Sunday, July 31, 2016

É indispensável que se rompa o imobilismo


Pedro J. Bondaczuk


O País encontra-se, atualmente, num enorme círculo-vicioso, em relação aos rumos que devem ser dados à sua economia. O ministro da Fazenda, Dílson Funaro, quando esteve num giro pelos Estados Unidos, Grã-Bretanha, França, Suíça, Alemanha Ocidental, Itália e Japão, na companhia do presidente do Banco Central, Francisco Gros, para explicar aos credores os motivos que levaram o Brasil a suspender os pagamentos dos juros de sua dívida externa, na semana de Carnaval, ouviu, invariavelmente, em todas as capitais por onde passou, uma só pergunta: “Quais os planos das autoridades brasileiras para redimensionar a nossa política econômica?”. E essa questão não pôde ser respondida, e por uma única razão. Até aqui ninguém conhece as regras do jogo para este e para os próximos anos.

No início deste mês, técnicos do governo afirmavam, “em off”, aos jornalistas, que o roteiro dos ajustes requeridos estava na dependência dos resultados das negociações da dívida externa. Argumentavam que era necessário, antes de tudo, se conhecer o volume de recursos que o País deveria enviar ao Exterior para o pagamento do serviço desse débito (juros e encargos). E saber-se se será possível obter dinheiro novo, e em que quantidade, para financiar o nosso desenvolvimento. Garantiam que somente de posse desses dados seria possível a definição de uma estratégia desenvolvimentista.

Dessa forma, ficou evidente, para qualquer um, e especialmente ao crítico, habituado aos pequenos detalhes, que têm grande significado, a existência de um impasse que precisa ser rompido. Os banqueiros garantem que somente aceitam conversar sobre uma eventual renegociação diante de um plano concreto que dê uma direção à economia brasileira.

O Planalto, por seu turno, contrapõe, dizendo que só poderá elaborar essas regras do jogo econômico diante de resultados concretos do ajuste no plano externo. E nós, como ficamos em toda essa história?

O governo apregoa, a todo o instante, aqui e lá fora, que a base da sua ação continuará sendo o combate à inflação, sem, no entanto, cair no fosso profundo e ameaçador da recessão. Mas a incerteza com a qual os empresários se deparam nesse instante (que pode ser caracterizado como sendo até de perplexidade) é o caminho mais seguro para nos levar para esse lado que não desejamos ir.

A sensível corrosão salarial verificada nos primeiros meses de 1987, embora com o “gatilho” disparado a toda a hora, fez com que o consumo baixasse, no comércio, a pelo menos a metade.

Muitos investimentos, que já deveriam ter sido feitos, estão parados, à espera daquilo que vai acontecer, como o comentarista econômico, Joelmir Betting, bem frisou, no “Jornal da Globo” de anteontem, “não nos próximos três anos de mandato do presidente José Sarney, mas nos três meses vindouros”.

Enquanto isso, a “ciranda financeira”, tão criticada nos tempos da Velha República, voltou a se manifestar a todo o vapor, estimulada pela insaciável fome do governo por mais dinheiro, que é drenado, dessa maneira, e mediante impostos bastante elevados, das atividades produtivas, para a máquina burocrática, centralizada e centralizadora, sabidamente cara e ineficiente, da administração federal.

Os juros enlouqueceram e em apenas três meses, foram parar na estratosfera. O grande problema, segundo os técnicos, é uma aguda falta de liquidez no mercado. Em outras palavras, o que está faltando é moeda, “grana”, “money”, ou “tutu”, como costumamos dizer.

Nisso entra um outro mistério para o leigo em economia. Nós sempre aprendemos que a inflação é caracterizada, principalmente, pela emissão de dinheiro sem que haja um correspondente lastro em ouro. Para as taxas andarem tão alto, portanto, presume-se que a praça deveria estar literalmente “inundada”de papel-moeda.

No entanto, este está escasso, na verdade. Se não estivesse, não haveria tamanha iliquidez. E os juros não estariam nos patamares absurdos em que se instalaram e não parecem dispostos a descer.

Essa atividade especulativa, se alivia os problemas de caixa do governo, agrava um problema antigo nosso: a concentração de renda. É mais do que evidente que o trabalhador de salário mínimo (cerca de 80% da massa salarial total do País), cujos proventos (ou seria “para os ventos”?), são insuficientes até para custear uma alimentação adequada, não está adquirindo títulos, debêntures, etc.

Mas é ele que vem pagando, invariavelmente, a conta. Estes papéis, por exemplo, puxam os juros para o alto, para que possam ser atrativos. As taxas elevadas., no entanto, são pagas pelos tomadores de capital, as empresas, aumentando proibitivamente seus custos financeiros.

No entanto, estes são repassados (com bastante justiça, por sinal) para o consumidor final, pois ninguém abre algum negócio para empatar ou perder. E a maioria da população, como fica nessa história toda?

É urgente, portanto, que este círculo-vicioso seja rompido e sem demora. Ou o governo elabora e apresenta, com urgência, à sociedade e aos banqueiros, o plano dos novos rumos que pretende imprimir à economia, ou estes renegociam o nosso débito externo, definindo quando deveremos pagar e receber. O que não pode persistir, é este terrível imobilismo do primeiro trimestre de 1987.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 22 de março de 1987).


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