Sunday, December 20, 2015

Voto com cartas marcadas



Pedro J. Bondaczuk


A atual Constituição, no artigo 3º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, define, para 5 de outubro próximo, o processo de sua própria revisão. A prática demonstrou que, apesar de ser uma das mais extensas da nossa história e a que mais tempo durou para ser elaborada, a Carta Magna vigente tem que ser alterada em muitos pontos. Um deles, é o que se refere às criação e funcionamento dos partidos políticos, que perderam o seu caráter programático – salvo exceções – e se transformaram em mero aglomerado de siglas, de pouco ou nenhum significado, e que confundem o eleitor na hora de votar.

Por causa dessa descaracterização, o brasileiro, em sua grande maioria, não escolhe programas, princípios ou valores com os quais se identifique nas várias eleições que se realizam para os mais diversos cargos eletivos. Personaliza a escolha, baseado em simpatias ou antipatias pessoais, sem maiores preocupações com a capacidade, o passado e a honestidade de propósitos do escolhido.

Vota em nomes, boa parte das vezes em troca de favores pessoais, numa distorção perigosa e altamente nociva do ato máximo de um sistema democrático. O caráter de representatividade, dessa maneira, deixa de existir. Trata-se de um sufrágio meramente emocional, teleguiado pela maciça propaganda dos candidatos, com nada ou muito pouco de racional.

Esse procedimento, em geral, penaliza aquele cidadão talentoso, bem-intencionado, que entra na vida pública apenas com o ideal de bem servir, sem que disponha dos proibitivos recursos financeiros para bancar uma eleição.

Estimativas que circulam, na imprensa, por exemplo, dão conta de que o político que pretender conseguir uma cadeira na Câmara Federal, no ano que vem, precisará gastar, no mínimo, US$ 1 milhão em propaganda. Quantos brasileiros têm cacife para enfrentar uma parada dessas? Pouquíssimos, diz a mínima lógica.

Quem fizer um investimento desse porte, no entanto, será meramente por patriotismo? Nossa experiência e a própria lógica sinalizam para um sonoro “não”!! Como pretender, pois, uma saudável e ultranecessária renovação política neste país?

Este é apenas um dos pontos a considerar no atual sistema. Há muitas, muitíssimas brechas mais na legislação que findam por penalizar o Brasil com uma ausência quase absoluta de opções. Por exemplo, o atual Congresso conta, atualmente, com uma quantidade muito grande de parlamentares que rejeitaram, em 25 de abril de 1984, a Emenda Dante de Oliveira, que naquela ocasião pretendia restabelecer a eleição direta para a Presidência da República e todos os demais cargos eletivos.

A despeito desses políticos terem “pavor” de voto – o que é um paradoxo imenso para quem depende dele para representar um grupo de cidadãos – lograram obter suas vagas. Hoje, muitos deles posam de autênticos democratas e até de “salvadores da pátria”.

Este é um dos maiores problemas do brasileiro: a falta de memória. Tais considerações vêm a propósito das expectativas que se começam a levantar em relação ao próximo presidente a ser eleito em 1994. Muitos irresponsáveis atropelam o atual governo – que luta, desesperadamente, contra problemas gravíssimos – acenando com soluções “miraculosas” caso sejam eleitos.

Todavia, diante dos antecedentes, se o governante ideal para o País, aquele estadista raro com o qual tanto sonhamos há tempos, aparecer, como o iremos identificar? É mais provável que, se ele existir e se candidatar, não obtenha mais do que 1% dos votos.  

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 21 de julho de 1993)


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