Wednesday, December 30, 2015

Planejar é preciso

Pedro J. Bondaczuk

O décimo quinto ano do terceiro milênio da era cristã está prestes a terminar, com seus dramas, tragédias, comédias e coisas boas e ruins, de acordo com a realidade de cada um. Como se vê, nada de novo, que não tenha ocorrido em 2014, 2013, 2012 e vai por aí afora. Muitos dirão que tivemos de novidade a crise política e econômica, ainda não resolvida, cujos próximos capítulos podem trazer, ou não, surpresas agradáveis ou não. Onde a novidade, porém? Desde que me conheço por gente, o País sempre conviveu com esse tipo de situação, ora mais grave, ora menos, mas nunca ausente. Queiram ou não, o brasileiro é viciado em crises.

Engraçado é que, apesar de se tratar de mera mudança de números em uma folhinha, as pessoas (e eu também, claro) agem como se o começo do novo ano fosse o início de uma nova era, que fantasiam como próspera e radiosa, ou pelo menos melhor do que a que está no fim. Quase que mecanicamente, consideram que o período recém-findo lhes trouxe só amarguras e dissabores, esquecidas das alegrias e bênçãos que tiveram, geralmente não poucas e nem inexpressivas. Somos incorrigíveis insatisfeitos, ora pois. As pessoas (e eu não sou exceção) passam a fazer planos, geralmente muito vagos e inconsistentes, para o futuro próximo, acompanhados de resoluções, que raros cumprem.

É errado planejar? Diz o bom senso que não! O grande erro que se comete é o de ignorar os planos feitos, logo na primeira semana do novo ano, e sequer tentar cumprir o planejado. A menos que aquilo que se planejou não seja factível, se mostre irrealizável, absurdo ou mesmo pernicioso. Neste caso, a falha está no “planejador” desastrado, que confundiu plano com mero e fantasioso devaneio. Apenas perdeu tempo e nada mais. O planejamento nada mais é do que uma preparação para o que se pretende fazer. É ordenar as ações, para não ser dispersivo. Em suma, é um exercício de autodisciplina. O norte-americano Benjamim Franklin (um dos “pais” da pátria de Tio Sam), advertiu: “Falhar em preparar-se é preparar-se para falhar”. E como é!!!

O ideal (e, sobretudo, realista) é nunca fazer planos rígidos, que não comportem alterações, ditadas pelas circunstâncias e pelos caprichos do acaso. O escritor romano, Publius Syrius, já sabia disso e observava, lá por volta do ano 50 a.C. que “o plano que não pode ser mudado não presta”. Não presta mesmo. Afinal, não sabemos sequer o que vai acontecer no minuto seguinte, quanto mais em semanas, quinzenas e meses. Um leitor, cujo nome foge-me no momento, perguntou-me se é possível o escritor planejar um livro. Respondo que não somente é possível, mas desejável. Põe ordem no empreendimento. Determina um cronograma e define quando, como e onde pesquisar, as horas destinadas à leitura e à redação e outras coisas assim. Claro, levando sempre em conta a possibilidade de mudanças “quando” e “se” forem necessárias.

Não vou ao cúmulo de afirmar que livros não planejados sejam inviáveis ou tenham qualidade melhor ou pior. Esse aspecto depende do talento e da criatividade do autor e não como, onde e quando ele escreve. Afirmo, porém por experiência própria, que o planejamento (reitero, não muito rígido) ajuda. Sem nunca perder de vista a observação feita pelo dramaturgo francês, Jean Moliére: “É longo o caminho que vai do projeto à coisa projetada”. Longo e geralmente trabalhoso. Nesse caso, o plano só tende a pôr ordem na tarefa, para que o escritor não desperdice esforços, por falta de organização.

Esse mesmo leitor, que me questionou a propósito de planejamento de um livro, pergunta onde entra a “inspiração” nessa equação. Não entra. Quem acompanha com assiduidade meus textos sabe o que penso a esse propósito. Nenhum livro vem prontinho do firmamento direto ao nosso cérebro, bastando, apenas, que o transcrevamos. Não é assim que a coisa funciona. Inspiração não passa de um lampejo, de um fragmento de idéia, que exige muito trabalho e muito conhecimento para ser viabilizada. Literatura é trabalho, é disciplina, é poder de observação. E, claro, tudo isso movido pelo talento. Se o sujeito não foi feito para a coisa, não adianta. Pode até escrever algo, mas seu texto não passará de um caricato monstrengo, de um disforme Frankenstein literário (na verdade, nem isso, pois não merecerá essa pomposa designação). Nesse aspecto, concordo com o escritor espanhol, Camilo José Cela: “A inspiração é trabalhar uma boa quantidade de horas”. Creia-me, leitor, é isso mesmo, sem tirar e nem por.

Por isso, caro escritor, que tal planejar aquele livro que você sonha, há anos, em escrever, mas que nunca ousou mover uma única palha para a sua redação? Esta é a hora mais adequada para uma resolução deste tipo para 2016. Mas não aja como a maioria das pessoas que, tão logo passe a ressaca do “réveillon”, esquecem tudo o que prometeram fazer no novo ano. Cabe, aqui, a forma com que encerrei uma crônica, escrita há uns vinte anos:

“As solenes resoluções da véspera serão prontamente esquecidas. A vida seguirá o seu curso, até o próximo final do ano. Estudos, trabalho, namoro, casamentos, separações, planos, sucessos, fracassos, encontros e desencontros, nascimentos e mortes... Tudo se sucederá, meio que aleatoriamente. E continuaremos, como sempre, buscando a felicidade alhures, mesmo que ela esteja debaixo do nosso nariz. A esperança ainda é o grande alimento das ilusões humanas. E estas constituem-se na essência da vida...” Sobretudo, planeje e busque seguir ao máximo o que planejou.


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