Separatistas
têm importância pequena
Pedro J. Bondaczuk
O
plebiscito nacional realizado na União Soviética em 17 de março passado mostrou
que, a despeito do descontentamento existente em todo o país, a maioria das 15
Repúblicas pretende preservar a confederação, embora em novas bases, composta
não mais por Estados caudatários do poder central, mas soberanos.
A
população quer um federacionismo ao estilo norte-americano, com cada unidade
tendo capacidade de decidir acerca do que diz respeito à sua vida interna, com
orçamento, defesa e política exterior próprios. A Moscou caberiam tarefas como
defesa, relações internacionais e estabelecimento das regras do relacionamento
interrepublicano, em absoluto pé de igualdade para cada um dos seus
integrantes.
Muitos,
certamente, vão argumentar citando as seis Repúblicas separatistas, que não
querem nem ouvir falar em novo tratado de união e que boicotaram o plebiscito
nacional, a maioria realizando os próprios como indicações da iminência da
desagregação da URSS. Mas elas teriam, do ponto de vista político, econômico e
estratégico tanta relevância quanto se lhe atribui no Ocidente?
Geórgia,
Lituânia, Moldávia, Letônia, Armênia e Estônia, somadas, perfazem um território
de 307.200 quilômetros quadrados, área irrisória diante dos 22.402.200
quilômetros quadrados da União Soviética, representando apenas 1,8% do total.
As populações dos seis Estados reunidos são de 20,41 milhões, pouco mais de 8%
dos cerca de 292 milhões de soviéticos.
Economicamente
falando, embora tais Repúblicas tenham lá sua importância, ela está longe de
ser decisiva como a da Rússia, ou da Ucrânia, ou do Azerbaijão, ou do
Uzbequistão. O separatismo, portanto, visto pragmaticamente, tem um peso
somente político.
Significaria
uma rotunda derrota do Cremlin. A despeito de todo o empenho do presidente
Mikhail Gorbachev, tem-se como certo que a União Soviética futura terá 98,72%
do território atual, o que não se constitui em nenhuma tragédia e muito menos
num enfraquecimento dramático da superpotência do Leste. Aliás, a própria
Constituição da URSS prevê a secessão, embora imponha exigência tão rígidas,
que na prática ela não tem muita chance de se concretizar.
Joseph
Stalin intuiu as dificuldades futuras de manter a coesão multinacional,
principalmente após reincorporar à força a Lituânia, Letônia, Estônia e
Geórgia. Tanto é que procurou "embaralhar as cartas", ou seja,
remover povos inteiros de uma República para outra na tentativa de matar suas
raízes nacionalistas.
A
forma como isto foi feito é que foi perversa e desumana. Acabou sendo
responsável por uma catástrofe nacional, cujas dimensões ainda estão para ser
devidamente apuradas. Estima-se que tal ação tenha provocado a morte de até 20
milhões de soviéticos.
O
ditador removeu pessoas que tradicionalmente haviam vivido em grandes cidades
para zonas rurais, instalando-as em precaríssimas fazendas coletivas. Como essa
gente --- em geral intelectuais, estudantes, profissionais liberais e técnicos
--- nada entendia de agricultura, houve uma grande fome na União Soviética, em
fins da década de 1930. Os sobreviventes desse período lembram-se, certamente,
dessa tragédia.
Essa
integração poderia, e deveria, ter sido feita, mas não da forma como Stalin
fez, mas através do despertar de uma consciência mais ampla de pátria. Mediante
uma educação internacionalista, o que o ex-ditador conseguiu foi somente
plantar perversas sementes de rancores, ressentimentos e ódios, que estão dando
seus amargos frutos agora e que a Gorbachev cabe colher nos dias atuais.
(Artigo
publicado na página 15, Internacional, do Correio Popular, em 10 de abril de
1991).
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