Tuesday, December 29, 2015

Ambiente não favorece intervenção no Golfo


Pedro J. Bondaczuk


A determinação do governo do presidente George Bush de enviar unidades de reforço da Força Aérea dos Estados Unidos rumo ao Golfo Pérsico para pressionar o ditador iraquiano, Saddam Hussein, a dar plena liberdade às equipes de fiscalização das Nações Unidas para que localizem e destruam seus arsenais de armas de eliminação em massa, vem recebendo as mais variadas interpretações, interna e externamente, dependendo do analista.

Alguns políticos democratas norte-americanos afirmam que a decisão é puramente de caráter eleiçoeiro. Os republicanos vêem na atitude um ato de prudência diante da possibilidade dos bombardeios efetuados no Iraque durante os 42 dias de guerra não terem sido tão "cirúrgicos" quanto o Pentágono fez questão de apregoar. Há quem ache que a nova pressão faça parte de uma velha tática da Casa Branca, de nunca deixar o inimigo sossegado.

Seja qual for a razão, dificilmente irá ocorrer alguma intervenção militar, pelo menos em escala considerável. O ambiente atual não é propício para esse tipo de atitude. A opinião pública mundial demonstra ter se cansado do assunto envolvendo um ditadorzinho qualquer do Terceiro Mundo e se volta para outros temas, como a guerra civil da Iugoslávia, que vem apresentando uma assustadora escalada nos últimos dias, o futuro da União Soviética, à medida em que se assenta a poeira da maluca e surrealista tentativa de golpe de 19 de agosto passado e que o furor nacionalista começa a ceder lugar à realidade e a sempre lembrada, mas nunca resolvida, questão árabe-israelense.

É possível que todas as interpretações da decisão de Bush estejam corretas, pois elas fazem sentido, ou que nenhuma delas seja a verdadeira. Nesta época de meias-verdades, é uma tarefa sobreumana tentar interpretar as ações de políticos, especialmente num país em que a mídia eletrônica exerce uma espécie de ditadura. Entre o que se diz perante as câmeras, para sustentar uma imagem pública em geral forjada pelos assessores, e aquilo que os dirigentes realmente estão pensando, vai uma distância enorme.

Faria sentido que o presidente norte-americano reavivasse o conflito do Golfo Pérsico, que lhe rendeu tantos pontos de popularidade e que o fizeram o governante mais apoiado da história dos Estados Unidos, quando a campanha sucessória de 1992 começa a ser colocada nas ruas.

Por enquanto, inibidos pelas pesquisas de opinião, os democratas revelam extrema timidez acerca das eleições presidenciais de 1992. Tanto é que até o momento apenas duas pré-candidaturas para as primárias que vão começar em fevereiro do ano que vem foram anunciadas e assim mesmo como uma espécie de balão de ensaio.

Nenhum dos chamados "pesos pesados" do partido, como o governador de Nova York, Mário Cuomo e o sempre lembrado, mas permanentemente envolvido em escândalos desde o caso Chappadiquit, senador Edward Kennedy --- agora às voltas com a questão de estupro de um seu sobrinho --- ainda se manifestou.

Bush sabe que os democratas não vão lhe entregar a reeleição de bandeja, por isso talvez esteja se precavendo. Até porque, seu grande trunfo tem sido a política externa, já que internamente qualquer adversário não precisaria fazer muita força para encontrar enormes falhas.

Não se pode, todavia, descartar a possibilidade dos fiscais da ONU terem descoberto alguma evidência decisiva de que Saddam tenha uma bomba atômica, ou esteja em vias de conseguir uma. Neste caso, um bombardeio preventivo seria uma questão até de prudência, estaria caracterizada a "legítima defesa".

Não se admite que um governante que dos 12 anos em que se manteve no poder, fez com que seu país permanecesse nove anos em guerra, detenha a posse de uma arma tão terrível e arrasadora. De qualquer forma, uma coisa não se pode negar: a permanência de Saddam Hussein à frente do governo do Iraque é algo que incomoda bastante o presidente Bush.

(Artigo publicado na página 16, Internacional, do Correio Popular, em 20 de setembro de 1991).


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