O que importa
Pedro
J. Bondaczuk
Shakespeare constatava,
há já alguns séculos (precisamente quatro), que “nada importa tanto ao homem
quanto o próprio homem”. A citação não é literal, mas seu sentido é exatamente
este. O que se passa na alma das pessoas e motiva suas ações e reações foi, é e
continuará sendo, sempre, o fulcro dos melhores textos já produzidos por
escritores de todas as partes e todos os tempos, não importa o gênero que
utilizem.
Até o século XIX, os
conhecimentos relativos aos pensamentos e sentimentos humanos eram escassos.
Romancistas e contistas guiavam-se pela intuição para explicar determinados
comportamentos e reações de seus personagens. E criaram obras imorredouras, que
até hoje nos encantam e, certamente, irão encantar ainda várias gerações de
leitores.
Hoje, nesse aspecto, as
coisas estão, paradoxalmente, mais fáceis e mais difíceis. A facilidade está no
conhecimento cada vez maior dos pensamentos e sentimentos que movem o homem,
dado o avanço de disciplinas como Psicologia, Psiquiatria e Ciência do
Comportamento (ou Etologia), além da Antropologia e da Sociologia.
A dificuldade, por seu
turno, está, também, justamente nisso. Ou seja, o escritor que não quiser
escrever bobagem e pretender criar personagens pelo menos verossímeis, deve ter
nem que sejam pálidas noções dessas disciplinas. E parecem, de fato, ter, dada
a boa qualidade de inúmeros contos e romances, que parecem mais extensas
reportagens, tão reais que são os “atores” dos dramas, tragédias e comédias que
inventam e a que dão vida, do que ficção.
Como se vê, o que
continua importando, e importará cada vez mais, ao homem é o próprio homem, com
sua complexidade, grandeza e, paradoxalmente, vulnerabilidade, pequenez e
efemeridade. Não por acaso, os livros classificados como de “auto-ajuda” fazem
tamanho sucesso. As pessoas buscam, neles, soluções para seus próprios problemas
e contradições. Algumas, talvez encontrem. Outras...
Um tema virtualmente
inesgotável, mas nem sempre bem explorado como e quanto deveria ser pelos
escritores mundo afora, é o que se refere aos riscos para o Planeta advindos da
depredação do meio ambiente feita pelo homem. O mesmo, todavia, não se pode
dizer sobre o perigo nuclear. Há uma profusão de ótimos livros a respeito,
tanto de ficção quanto de não-ficção e, portanto, quem não está bem informado a
propósito não pode culpar a falta de informações, mas a própria ausência de
vontade de se informar. Não mencionarei nenhum, especificamente, porque isso se
tornaria até redundante.
Em 16 de julho de 1945,
às 5 horas, 29 minutos e 45 segundos da manhã, uma bola de fogo gigantesca
iluminou os céus de Trinity, localidade desértica do Novo México, erguendo para
o espaço um cogumelo de milhares de metros de altura. Os seres humanos, naquele
instante fatídico, acabavam de abrir autêntica “Caixa de Pandora”, aquele
recipiente que na mitologia antiga guardava, em seu interior, todos os bens e
todos os males da Terra. Só que neste caso, havia, somente, malefícios. Em 16
de julho de 1945 era testada, com sucesso, a primeira bomba atômica.
De então a esta parte,
muita água rolou por baixo da ponte. Duas cidades foram destruídas em segundos
com o uso dessas armas, na maior carnificina já registrada na história contra
populações civis. O mundo já esteve “n” vezes na iminência da destruição total,
sendo a mais conhecida a do caso dos mísseis soviéticos em Cuba. Há quem jure
que naquela oportunidade escapamos da destruição total por míseros dois minutos
de reflexão dos presidentes John Kennedy e Nikita Kruschev. A maioria das
pessoas, todavia, sequer se deu conta disso.
E hoje, as coisas estão
melhores? Absolutamente não! Estão muitíssimo piores e a imprensa silencia a
respeito. Por que? Mistério. A possibilidade de uma bomba atômica cair em mãos
de grupos terroristas, por exemplo, que não faz muito era considerada remota e
até mesmo impossível, hoje em dia é cada vez mais provável. E a causa disso é
muito simples. É a proliferação de armamentos nucleares, ou da tecnologia
apropriada para a sua fabricação, em países instáveis, localizados no explosivo
e problemático Terceiro Mundo.
Quando existia a União
Soviética, embora as tensões ideológicas fossem ameaças permanentes à
sobrevivência humana, pelo menos era possível de se saber em que mãos estavam
as milhares de ogivas, de ambos os lados. Com o fim do império comunista, não
se tem mais certeza de nada. Quem herdou o arsenal nuclear da antiga
superpotência euro-asiática? Foi a Rússia? As armas foram divididas em outras
Repúblicas, onde estavam baseadas? Em caso afirmativo, o responsável (ou
responsáveis) por sua guarda merece (ou merecem) confiança?
A verdade é que o que
restou da URSS virou, hoje em dia,
autêntico “supermercado” de armas nucleares. Quem chegar a uma dessas
Repúblicas com dinheiro vivo na mão, leva. E não pensem que terroristas que
eventualmente adquirirem esses artefatos não os utilizarão.
Vocês acham, por
exemplo, que pessoas do tipo das que amarram bombas ao próprio corpo para
praticarem atentados terroristas relutariam em explodir uma arma nuclear? Claro
que não! Tipos como os que seqüestram aviões repletos de passageiros e os
lançam contra prédios da cidade mais populosa do mundo pensariam duas vezes
para explodir o mundo? Não, não e não.
Portanto, a despeito do
silêncio omisso e comprometedor da imprensa a esse propósito, os riscos de
ataques nucleares, mesmo que limitados, hoje em dia, são muitíssimos maiores do
que no período que ficou conhecido como o de “guerra fria”.
Ademais, mesmo a
energia nuclear utilizada para fins pacíficos, tida e havida como inesgotável
manancial de progresso e de poder para quem a detém, para a geração de eletricidade,
apresenta uma série de problemas de difícil solução, o que parece estar sendo
desprezado, em vez de resolvido.
O da destinação dos
dejetos não é, entre eles, o de menores proporções. Os diversos países que
utilizam, intensivamente, essa fonte energética, como o Japão, os Estados
Unidos, a Grã-Bretanha, a França, a Alemanha, a China e a Rússia, entre outros,
não sabem o que fazer com esse lixo tão peculiar.
A maioria costuma
guardar os resíduos em minas de sal abandonadas. Há quem os coloque em cavernas,
que são, posteriormente, hermeticamente lacradas para impedir a radiação.
Alguns, ainda, colocam o plutônio, o cobalto, o amerício e sabe-se mais o quê,
resultante das diversas reações nucleares, em tambores de chumbo, vedados com
grossas camadas de concreto, que são jogados no fundo dos oceanos.
A grande dificuldade
apresentada por esses dejetos, todavia, é o período de sua atividade e,
portanto, periculosidade. Alguns têm sobrevida ativa de 500 anos, ou seja, meio
milênio. E à medida que os reatores atômicos para a geração de eletricidade
aumentam no mundo (na França, a energia gerada por usinas desse tipo já
representa 63% do total), mais lixo é produzido. E maior fica sendo o problema
do que fazer com ele.
A eliminação, pura e
simples, como se faz com outros produtos inúteis, é impossível. Ademais, o
número de minas de sal abandonadas, ou de cavernas subterrâneas inacessíveis,
não é tão grande a ponto de poder comportar uma acumulação indefinida dos
resíduos.
Eis, portanto, a
verdadeira “Caixa de Pandora”, aberta pelos homens na primeira metade do século
passado, que tem causado mais problemas do que vantagens para a humanidade
(além daqueles fartamente conhecidos, representados pelas armas nucleares).
É necessário, pois, que
se dê atenção aos escritores, que se debruçam com afinco e assiduidade sobre
este tema que, por mais que seja explorado, sempre apresenta novos ângulos a
explorar, já que a imprensa faz de conta que o perigo sequer existe, quanto mais
que é iminente, como de fato é.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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