Nobel da Paz a Gorbachev
Pedro J. Bondaczuk
A
Comissão do Nobel da Noruega atendeu, ontem, senão a uma unanimidade mundial
--- afinal, como diz o surrado clichê, "ninguém consegue agradar
simultaneamente a gregos e troianos" ---
pelo menos à maioria de vozes que defendia o prêmio da Paz de 1990 ao
presidente soviético, Mikhail Gorbachev.
Hoje,
sem dúvida nenhuma (e há pesquisa de opinião em profusão para comprovar isso),
ele é o político (e sobretudo estadista) mais popular do mundo, à exceção,
talvez (e estranhamente), de seu próprio país: a URSS. Mas, mesmo ali, não
deixa de ter seu público, embora conte com opositores fortíssimos, que ninguém,
em sã consciência, gostaria de enfrentar.
Haverá,
certamente, quem irá se opor à Comissão do Nobel do Parlamento norueguês, por
sua decisão. Estes argumentarão, por exemplo, com os episódios sangrentos do
início do corrente ano na República do Azerbaijão, particularmente na capital
azerbaijense, Baku, para onde Gorbachev enviou tropas que reprimiram duramente
os nacionalistas locais, redundando num número elevado de mortes.
Mas
se o leitor se recordar bem desses fatos, notará que o presidente soviético foi
acusado, na oportunidade, tanto pelos radicais comunistas quanto pelos
opositores destes, de fraqueza por demorar tanto tempo --- quase dois anos ---
para tomar alguma atitude em relação ao conflito étnico nos Urais. O que o
líder deseja evitar era exatamente o derramamento de sangue.
Todavia,
os defensores de Gorbachev podem contrapor dezenas, quiçá centenas de atitudes
corajosas, conscientes, humanas para a promoção da paz que ele tomou. Por
exemplo, a quase milenar Catedral de São Basílio, no Cremlin, em plena Praça
Vermelha de Moscou, esteve superlotada anteontem.
Mas
essa superlotação não foi de manifestantes políticos ou de turistas desejosos
de apreciar as relíquias do templo. Foi de fiéis adorando a Deus e fazendo
orações no coração do poder de um país que por mais de sete décadas apregoou
que a "religião é o ópio do povo".
Podem
ser citados, ainda, a favor do presidente soviético, a reunificação das duas
Alemanhas; ou o magnífico sopro dos ventos da liberdade por todo o Leste
europeu; ou o desarmamento de espíritos na Ásia, quando os coreanos se preparam
para imitar os alemães e restaurar sua unidade nacional.
Por
isso, o maior adversário de Gorbachev, em seu próprio país, o ultraconservador
Yegor Ligachev, disse, ontem, quando soube da premiação, com o Nobel da Paz, ao
seu rival: "Sinto uma profunda alegria e satisfação com o prêmio".
Havia escolha mais óbvia?!!
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 16 de outubro de 1990).
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