Tuesday, July 11, 2017

A utopia do lar comum



Pedro J. Bondaczuk


As avaliações dos resultados da viagem de três dias do presidente soviético, Mikhail Gorbachev, à França, variavam, ontem, no seu encerramento, de acordo o perfil ideológico do que as faziam. Para os conservadores, entre os quais o jornal “Le Monde”, o giro não passou de um fracasso, de mero show de exibicionismo diplomático. Já para analistas de centro e de esquerda, embora a visita não fosse revestida do mesmo suspense daquela feita a Pequim, em maio passado (que teria servido de estopim para a eclosão do movimento estudantil na China ou pelo menos para o seu alastramento) e nem do entusiasmo popular manifestado em junho na Alemanha Ocidental, ela teve saldo positivo.

Além da assinatura de 22 acordos, em diversas áreas, que foram desde a cultural à econômica, o evento serviu para acrescentar alguns pontos a mais nos incontestáveis índices de popularidade do líder do Cremlin. Algumas revelações surpreendentes vieram a público dos contatos de Gorbachev com a imprensa. Como a sua confirmação de algo que já havia sido dito, no ano passado, pelo ex-presidente norte-americano Ronald Reagan. Ou seja, a de que o dirigente comunista tem uma formação cristã, já que foi batizado por sua mãe na Igreja Ortodoxa russa.

Outra surpresa foi o convite, pelo presidente soviético, ao sindicalista polonês, Lech Walesa, para que vá a Moscou conversar acerca das dificuldades do seu país e, principalmente, sobre as transformações políticas que ocorrem na Polônia.

Essa manifestação do desejo de dialogar com o combativo fundador do Solidariedade é outra vitória importante colhida por esse eletricista do Estaleiro Lenin, de Gdansk, que graças à firmeza das suas convicções, se transformou, de um obscuro operário, numa das personalidades mundiais mais conhecidas e respeitadas da atualidade tendo, inclusive, conquistado um Prêmio Nobel da Paz.

Um aspecto que consideramos importante, nas declarações de Gorbachev, nos três dias de visita, e que muitos não consideraram rigorosamente dessa forma, foi a manifestação da sua tese de transformação da Europa num “lar comum” dos europeus, que abranja desde o Atlântico aos Montes Urais.

Talvez a repercussão desse desejo não tenha sido alta pelo tanto de utopia que a ideia encerra. Mas que é algo desejável (esse rompimento de barreiras ideológicas e mesmo nacionais), disso ninguém pode duvidar. Caso isto se concretizasse, seria o epílogo grandiloqüente da chama era do pós-guerra, 50 anos depois que esse conflito mundial foi deflagrado.

(Artigo publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 7 de julho de 1989)




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