Repressão
a curdos é cíclica
Pedro J. Bondaczuk
O segundo êxodo verificado na região do Golfo
Pérsico é dos curdos e xiitas, que fugiram das represálias das tropas de Saddam
Hussein, após seus fracassados levantes no Norte e no Sul do Iraque, respectivamente.
Este, contudo, está, ao que tudo indica, numa situação de refluxo.
Muitos fugitivos, confiando na proteção ocidental,
estão regressando para suas vilas, aldeias e cidades, embora não se possa
precisar quantos. Outros, permanecem em acampamentos na Turquia e no Irã,
desconfiados, ainda, de que suas vidas possam estar em perigo.
É interessante, e pitoresca, a história dos curdos,
envolta, em geral, em mistério, e que vem à tona, somente, em ocasiões de
grande conflito.
Isto aconteceu, por exemplo, em 1566, quando da
morte do poderoso sultão Solimão, no auge do Império Otomano. Na oportunidade,
o Curdistão existia de fato, como província. Seu território era bastante
extenso, invadindo áreas dos atuais União Soviética, Irã, Síria, Iraque e
Turquia.
Nesse ano, todavia, começaram a ser perseguidos
ferozmente. Os compêndios de História, que mencionam os curdos apenas
marginalmente, não precisam a origem desse povo. Sabe-se que eles são,
racialmente, afins dos iranianos, possivelmente descendentes dos antigos medas,
que ao lado dos persas formaram a segunda superpotência surgida através dos
tempos – a primeira foi a Babilônia. Não possuem, todavia, unidade étnica. Há
várias subdivisões tribais entre eles.
Sua língua é aparentada ao farsi, falado no Irã. A
grande maioria é muçulmana sunita, embora haja outras religiões entre os
curdos, inclusive uma seita que mereceria um pouco mais de estudo, que tem no
Demônio o seu deus.
O território que eles ocupam, no Norte do Iraque,
tido como inóspito, por suas montanhas íngremes e geladas, pode ser considerado
a área nobre do país. O solo iraquiano, na sua maior parte, à exceção das
margens dos seus dois principais rios, Tigre e Eufrates, é árido, pode-se
dizer, desértico.
Excluído o petróleo, seu produto mais farto são as
tâmaras. O mesmo não acontece no Curdistão. A região detém um dos mais
produtivos campos petrolíferos do Iraque, o de Kirkuk, cuja jazida foi
descoberta em 1927. Seu solo é bastante fértil, prestando-se, sobretudo, ao
plantio de cevada, trigo e frutas. Pode-se dizer, portanto, que a zona é uma
espécie de celeiro alimentar do país.
A movimentação ocorrida no Curdistão e a presença de
tropas estrangeiras ali certamente irão agravar as dificuldades alimentares
iraquianas, que já são imensas. As safras correm o risco de se perder, por
absoluto abandono. Até se entende a razão de Saddam Hussein – e seus
antecessores no poder – se oporem à cessão desse território aos curdos. Afinal,
eles são mais numerosos na Turquia, onde chegam a 12 milhões e onde são até reprimidos.
Todavia, a imprensa raramente noticiou tal
repressão. Quando muito, citou, marginalmente, em pés de página, um ou outro
incidente. Esse silêncio decorre de todo um jogo de interesses ocidental. A
Turquia, afinal, integra a Comunidade Econômica Européia e a Organização do
Tratado do Atlântico Norte, Otan. Não é, evidentemente, o caso do Iraque.
(Artigo publicado na página 16, Internacional, do
Correio Popular, em 10 de maio de 1991)
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