É indispensável que se rompa o imobilismo
Pedro J.
Bondaczuk
O País encontra-se, atualmente, num enorme
círculo-vicioso, em relação aos rumos que devem ser dados à sua economia. O
ministro da Fazenda, Dílson Funaro, quando esteve num giro pelos Estados
Unidos, Grã-Bretanha, França, Suíça, Alemanha Ocidental, Itália e Japão, na
companhia do presidente do Banco Central, Francisco Gros, para explicar aos
credores os motivos que levaram o Brasil a suspender os pagamentos dos juros de
sua dívida externa, na semana de Carnaval, ouviu, invariavelmente, em todas as
capitais por onde passou, uma só pergunta: “Quais os planos das autoridades
brasileiras para redimensionar a nossa política econômica?”. E essa questão não
pôde ser respondida, e por uma única razão. Até aqui ninguém conhece as regras
do jogo para este e para os próximos anos.
No início deste mês, técnicos do
governo afirmavam, “em off”, aos jornalistas, que o roteiro dos ajustes
requeridos estava na dependência dos resultados das negociações da dívida
externa. Argumentavam que era necessário, antes de tudo, se conhecer o volume
de recursos que o País deveria enviar ao Exterior para o pagamento do serviço
desse débito (juros e encargos). E saber-se se será possível obter dinheiro
novo, e em que quantidade, para financiar o nosso desenvolvimento. Garantiam
que somente de posse desses dados seria possível a definição de uma estratégia
desenvolvimentista.
Dessa forma, ficou evidente, para
qualquer um, e especialmente ao crítico, habituado aos pequenos detalhes, que
têm grande significado, a existência de um impasse que precisa ser rompido. Os
banqueiros garantem que somente aceitam conversar sobre uma eventual
renegociação diante de um plano concreto que dê uma direção à economia
brasileira.
O Planalto, por seu turno,
contrapõe, dizendo que só poderá elaborar essas regras do jogo econômico diante
de resultados concretos do ajuste no plano externo. E nós, como ficamos em toda
essa história?
O governo apregoa, a todo o
instante, aqui e lá fora, que a base da sua ação continuará sendo o combate à
inflação, sem, no entanto, cair no fosso profundo e ameaçador da recessão. Mas
a incerteza com a qual os empresários se deparam nesse instante (que pode ser
caracterizado como sendo até de perplexidade) é o caminho mais seguro para nos
levar para esse lado que não desejamos ir.
A sensível corrosão salarial
verificada nos primeiros meses de 1987, embora com o “gatilho” disparado a toda
a hora, fez com que o consumo baixasse, no comércio, a pelo menos a metade.
Muitos investimentos, que já
deveriam ter sido feitos, estão parados, à espera daquilo que vai acontecer,
como o comentarista econômico, Joelmir Betting, bem frisou, no “Jornal da
Globo” de anteontem, “não nos próximos três anos de mandato do presidente José
Sarney, mas nos três meses vindouros”.
Enquanto isso, a “ciranda
financeira”, tão criticada nos tempos da Velha República, voltou a se
manifestar a todo o vapor, estimulada pela insaciável fome do governo por mais
dinheiro, que é drenado, dessa maneira, e mediante impostos bastante elevados,
das atividades produtivas, para a máquina burocrática, centralizada e
centralizadora, sabidamente cara e ineficiente, da administração federal.
Os juros enlouqueceram e em
apenas três meses, foram parar na estratosfera. O grande problema, segundo os
técnicos, é uma aguda falta de liquidez no mercado. Em outras palavras, o que
está faltando é moeda, “grana”, “money”, ou “tutu”, como costumamos dizer.
Nisso entra um outro mistério
para o leigo em economia. Nós sempre aprendemos que a inflação é caracterizada,
principalmente, pela emissão de dinheiro sem que haja um correspondente lastro
em ouro. Para as taxas andarem tão alto, portanto, presume-se que a praça
deveria estar literalmente “inundada”de papel-moeda.
No entanto, este está escasso, na
verdade. Se não estivesse, não haveria tamanha iliquidez. E os juros não
estariam nos patamares absurdos em que se instalaram e não parecem dispostos a
descer.
Essa atividade especulativa, se
alivia os problemas de caixa do governo, agrava um problema antigo nosso: a
concentração de renda. É mais do que evidente que o trabalhador de salário
mínimo (cerca de 80% da massa salarial total do País), cujos proventos (ou
seria “para os ventos”?), são insuficientes até para custear uma alimentação
adequada, não está adquirindo títulos, debêntures, etc.
Mas é ele que vem pagando,
invariavelmente, a conta. Estes papéis, por exemplo, puxam os juros para o
alto, para que possam ser atrativos. As taxas elevadas., no entanto, são pagas
pelos tomadores de capital, as empresas, aumentando proibitivamente seus custos
financeiros.
No entanto, estes são repassados
(com bastante justiça, por sinal) para o consumidor final, pois ninguém abre
algum negócio para empatar ou perder. E a maioria da população, como fica nessa
história toda?
É urgente, portanto, que este
círculo-vicioso seja rompido e sem demora. Ou o governo elabora e apresenta,
com urgência, à sociedade e aos banqueiros, o plano dos novos rumos que
pretende imprimir à economia, ou estes renegociam o nosso débito externo,
definindo quando deveremos pagar e receber. O que não pode persistir, é este
terrível imobilismo do primeiro trimestre de 1987.
(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 22 de
março de 1987).
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment