Um dos construtores de
São Paulo
Pedro
J. Bondaczuk
O padre José de
Anchieta foi morar e lecionar no Colégio do Planalto de Piratininga – embrião
da futura cidade de São Paulo – exatamente cinco meses após o início da sua
construção. A princípio foi instalado em uma rústica casa de pau a pique,
coberta de palhas, que em fins de agosto de 1553 o cacique Tibiriçá e seus
comandados ergueram, atendendo solicitação do padre Manoel da Nóbrega.
Aquela mesma casinha, a
primeira a ser erguida nos arredores do futuro Colégio, fez as vezes de capela
quando, na ensolarada manhã de 25 de janeiro de 1554, data em que a Igreja
Católica celebra o chamado “Apóstolo dos Gentios”, o padre Manuel de Paiva
celebrou a primeira missa e abençoou o local que abrigaria a nova povoação.
Para todos os efeitos, essa data foi estabelecida como a de fundação da cidade
de São Paulo. A igreja dos jesuítas seria construída, e inaugurada, somente
pouco menos de três anos depois, em novembro de 1556.
Na sua construção – bem
como na do próprio Colégio – José de Anchieta trabalhou e trabalhou duro. Não
me refiro a tarefas meramente burocráticas, de administração da obra, ou
comandando grupos de operários. O jovem sacerdote pegou “no pesado” (como se
diz popularmente) mesmo. Trabalhou, e muito, e em sentido literal, exercendo
trabalho braçal. No auge do vigor físico, com pouco mais que 21 anos de idade,
o sacerdote gozava de excelente saúde. Era forte, resistente e suportava muito
bem os mais pesados trabalhos. E esse seu invejável vigor foi de imensa
utilidade na empreitada, em que se destacou, reitero, como operário, pintando
paredes, carregando enormes quantidades de terra e cumprindo várias outras
tarefas rudes, como os demais trabalhadores.
Não é, pois, nenhum
exagero afirmar que, se Anchieta não foi fundador de São Paulo, honra que coube
ao seu superior hierárquico, Manoel da Nóbrega, foi, literalmente, um dos seus
construtores. Os recursos existentes na época, no setor de construção, eram dos
mais rudimentares, mesmo nas mais avançadas metrópoles européias. Tudo dependia
da força do braço dos operários, desde a fabricação de tijolos, da lavra de
pedras, do corte de árvores, da fabricação de vigas e da busca de outros tantos
materiais necessários, até a própria ereção das paredes, do telhado, do piso
etc.etc.etc. Imaginem, então, o desafio que era construir qualquer tipo de
edifício, mesmo que mera cabana de pau a pique, naqueles remotos ermos, naquela
selva bruta e perigosa, naqueles inexplorados recantos de uma terra
recém-descoberta! Afinal, fazia pouco mais de cinqüenta anos, apenas, que
Cabral havia descoberto esse imenso território abaixo da linha do equador que
viria a se constituir no Brasil.
José de Anchieta era um
visionário, um idealista, um sonhador, todavia, antes de tudo, era homem
prático e de ação. Não se limitava a idealizar ou a sonhar, mas arregaçava as
mangas e se empenhava de verdade para concretizar seu sonho. Somente essas
virtudes seriam capazes de explicar tamanha determinação e tanto esforço, sem
esperar qualquer tipo de reconhecimento, para ajudar pessoas que acabara de
conhecer. Anchieta estava consciente da necessidade que aquela gente atrasada e
primitiva, ainda sob o domínio de bárbaras crenças, de práticas pagãs e de toda
a sorte de superstições, tinha de instrução, mesmo que da mais rudimentar e
primária que, para ela, no entanto, significava fantástica evolução
civilizatória.
Esse trabalho imenso,
estafante e admirável foi coroado de êxito. No dia de “Todos os Santos”, em 1°
de novembro de 1556, foi inaugurada a Igreja do Colégio – como passou doravante
a ser conhecida – com missa solene, em que foi consagrada e entregue ao culto
dos fiéis. Por essa razão, é injusto e, inclusive, inverdade histórica, não se
considerar José de Anchieta – um dos alicerces, se não a viga mestra do embrião
que originaria a cidade de São Paulo – como um dos construtores, de dos mais
importantes (que de fato foi) desta que é hoje a terceira metrópole mais
populosa do mundo. Os paulistanos, de todos tempos e idades, devem, portanto,
muito a este notável idealista.
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