Gorbachev
tem planos de sobra
Pedro J. Bondaczuk
O
presidente Mikhail Gorbachev inicia, com a reunião de 5 de julho, na Ucrânia,
com o chanceler alemão Helmut Kohl, um período de árduas negociações com o
Ocidente, que vai culminar com o pronunciamento que ele fará em Londres, no dia
17 de julho próximo, aos líderes do chamado Grupo dos Sete, após a cúpula
econômica dessa espécie de clube fechado dos ricos.
Na
pauta de todos esses contatos está um e único tema: o financiamento para seu
projeto de reforma na economia, centralizada e planificada, que deve desembocar
num sistema de mercado livre ou algo muito próximo disso.
Resta
ainda a dúvida se o dirigente soviético vai pedir ajuda ostensivamente,
conforme se propala, ou se nesta etapa irá se limitar a apresentar seu programa
de mudanças que, como ele próprio ressaltou, em entrevista à imprensa na
sexta-feira, será uma fusão dos planos Yavlinski e Pavlov.
O
primeiro foi elaborado pelo economista russo Grigori Yavlinski, de 39 anos,
assessor do presidente eleito da Rússia, Bóris Yeltsin. É provável que a
"medula" da exposição que Gorbachev fará em Londres será extraída
dessas propostas expostas em 103 páginas, e que prevêem medidas de curto, médio
e longo prazo.
O
segundo projeto, mais palatável à linha dura do Partido Comunista, da qual o
presidente soviético parece ter se afastado de novo, é de autoria do
primeiro-ministro Valentim Pavlov. Ambos programas diferem no ritmo das
reformas e em outras medidas periféricas. Na essência, todavia, pretendem a mesma
coisa.
O
problema da URSS atual, aliás, nem reside na ausência de programas mudancistas.
Estes foram apresentados em profusão, principalmente depois de 1989. O que os
dirigentes ocidentais irão, certamente, questionar o líder do Cremlin será
sobre como colocar um deles, qualquer que seja, em execução.
Nota-se
na União Soviética contemporânea uma espécie de vazio de poder. Gorbachev está
sinceramente empenhado em encontrar um caminho de consenso para tirar seu país
do abismo da maior crise econômica pela qual ele já passou em sua história.
Todavia, não conseguiu desmontar a "Nomenklatura" do Partido
Comunista. Ou seja, a terrível e poderosa máquina burocrática, que tem a
prerrogativa de nomear, ou pelo menos influir na nomeação, e de demitir e
exigir a cabeça desde um ministro, qualquer que seja sua pasta, até o chefe de
uma seção qualquer das milhares de fábricas através do vasto território
nacional.
Os
decretos presidenciais têm caído, invariavelmente, no vazio, por falta de
aplicação. Não passam de letras mortas. Os todo poderosos "czares" da
burocracia retardam a entrada em vigor de decisões fundamentais até que elas se
tornem ultrapassadas.
Além
disso, embora estrategicamente Gorbachev busque disfarçar --- não convém,
afinal, se apresentar perante seus pares do Ocidente enfraquecido --- é
evidente a luta surda pelo poder entre o presidente e seu primeiro-ministro,
Valentim Pavlov, que lhe foi impingido pelos conservadores, após o afastamento
de Nikolai Rizhkov do cargo, em dezembro do ano passado.
Outro
aspecto que deve merecer uma análise cuidadosa, oportunamente, se refere àquilo
que o Ocidente irá pedir em troca de uma eventual ajuda financeira à URSS. Em
que condições a concessão de capitais seria feita? Valeria a pena? A população
respaldaria? Quanto de sacrifício os soviéticos estariam dispostos a fazer para
conseguir resultados incertos?
(Artigo
publicado na página 17, Internacional, do Correio Popular, em 26 de junho de
1991).
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