Saturday, January 28, 2017

Pacifismo exige coragem


Pedro J. Bondaczuk


O repúdio contra a guerra do Golfo Pérsico cresce à medida em que a metódica destruição do Iraque prossegue e que seu presidente, Saddam Hussein, numa atitude de fatalismo suicida, não dá a mínima indicação de que possa retirar seus soldados do Kuwait ocupado.

É claro que as palavras de bom senso dos pacifistas não ganham espaço na mídia. Afinal, o produto que eles têm a vender não é palpável, embora seja o mais raro e precioso que existe para a humanidade: a paz. Suas advertências sobre as conseqüências políticas, econômicas, ambientais e sociais da confrontação bélica só serão ouvidas dentro de alguns anos, quando não for possível se fazer muita coisa para minorar o sofrimento que a insensatez de hoje está provocando.

Esse pessoal incompreendido, geralmente reprimido, não tem, por exemplo, armamentos sofisticados para demonstrar num campo de batalha, equipamento da indústria da morte que excita a imaginação de estúpidos ditadores, que certamente o adquirirá em grande número dentro em breve, às custas da miséria de seus povos.

As palavras dos pacifistas sempre foram incômodas para os que têm sede do poder pelo poder. Para os generais truculentos, como Saddam Hussein, que sacrificam toda uma geração de seus melhores jovens em busca de uma miragem, de um reflexo de grandeza que não possuem. Para políticos compromissados até o pescoço com os grandes cartéis petrolíferos, que financiam suas campanhas e aos quais retribuem com diligência, mesmo que em detrimento dos que os elegeram.

Para estes, a guerra é um jogo heróico, para “homens”, desde que não sejam eles e seus filhos. Não é o desfile de horrores e de bestialidade que os inocentes atingidos por ela testemunham. Não é o exercício estúpido de matar, destruir, aterrorizar, torturar, etc., etc., etc.

Sequer têm sangue, como vem sendo tentado mostrar em fotografias e imagens de televisão, rigorosamente expurgadas de corpos mutilados e de pilhas de cadáveres espalhadas por cidades onde há apenas três semanas havia risos, lágrimas, esforços, ambições, alegrias e tristezas. Onde existia vida.

Ser pacifista, todavia, não é estar revestido de covardia, de falta de espírito de luta, de ausência de heroísmo, como se busca dar a entender. Muito pelo contrário. É ter visão para enxergar muito à frente dos demais. É ter coragem de dar nome correto às coisas e desmascarar o mal travestido de falso idealismo. É entender que cada ser humano é um universo, por ser único e sem cópia, e que ninguém tem o direito, a pretexto do que quer que seja, de jogar com vidas alheias como se elas não passassem de peças de um tabuleiro de xadrez. O mais é engodo, fruto de retórica cínica dos que ainda acham que todos os meios justificam os fins.

(Artigo publicado na página 12, “A Guerra no Golfo”, do Correio Popular, em 7 de fevereiro de 1991).


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