Sunday, December 13, 2015

Ignorância e negligência

Pedro J. Bondaczuk

O escritor alemão Johann Wolfgang Goethe escreveu, certa feita, que “a causa maior dos nossos problemas sempre oscila entre a ignorância e a negligência”. Isso vale para qualquer setor da vida. Inclusive a Literatura. Quantos livros não são arruinados por aí, o tempo todo, pelo fato de seus autores não terem buscado o devido esclarecimento (às vezes sobre um único aspecto que ignoravam) que, em vez de buscarem se informar a respeito, optaram, por preguiça ou por arrogância, expressar o que “entendiam” ser o correto (que não era), e se deram mal? São muitos, não é verdade?

Porém, esses problemas seriam evitados com só um pouquinho de cautela e com um tantinho a mais de esforço e até de humildade em admitir que não conheciam de fato o assunto de            que tratavam. Tais escritores evitariam os dissabores que passaram caso se dispusessem a pesquisar a respeito do que ignoravam. Ou, simplesmente, como manda o bom senso, não escrever nada a respeito. Mas essas pessoas entram, imprudentemente, “de cabeça” no problema e, neste caso, simultaneamente, pelos dois motivos citados por Goethe: ignorância e negligência, agravados por uma estúpida vaidade. Esse é somente um dos tantos exemplos que eu poderia citar não importa de que atividade.

Nossa tendência, quase que automática, é a de culpar terceiros, ou as circunstâncias, pelos problemas que nos sobrevêm, em vez de reconhecer nossa responsabilidade, não raro exclusiva, por sua gênese. Com isso, dificultamos, quando não inviabilizamos a solução. É como no caso de uma doença. Caso seja feito diagnóstico equivocado dela, será impossível prescrever a medicação ou o tratamento corretos. Em vez de curá-la, a agravaremos levando o paciente, não raro, à morte.  Lembro, a propósito, o que Confúcio afirmou: “Não são as ervas más que afogam a boa semente, e sim a negligência do lavrador”. E não estava coberto de razão?! São inúmeras as ocasiões em que nos mostramos negligentes, achando que essa atitude não nos trará mal algum. Todavia, salvo raras exceções, nossa negligência é causa de um problemão, que poderia ser evitado com só um pouquinho de boa vontade e de bom senso.  

A ignorância, ou seja, a incapacidade de entender o que quer que seja, mesmo que o objeto do não entendimento não seja muito complexo (que pode ser relativa ou absoluta), aliás, é a suprema das misérias. Nada é mais precioso do que o potencial de compreensão, a facilidade de entender o concreto e o abstrato, que convencionamos denominar de “inteligência”. É mister admitir que todos somos ignorantes de algo, embora em graus variáveis, uns mais, outros menos e outros, ainda, de forma absoluta. Não conheço o “gênio” que entenda tudo de tudo, todas as disciplinas, todas as artes, todas as ciências etc. que seja, em suma, onisciente.

Os sensatos admitem sua ignorância em determinados assuntos e procuram um jeito de entender o que lhes seja ininteligível, desde que necessitem desse entendimento. Saem à procura de fontes que lhes esclareçam o que desconhecem.  Quando não, deixam esses temas, para eles obscuros e além do seu alcance de entendimento, para os que são especializados neles. Com isso, evitam, com certeza, no mínimo, de descambar para o ridículo. Já os insensatos... Nem é bom falar! Cegos pela vaidade, transformam o que potencialmente seriam soluções em imensos problemas.

O conhecimento, desde que o homem primitivo tomou consciência de si e do universo que o rodeia, se expandiu, de tal sorte, que é impossível a qualquer pessoa, por mais genial e bem-dotada que seja, saber de tudo o que há. História, ciências, artes, tecnologia etc., estão em permanente expansão. E, cada uma dessas disciplinas, exige especialização. Ainda assim, mesmo os especialistas de cada uma dessas áreas, não conseguem apreender sequer ínfima parcela do conhecimento delas. Gostemos ou não, admitamos ou não, somos, em alguma medida, todos “ignorantes” de alguns assuntos.

Não há demérito nessa admissão. Afinal, como Alfred North Whitehead concluiu, em um texto notável: “O túmulo do saber não é a ignorância, mas a ignorância da ignorância”. Esta, sim, deve nos preocupar. Pois é, justamente, no pleno conhecimento das nossas limitações mentais, e no nosso esforço para supri-las, que reside o princípio da sabedoria. Admitamos ou não, nosso conhecimento sobre o mundo que nos cerca, embora achemos que seja extraordinário, é ínfimo, ridículo, pífio, diante do que há, ainda, por aprender. Imaginem em relação ao universo! A extensão de nossas vidas veda-nos a mais remota possibilidade da onisciência.


Portanto, convém não sofrer em demasia com as incertezas. É prudente, sobretudo, não as transformar em “doenças do espírito”. Haveremos de conviver com elas – múltiplas, variáveis, intensas ou fracas – enquanto vivermos. Tudo o que nos cerca é incerto, duvidoso, passivo de comprovação. E quando comprovamos alguma coisa, a prova nunca é cabal, irretorquível, absolutamente convincente, sem nenhum aspecto obscuro carente de maior esclarecimento. Qual é a fonte dessa nossa compulsória incerteza? É, sem dúvida, o desconhecimento. E essa ignorância é a gênese, ao lado da negligência, como afirmou com extrema pertinência Johann Wolfgang Goethe, se não de todos, pelo menos da imensa maioria dos nossos problemas.    Fôssemos oniscientes, não haveria o mínimo espaço para o duvidoso, o misterioso e o incerto. E muito menos para o erro. Todavia... não somos assim.

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