Modelo
concentracionista
Pedro J. Bondaczuk
A
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, que acaba de ser divulgada pelo
IBGE, mostra, entre outras coisas, quem realmente é o prejudicado com a crise
econômica que afetou o País ao longo de toda a década de 1980 e ameaça se
prolongar nestes últimos dez anos do milênio. São os 95% dos brasileiros ---
cerca de 143 milhões de pessoas --- que ficaram mais pobres no período, com a
maior concentração de renda nas mãos dos 5% restantes.
Quem,
por exemplo, é o mais afetado pelo presente quadro recessivo e com alta
inflação? Evidentemente, aquele que depende das oscilações da política
econômica para garantir seu emprego e seu minguado rendimento, cada vez menor
--- as estatísticas comprovam isso --- e que não possui nenhuma salvaguarda
para a proteção da corrosão inflacionária.
Os
cerca de 7,5 milhões de brasileiros que detêm em suas mãos 39,4% da riqueza
nacional, embora estejam sendo penalizados com o crédito curto e juros de fazer
inveja ao mais avaro dos agiotas --- os protestos, falências e concordatas
mostram isso --- dispõem de inúmeros meios para proteger seu dinheiro.
Podem
investir em imóveis, em títulos diversos, em ouro, em dólar, quando não o
remeter ao Exterior. Em meados da década passada, numa estimativa de uma
entidade multilateral com sede nos Estados Unidos, divulgou-se que cerca de US$
150 bilhões de capitais do Brasil --- bem mais do que nossa dívida externa ---
tinham sido expatriados por seus detentores, para a Suíça, Bahamas, Ilhas Virgens
e os inúmeros "paraísos fiscais" espalhados pelo mundo afora.
Que
futuro esperar, objetivamente, de uma sociedade estabelecida nesses moldes? Não
é necessário ser nenhum profeta e nem perito em sociologia para prever futuras
e indesejáveis confrontações. Caso o modelo concentracionista não seja alterado
urgentemente, é mera questão de tempo o agravamento das dificuldades.
A
concentração de renda, entre outras coisas, encolhe o mercado. Havendo menos
gente para comprar, será preciso fabricar quantidades menores de produtos,
empregar menos trabalhadores, gerar menos impostos e assim por diante. Daí a
necessidade de romper o círculo vicioso e de se evitar a recessão e, o pior, a
"estagflação". Daí a urgência de se combater a inflação mediante
fórmula pactuada , e não ditada de cima para baixo.
Toda
uma geração está tendo a qualidade de vida comprometida e arrisca-se a deixar
um quadro de "terra arrasada" como herança para os descendentes. Isso
é mais trágico quando se raciocina dentro da lógica e se conclui que o tempo
perdido em agruras, preocupações e carências, jamais será devolvido para quem
quer que seja. Afinal, a existência de cada indivíduo é única, sem direito a
"replay".
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 15 de novembro de 1990).
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