sabem que até nas engrenagens mais grosseiras, um simples grão de
areia tende a desregular seu mecanismo impedindo que ele funcione
adequadamente. E é isto o que vem ocorrendo conosco. Março, por
exemplo, além de marcar o período de loucura nacional chamado de
Carnaval, onde se gasta o que se tem e o que não se tem em troca de
coisíssima nenhuma, tivemos duas paralisações capitais: a dos
portuários e a dos bancários.
Quanto
à inflação, não há dúvida de que grande parte dela cabe, de
fato, ao governo, que jamais mostrou grande parcimônia (ou
responsabilidade) em seus gastos. Esse é o grande problema de uma
economia estatizada, quando é sabido que o Estado costuma ser
péssimo patrão e um administrador desastrado.
Descontente
ou insatisfeita com a brutal carga tributária imposta à sociedade,
inclusive aos assalariados, via Imposto de Renda, a ineficiente e
cara máquina do governo, superdimensionada pelos desgraçados “trens
da alegria” dos períodos pré-eleitorais, vai à praça à cata de
mais combustível financeiro. Com isso, superdimensiona os juros que
paga em seus papéis para atrair investidores.
Agindo
assim, inflaciona o custo das empresas, num capitalismo que, como o
comentarista econômico Joelmir Betting costuma definir tão bem, é
“capinanceiro” (por ser carente, exatamente, de capitais),
repassando, é evidente, essas despesas crescentes para a sociedade.
Nossa
inflação atual está muito distante de ser de demanda. Estão aí
as cifras do comércio dando conta de quedas dramáticas de vendas
para provar isso. O que está faltando na praça é dinheiro, que
quando aparece, em geral, é extremamente caro. Mas isso não
justifica a saída do técnico. É necessário que haja entrosamento
entre as partes. Ambas defendem a mesma coisa, embora por métodos
diversos: a riqueza e a estabilidade social. Por que, pois, não unir
esforços, ao invés de os dispersar? Afinal, os magos estão em
falta nestes tempos de vacas magras. Ademais, de milagres já estamos
fartos até à raiz dos cabelos.
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 26 de abril
de 1987).
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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