A utopia do lar comum
Pedro
J. Bondaczuk
As
avaliações dos resultados da viagem de três dias do presidente
soviético, Mikhail Gorbachev, à França, variavam, ontem, no seu
encerramento, de acordo o perfil ideológico do que as faziam. Para
os conservadores, entre os quais o jornal “Le Monde”, o giro não
passou de um fracasso, de mero show de exibicionismo diplomático. Já
para analistas de centro e de esquerda, embora a visita não fosse
revestida do mesmo suspense daquela feita a Pequim, em maio passado
(que teria servido de estopim para a eclosão do movimento estudantil
na China ou pelo menos para o seu alastramento) e nem do entusiasmo
popular manifestado em junho na Alemanha Ocidental, ela teve saldo
positivo.
Além
da assinatura de 22 acordos, em diversas áreas, que foram desde a
cultural à econômica, o evento serviu para acrescentar alguns
pontos a mais nos incontestáveis índices de popularidade do líder
do Cremlin. Algumas revelações surpreendentes vieram a público dos
contatos de Gorbachev com a imprensa. Como a sua confirmação de
algo que já havia sido dito, no ano passado, pelo ex-presidente
norte-americano Ronald Reagan. Ou seja, a de que o dirigente
comunista tem uma formação cristã, já que foi batizado por sua
mãe na Igreja Ortodoxa russa.
Outra
surpresa foi o convite, pelo presidente soviético, ao sindicalista
polonês, Lech Walesa, para que vá a Moscou conversar acerca das
dificuldades do seu país e, principalmente, sobre as transformações
políticas que ocorrem na Polônia.
Essa
manifestação do desejo de dialogar com o combativo fundador do
Solidariedade é outra vitória importante colhida por esse
eletricista do Estaleiro Lenin, de Gdansk, que graças à firmeza das
suas convicções, se transformou, de um obscuro operário, numa das
personalidades mundiais mais conhecidas e respeitadas da atualidade
tendo, inclusive, conquistado um Prêmio Nobel da Paz.
Um
aspecto que consideramos importante, nas declarações de Gorbachev,
nos três dias de visita, e que muitos não consideraram
rigorosamente dessa forma, foi a manifestação da sua tese de
transformação da Europa num “lar comum” dos europeus, que
abranja desde o Atlântico aos Montes Urais.
Talvez
a repercussão desse desejo não tenha sido alta pelo tanto de utopia
que a ideia encerra. Mas que é algo desejável (esse rompimento de
barreiras ideológicas e mesmo nacionais), disso ninguém pode
duvidar. Caso isto se concretizasse, seria o epílogo grandiloqüente
da chama era do pós-guerra, 50 anos depois que esse conflito mundial
foi deflagrado.
(Artigo
publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 7 de
julho de 1989)
Acompanhe-me pelo twitter: @bo9ndaczuk
No comments:
Post a Comment