Novo passo para a integração da América do Sul
Pedro J. Bondaczuk
O
presidente José Sarney inicia, a partir de amanhã, a sua primeira
viagem ao Exterior desde que assumiu a presidência, visitando o
nosso vizinho no extremo Sul do continente, o Uruguai. Nada mais
oportuno do que esse minigiro presidencial, neste momento, quando as
novas democracias sul-americanas ensaiam uma prática que já deveria
ser costumeira entre nós, mas que nunca foi posta em execução. A
de uma política comum, especialmente no plano econômico, que nos
torne a todos mais fortes no trato com os países ricos do hemisfério
Norte.
Afinal,
os problemas de uruguaios, argentinos, bolivianos, peruanos,
colombianos e venezuelanos são comuns aos do Brasil. E podem ser
resumidos todos num só: as dívidas existentes. Tanto a externa,
feita imprudentemente no mercado financeiro internacional. Quanto as
internas, promovidas pelos respectivos governos para financiar suas
dispendiosas e ineficientes máquinas estatais. E a principal de
todas, a social, que é o débito existente em cada um de nossos
países com as respectivas populações de nossos jovens Estados que,
precisando desesperadamente crescer, foram, na verdade, nas duas
últimas décadas, reduzidas de pobres a miseráveis.
O
Uruguai, tradicionalmente, seguiu uma política pendular em relação
à Argentina e ao Brasil. Os dois maiores países sul-americanos, não
se sabe por que artimanhas, sempre mantiveram um clima de antagonismo
histórico, na disputa pela hegemonia continental. Com isso, apenas
conseguiram, ambos, tornar-se mais fracos na defesa dos legítimos
interesses comuns.
Uma
das táticas mais sábias, numa competição, é a de dividir as
forças do adversário, para enfraquecê-lo. Brasileiros e argentinos
demoraram mais de um século para perceberem isso (se é que já
perceberam), trocando “farpas” ao longo dos anos e agindo no
sentido de um contrariar os interesses do outro. E nessa briguinha
doméstica, o Uruguai ora pendeu para o Brasil, ora para a Argentina.
E todos saímos perdendo com essa prática.
O
novo presidente uruguaio, todavia, revelando uma rara lucidez, está
disposto a acabar com esse tipo de comportamento. Pretende, ao invés
de assumir uma posição meramente periférica entre os dois gigantes
continentais, funcionar como um aproximador de ambos. Reservou para
si o mesmo papel que determinados produtos químicos têm: o de
catalisador. Isto é, aquele que participa de uma reação,
acelerando-a, mas que sai regenerado ao final dela.
Numa
entrevista concedida sexta-feira à Rede Globo, Júlio Maria
Sanguinetti disse uma grande verdade. Que os povos sul-americanos são
uma só família e que se constitui na mais monumental das
“tonterias” (segundo sua própria expressão) brigarem entre si,
enquanto o verdadeiro adversário fica apenas observando e rindo da
nossa inconseqüência. E o que é pior, nos impondo um perpétuo
subdesenvolvimento.
Desde
a posse de Raul Alfonsin, na Argentina, começou a ser esboçada,
todavia, uma política integracionista na América do Sul. Formou-se,
inicialmente, o Grupo de Cartagena. Contatos foram estreitados. Novos
democratas vieram paulatinamente somar-se à tentativa do presidente
argentino. Como Júlio Sanguinetti, no Uruguai, que busca reconstruir
uma sociedade que já foi chamada de a “Suíça latino-americana”,
pela sua estabilidade econômica, política e social, mas que teve de
amargar quase 12 anos de ditadura.
Como
o jovem Alan Garcia Perez, no Peru, sacudindo, com suas idéias
ousadas, velhos e ultrapassados conceitos no continente. Como o
colombiano Belisário Betancur, que antes “pregava no deserto”
suas teses diante dos regimes fechados dos seus pares. E como José
Sarney, por que não, herdeiro de uma Nova República, sonhada pelo
falecido Tancredo Neves e que ele jurou implantar.
Mais
do que os acordos que o nosso presidente vai subscrever em
Montevidéu, será importante o contato político, a conversa ao pé
do ouvido, o mútuo conhecimento. Mas é indispensável que essa
mentalidade integracionista finalmente vingue. Que argentinos,
brasileiros e uruguaios nunca mais venham a se encarar como
antagonistas, mas que atuem como parceiros. Que tudo não fique
apenas no terreno das intenções e da retórica. Que certas
barreiras (incompreensíveis) sejam rompidas e passemos a agir como
um todo. Como uma sociedade única que se identifica, não somente na
origem, na cultura e nos interesses, mas principalmente nos
problemas, que são comuns e que apenas serão passivos de solução
através de políticas conjuntas. Nunca antes houve na América do
Sul condições tão propícias para isso como agora. Resta
aproveitá-las.
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