Voto
com cartas marcadas
Pedro J. Bondaczuk
A atual Constituição, no artigo 3º do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias, define, para 5 de outubro próximo, o
processo de sua própria revisão. A prática demonstrou que, apesar de ser uma
das mais extensas da nossa história e a que mais tempo durou para ser
elaborada, a Carta Magna vigente tem que ser alterada em muitos pontos. Um
deles, é o que se refere às criação e funcionamento dos partidos políticos, que
perderam o seu caráter programático – salvo exceções – e se transformaram em
mero aglomerado de siglas, de pouco ou nenhum significado, e que confundem o
eleitor na hora de votar.
Por causa dessa descaracterização, o brasileiro, em
sua grande maioria, não escolhe programas, princípios ou valores com os quais
se identifique nas várias eleições que se realizam para os mais diversos cargos
eletivos. Personaliza a escolha, baseado em simpatias ou antipatias pessoais,
sem maiores preocupações com a capacidade, o passado e a honestidade de propósitos
do escolhido.
Vota em nomes, boa parte das vezes em troca de
favores pessoais, numa distorção perigosa e altamente nociva do ato máximo de
um sistema democrático. O caráter de representatividade, dessa maneira, deixa
de existir. Trata-se de um sufrágio meramente emocional, teleguiado pela maciça
propaganda dos candidatos, com nada ou muito pouco de racional.
Esse procedimento, em geral, penaliza aquele cidadão
talentoso, bem-intencionado, que entra na vida pública apenas com o ideal de
bem servir, sem que disponha dos proibitivos recursos financeiros para bancar
uma eleição.
Estimativas que circulam, na imprensa, por exemplo,
dão conta de que o político que pretender conseguir uma cadeira na Câmara
Federal, no ano que vem, precisará gastar, no mínimo, US$ 1 milhão em
propaganda. Quantos brasileiros têm cacife para enfrentar uma parada dessas?
Pouquíssimos, diz a mínima lógica.
Quem fizer um investimento desse porte, no entanto,
será meramente por patriotismo? Nossa experiência e a própria lógica sinalizam
para um sonoro “não”!! Como pretender, pois, uma saudável e ultranecessária
renovação política neste país?
Este é apenas um dos pontos a considerar no atual
sistema. Há muitas, muitíssimas brechas mais na legislação que findam por
penalizar o Brasil com uma ausência quase absoluta de opções. Por exemplo, o
atual Congresso conta, atualmente, com uma quantidade muito grande de
parlamentares que rejeitaram, em 25 de abril de 1984, a Emenda Dante de
Oliveira, que naquela ocasião pretendia restabelecer a eleição direta para a
Presidência da República e todos os demais cargos eletivos.
A despeito desses políticos terem “pavor” de voto –
o que é um paradoxo imenso para quem depende dele para representar um grupo de
cidadãos – lograram obter suas vagas. Hoje, muitos deles posam de autênticos
democratas e até de “salvadores da pátria”.
Este é um dos maiores problemas do brasileiro: a
falta de memória. Tais considerações vêm a propósito das expectativas que se
começam a levantar em relação ao próximo presidente a ser eleito em 1994.
Muitos irresponsáveis atropelam o atual governo – que luta, desesperadamente,
contra problemas gravíssimos – acenando com soluções “miraculosas” caso sejam
eleitos.
Todavia, diante dos antecedentes, se o governante
ideal para o País, aquele estadista raro com o qual tanto sonhamos há tempos,
aparecer, como o iremos identificar? É mais provável que, se ele existir e se
candidatar, não obtenha mais do que 1% dos votos.
(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio
Popular, em 21 de julho de 1993)
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