Saturday, January 07, 2017

Dom Quixote das Alagoas



Pedro J. Bondaczuk


O governador de Alagoas, Fernando Collor de Mello, desde o primeiro dia de sua gestão, ou seja, 15 de março de 1986, vem travando uma batalha digna do célebre personagem do escritor espanhol Miguel de Cervantes, o Dom Quixote. Empenha-se em moralizar o funcionalismo público local, especialmente no que diz respeito aos altíssimos salários pagos a uma reduzida e “seleta” minoria de servidores, que o povo já apelidou de “marajás”.

Logo que tomou posse, o jovem político, de 38 anos, assinou vários decretos visando a acabar com privilégios inconcebíveis, concedidos a determinadas pessoas, não se sabe a que título. E comprou uma briga monumental, que envolve, agora, até o Judiciário.

Collor, com sua coragem, conquistou de imediato a simpatia dos que estão fartos da corrupção e da mentira que desgraçadamente campeiam à solta entre nós. Tornou-se uma espécie de “cavaleiro da esperança” daqueles que acreditam (e nós estamos entre estes) ser ainda possível salvar este País, cuja gente está tomada (com razão) de um imenso desencanto com a maioria dos seus homens públicos.

A palavra “marajá”, de acordo com mestre Aurélio, deriva do sânscrito “maha raja”, em cuja língua significava “grande rei”. É o título dado a príncipes e potentados da Índia, caracterizados pelas suas imensas fortunas e pelo desperdício que fazem de dinheiro, num país extremamente pobre e populoso.

Os nossos, é verdade, não chegam a ter nenhuma majestade. Não são, sequer, os “gênios” que acreditam ser, a menos que se considere “genialidade” o fato de fazerem política (a má, evidentemente), junto aos poderosos de plantão, que passam, como tudo na vida.

Se esses senhores trabalhassem em empresas privadas, não teríamos nada a ver com os números que constam no final de cada mês em seus “holleriths”. Afinal, cada dono de companhia sabe o que faz com o seu dinheiro e pode proceder com ele da maneira que quiser.

Ocorre que os altíssimos vencimentos das “marajás” são pagos do nosso bolso. São cobertos pelos impostos, cada vez mais altos e mal aplicados que o governo cria e recolhe. Por isso, o quanto eles ganham é da conta de todos nós.

É para sustentar estes “nababos” que o governo federal dispõe de 339 repartições, cuja função é recolher tributos e trabalhar no sentido de criar novos, além de elevar os que já existem. Esse procedimento chegou a levar o bisneto do Barão de Rio Branco, José Paulo da Silva Paranhos, a fazer um irado desabafo público contra esse desrespeito à população.

Em carta publicada em 26 de março do ano passado, no “Jornal da Tarde”, ele alertou o governo: “Pense, senhor presidente. Essa Nova República é tão velha quanto o mundo. Não se esqueça que as grandes revoluções sociais, no decorrer da história, sempre foram oriundas de excessos tributários praticados pelo Estado contra o povo”.

As autoridades bem que admitem que a máquina estatal gasta demais, e muito mal, o que arrecada da sociedade. Principalmente quando sustenta esses “superfuncionários”, que na verdade somente excedem a imensa massa do funcionalismo, em geral mal remunerada, na hora de passar no caixa para receber seus proventos mensais.

É por concordar com a postura do governador alagoano que a sociedade se solidariza com a sua briga. Trata-se de uma “guerra santa”, justa e legítima na defesa dos interesses da grande e sofridíssima maioria da população brasileira, que se sente agredida ao ter que arcar com cargas crescentes de sacrifício apenas para que pouquíssimos privilegiados tripudiem sobre as suas desventuras.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 27 de janeiro de 1988).


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