Sunday, January 08, 2017

Separatistas têm importância pequena


Pedro J. Bondaczuk


O plebiscito nacional realizado na União Soviética em 17 de março passado mostrou que, a despeito do descontentamento existente em todo o país, a maioria das 15 Repúblicas pretende preservar a confederação, embora em novas bases, composta não mais por Estados caudatários do poder central, mas soberanos.

A população quer um federacionismo ao estilo norte-americano, com cada unidade tendo capacidade de decidir acerca do que diz respeito à sua vida interna, com orçamento, defesa e política exterior próprios. A Moscou caberiam tarefas como defesa, relações internacionais e estabelecimento das regras do relacionamento interrepublicano, em absoluto pé de igualdade para cada um dos seus integrantes.

Muitos, certamente, vão argumentar citando as seis Repúblicas separatistas, que não querem nem ouvir falar em novo tratado de união e que boicotaram o plebiscito nacional, a maioria realizando os próprios como indicações da iminência da desagregação da URSS. Mas elas teriam, do ponto de vista político, econômico e estratégico tanta relevância quanto se lhe atribui no Ocidente?

Geórgia, Lituânia, Moldávia, Letônia, Armênia e Estônia, somadas, perfazem um território de 307.200 quilômetros quadrados, área irrisória diante dos 22.402.200 quilômetros quadrados da União Soviética, representando apenas 1,8% do total. As populações dos seis Estados reunidos são de 20,41 milhões, pouco mais de 8% dos cerca de 292 milhões de soviéticos.

Economicamente falando, embora tais Repúblicas tenham lá sua importância, ela está longe de ser decisiva como a da Rússia, ou da Ucrânia, ou do Azerbaijão, ou do Uzbequistão. O separatismo, portanto, visto pragmaticamente, tem um peso somente político.

Significaria uma rotunda derrota do Cremlin. A despeito de todo o empenho do presidente Mikhail Gorbachev, tem-se como certo que a União Soviética futura terá 98,72% do território atual, o que não se constitui em nenhuma tragédia e muito menos num enfraquecimento dramático da superpotência do Leste. Aliás, a própria Constituição da URSS prevê a secessão, embora imponha exigência tão rígidas, que na prática ela não tem muita chance de se concretizar.

Joseph Stalin intuiu as dificuldades futuras de manter a coesão multinacional, principalmente após reincorporar à força a Lituânia, Letônia, Estônia e Geórgia. Tanto é que procurou "embaralhar as cartas", ou seja, remover povos inteiros de uma República para outra na tentativa de matar suas raízes nacionalistas.

A forma como isto foi feito é que foi perversa e desumana. Acabou sendo responsável por uma catástrofe nacional, cujas dimensões ainda estão para ser devidamente apuradas. Estima-se que tal ação tenha provocado a morte de até 20 milhões de soviéticos.

O ditador removeu pessoas que tradicionalmente haviam vivido em grandes cidades para zonas rurais, instalando-as em precaríssimas fazendas coletivas. Como essa gente --- em geral intelectuais, estudantes, profissionais liberais e técnicos --- nada entendia de agricultura, houve uma grande fome na União Soviética, em fins da década de 1930. Os sobreviventes desse período lembram-se, certamente, dessa tragédia.

Essa integração poderia, e deveria, ter sido feita, mas não da forma como Stalin fez, mas através do despertar de uma consciência mais ampla de pátria. Mediante uma educação internacionalista, o que o ex-ditador conseguiu foi somente plantar perversas sementes de rancores, ressentimentos e ódios, que estão dando seus amargos frutos agora e que a Gorbachev cabe colher nos dias atuais.

(Artigo publicado na página 15, Internacional, do Correio Popular, em 10 de abril de 1991).


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