Medo de achar
Pedro J. Bondaczuk
A vida, evento aparentemente
raro na vastidão do universo, é farta, abundante e profícua neste
nosso planetazinha azul, tão judiado e maltratado pelos insensíveis
e insensatos. Há bilhões de espécies de animais, insetos e
vegetais (algumas impossíveis de serem vistas a olho nu) já
catalogadas.
Constantemente, os biólogos
descobrem novas, até então desconhecidas (e não raro exóticas)
formas de vida. Contudo, todas, sem exceção, estão adstritas às
mesmíssimas regras, e a idêntico ciclo, impostos pela natureza:
nascimento, desenvolvimento, acasalamento, reprodução e morte.
Não precisamos, pois,
procurar muito para encontrar vida ao nosso redor. Mesmo quando
achamos que estamos sós, há sempre algum ser vivo, animal ou
vegetal, vírus ou bactéria, nos fazendo companhia, quando não nos
ameaçando ou nos explorando, sem que nos venhamos a dar conta. O
cronista Paulo Mendes Campos escreveu, numa de suas tantas crônicas
(não me lembro qual), algo que me intriga e espicaça “Passamos
a vida procurando, por medo de achar”.
Pensando bem, é isso, de
fato, o que acontece. Estamos sempre, o tempo todo, a vida inteira, à
procura de alguma coisa: conceito, explicação, certeza quanto à
nossa origem e, principalmente, destino. Todavia, vivemos
aterrorizados com o que poderemos (ou não poderemos?) vir a
descobrir. Por exemplo, qual será a nossa reação se um dia
chegarmos à conclusão absoluta e comprovável de que a nossa vida
começa e termina aqui e que não há absolutamente nada além dela?
Será um impacto, um choque,
um trauma de conseqüências imprevisíveis para toda a humanidade.
Todos os freios morais e crenças religiosas irão, num piscar de
olhos, para o espaço. E tudo, absolutamente tudo será lícito e
permitido. A probabilidade maior é que o mundo vire de ponta cabeça
e vire um caos.
Mesmo os céticos dos céticos
(ou que se dizem tal, pois não acredito na sinceridade desse
ceticismo), certamente irão pirar se comprovarem, sem possibilidades
de engano, isso como verdade. São eles, frise-se, que se empenham
tanto em tentar demonstrar essa tese. Contudo, lá no fundo da sua
consciência, até por instinto, torcem, desesperadamente, para
estarem errados. Procuram, procuram e procuram, mas com inequívoco
medo, na verdade pavor, de achar.
Havendo ou não outro tipo de
vida, alhures, somos todos, na verdade, meros turistas no mundo. Não
somos daqui e não viemos para cá para ficar para sempre. Dizem, com
certa dose de razão, que somos pó das estrelas. De qual, ou de
quais delas? Não sabemos.
Aliás, a palavra “sempre”
soa absurda, quando aplicada a nós, seres mortais. Pelo menos em
nossa condição física, biológica, material (na impossibilidade de
sabermos se a parte espiritual, a tal da alma, sobrevive ou não ao
nosso colapso orgânico), nossa passagem pela Terra é rapidíssima,
transitória, como se fôssemos (e figurativamente somos) turistas de
fato. Alguns, instalam-se por aqui por algumas horas somente, se
tanto. Outros, vão ficando, ficando e ficam por cem anos ou mais.
Mas um dia, como todos, vão embora. Para onde? Não sei! Você sabe?
Talvez acredite que sim.
Supõe que vá para
determinado lugar e passa a crer ferrenhamente nessa suposição,
baseado na fé, que prescinde da lógica. Mas saber, saber de fato,
você sabe? Claro que não! Este recanto turístico do Sistema Solar,
de uns tempos para cá, está superlotado, de pernas para o ar,
depredado, poluído, a cada dia mais quente, a cada dia com ar mais
irrespirável e a cada dia mais violento e injusto.
Alguns (poucos) preocupam-se
em repará-lo para os futuros turistas (nossos descendentes). Outros,
gozam de suas delícias sem atentar para o amanhã e querem se
apropriar do que não lhes pertence, achando que podem agir,
impunemente, como donos do pedaço. A Terra, porém, não é
propriedade de ninguém. Um dia, essas pessoas partem, também, como
todas e não deixam, sequer, registrado o nome no livro de registros.
Afinal, não somos daqui.
Em momentos de profunda
meditação, não é raro nos espantarmos com o fato de um ser tão
imperfeito e contraditório, quanto o homem é, sujeito ao
envelhecimento e à decomposição, portar em seu interior algo
potencialmente tão grandioso e sublime, como a alma (que, talvez,
seja eterna, não se sabe). Chegamos a julgar que se trate do máximo
da imperfeição.
Mas quem disse que o homem
deva ser perfeito? Compete-lhe ser o menos imperfeito possível, mas
daí à perfeição, vai um passo do tamanho dos limites do universo.
Ademais, essa característica nos é interdita, por ser prerrogativa
Daquele que nos criou, Onipotente, Onisciente, Onipresente e Eterno.
Creio, sem o menor laivo de
dúvida, (afinal, a fé prescinde de comprovações) nessa
inteligência superior que nos moldou à sua feição, embora sem nos
conceder seu poder e sua eternidade (e se concedeu a possibilidade de
nunca nos extinguirmos, o fez em relação à alma, jamais ao corpo).
Nesse aspecto, não procuro nada e, portanto, não temo achar as
verdades universais. Quais elas seriam? Evidentemente, não sei!
Às vezes me parece que nosso
corpo, por mais belo que se mostre, seja o avesso da alma. Pensando
bem, de fato é! Mauro Sampaio explica porque neste poema intitulado
“Em uma mesma”:
“Em uma mesma espécie de
flor
não há o mesmo perfume, as
mesmas tonalidades,
o mesmo franzido, o mesmo
tamanho,
haveria a monotonia com a
perfeição.
Por isso é que vestimos a
alma do avesso!”.
Benditos poetas que nada
procuram e não temem achar o que quer que seja!
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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