Amante da linguagem dos
anjos
Pedro
J. Bondaczuk
“A poesia não quer
adeptos: quer amantes”. Quem declarou isso, com tamanha ênfase, foi o poeta
espanhol Federico Garcia Llorca. Trata-se de uma arte que “não comporta gralhas
como a prosa”, conforme declarou a poetisa portuguesa “Florbela Espanca”, em
carta a um amigo, que consta do livro “Correspondência”. “É coisa tão delicada
que só vive de ritmo e de harmonia”, justificou. E concluiu: “Quase dispensa as
ideias. Quem lhe tocar, assassina-a sem piedade”. Concordo com essa colocação.
Como também concordo com Fernando Pessoa, que escreveu, em determinado trecho
do “Livro do Desassossego”: “Os críticos podem dizer que determinado poema,
longamente ritmado, não quer, afinal, dizer senão que o dia está bom. Mas dizer
que o dia está bom é difícil, e o dia bom, ele mesmo, passa. Temos, pois, que
conservar o dia bom em memória florida e prolixa, e assim constelar de novas
flores ou de novos astros os campos ou os céus da exterioridade vazia e
passageira”.
Aliás, a poesia
“nasceu” da necessidade humana de preservação. Foi o primeiro gênero literário
exercitado por pessoas sensíveis e inteligentes até mesmo antes da invenção da
escrita. Como?!!! Dado seu caráter mnemônico, foi o engenhoso artifício
inventado por nossos remotíssimos ancestrais para servir como uma espécie de
primitivo “arquivo” de fatos, descobertas, idéias e sentimentos, passados,
oralmente, de uma geração a outra. As pessoas decoravam os poemas e
passavam-nos adiante e assim o conhecimento era (e foi) preservado por anos a
fio, por décadas, séculos, quiçá milênios (só não se sabe quantos), até a
criação da escrita.
“Não é possível viver
sem poesia, por mais que se afirme o contrário. A poesia hoje possui uma
conotação e função absolutamente peculiar. A mais antiga forma de arte está
presente nas mais variadas maneiras expressivas, basta que se preste atenção
aos textos e mensagens que nos rodeiam nas atividades do dia a dia. A poesia,
sem desejar polemizar, está no povo, na natureza e na longiquitude do espaço
sideral”. O autor dessa afirmação é um poeta. Só poderia ser! Mas ele vai além
dessa condição (que, convenhamos, não é pouca coisa, mas é nobilíssima). É,
também, romancista, historiador, cronista e... professor. Refiro-me ao escritor
catarinense Harry Wiese, do qual tenho em mãos os dois mais recentes livros que
lançou pela Editora Nova Letra: “IbirAMARes e outros poemas” e “A história das
árvores-homens e outras crônicas”.
Calma, paciente leitor!
Antes que você ache que cometi erro de digitação no título do livro de poesias
vou logo avisando que ele é, mesmo, “IbirAMARes” (com o AMAR em maiúsculas).
Como se vê, não errei. É uma forma inteligente que o autor encontrou para
destacar seu amor pela cidade catarinense de Ibirama, que ele adotou (na
verdade, foi adotado por ela), posto que é natural do município de Presidente
Getúlio, igualmente do Estado de Santa Catarina. Antes de mergulhar de cabeça
nesse primoroso livro (uma jóia tanto no que se refere ao conteúdo, quanto à
bem cuidada edição), o que farei oportunamente, é mister que apresente, mesmo
que resumidamente, quem é este sensível poeta.
Harry Wiese tem 66
anos. Vai completar 67 em 13 de novembro (nasceu em 1948). É licenciado em
Letras – especialista em Metodologia de Ensino – e Mestre em Educação do Ensino
Superior. Tem vasta experiência em revisão de textos (TCCs, monografias,
dissertações, teses, artigos científicos, livros técnicos e de literatura).
Conta com 48 anos de experiência como professor de língua portuguesa - do
ensino fundamental até cursos de pós-graduação em diversas universidades. É
pesquisador da história da colonização do Vale do Itajaí, em Santa Catarina.
Harry Wiese conta, com
todos os méritos, com o reconhecimento de seus co-estaduanos (ainda bem!). Em 1999 foi agraciado com o Diploma e Medalha
Anita Garibaldi pelos trabalhos em prol da cultura no Vale do Itajaí do Norte.
Em 2007, recebeu o título de Cidadão Honorário de Ibirama, outorgado pela
Câmara de Vereadores local, em reconhecimento aos serviços prestados à
coletividade nos campos da educação, cultura e pesquisa histórica do município.
Em 2009 foi condecorado com Diploma de Mérito, categoria romance, pela
publicação de “A sétima caverna”, editora Hemisfério Sul, pela Academia
Catarinense de Letras. Falta, agora, reconhecimento nacional. Méritos para
tanto não lhe faltam.
Com o recente
lançamento dos dois livros que citei, conta com considerável bibliografia, que
ascende a já dez publicações, passando por vários gêneros. É autor das
seguintes obras: “Meu canto-amar”; “Girata de espantos”; “Nebulosa de amor:
Contos e poemas de Natal”; “A sétima caverna”,”De Neu-Zürich a Presidente
Getúlio: uma história de sucesso”; “A inserção da língua portuguesa na Colônia
Hammonia”: “Terra da fartura: história da colonização de Ibirama”: “Teoria da
Literatura”: “IbirAMARes e outros poemas” e “A história das árvores-homens e
outras crônicas”. A despeito de sua longa trajetória no magistério, de quase meio
século, continua em plena atividade. Harry Wiese é professor no Colégio São
Paulo, de Ascurra e funcionário da UNIASSELVI de Indaial.
Como se vê, é exemplo
de dedicação, idealismo, competência, longevidade, inteligência e muita,
intensíssima criatividade. Mas... Ele próprio confessa o que eu apenas
desconfiava: “Minha vida literária tem sua gênese na poesia”. Porém, não como
mero adepto. Harry Wiese é, antes de tudo, “amante” desse nobre gênero. Cumpre,
pois, o que Garcia Llorca considerava imprescindível. É, utilizando linguagem
poética, “bafejado pelas musas”. Exercita, com habilidade, emoção e
assiduidade, “a linguagem dos anjos” que é como Rainer-Marie Rilke
caracterizou, com rara felicidade, a poesia.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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