Influências e
experiências
Pedro
J. Bondaczuk
A formação acadêmica de
Sigmund Freud foi a Medicina. Para chegar onde chegou, sofreu várias
influências e passou por inúmeras experiências, muitas das quais infelizes e
até mesmo trágicas. Mas... o resultado final é o que conta. E este, como todos
sabem, foi a consagração. Durante o curso de Medicina e nos primeiros anos após
a formatura, nada indicava que seu interesse, mesmo que remoto, fosse, ou viria
a ser algum dia, a mente, com seus mistérios e complexidade e, sobretudo, seus
desarranjos. Consta que Freud sequer chegou a ser um aluno brilhante. Muito
pelo contrário, em muitas ocasiões se descuidou dos estudos para se dedicar à
pesquisa científica. E sua curiosidade na ocasião sequer era voltada para o
cérebro humano (ou de qualquer outro animal). Seu foco era, por estranho que
pareça, os órgãos sexuais das enguias. Isso mesmo, sem tirar e nem pôr. Quem
diria!
Freud ingressou na
Universidade de Viena muito jovem, ainda quase menino, aos 17 anos. Aquele
adolescente inquieto sequer tinha noção exata do que queria. Não se tratava de
nenhum estudante que sentisse vocação inequívoca para determinada profissão, no
caso, a Medicina. Tanto que seus planos iniciais eram os de cursar Direito e se
tornar advogado, já que a advocacia, na época, rendia, além de prestígio
social, muito dinheiro. Não se sabe o que o fez mudar de idéia e optar pelas
ciências médicas. . Enfim, foi o que escolheu cursar. E, aos trancos e
barrancos, como se diz popularmente, conseguiu se formar. Graduou-se, em
Medicina, em 1881, com 25 anos de idade.
A primeira vez que
Freud entrou em contato com algum tipo de estudo sobre o cérebro foi em 1877.
Ainda estava na faculdade, onde era quartanista. Na própria Universidade de
Viena em que estudava, conheceu o professor Ernst Wilhelm Von Brücke, que viria
a modificar toda a sua vida. O pitoresco é que esse mestre hoje é conhecido
justamente por sua influência sobre Freud. Mas na época, tinha lá seu prestígio
pessoal firmado. Já o jovem que se encantou com ele não passava de mero
estudante, curioso, mas comum, nada brilhante, e um tanto relapso até. Brücke
era conhecido por lecionar uma disciplina não muito conhecida então e nem tão
requisitada: Psicologia.
Freud passou a
freqüentar o laboratório do mestre, fazendo o que mais gostava de fazer desde
que começou a estudar Medicina: pesquisa científica. Seu interesse, agora, não
era mais tão exótico como quando havia concentrado a atenção nos órgãos sexuais
das enguias. Foi encarregado pelo mestre de fazer dissecações de órgãos não
somente de animais, mas também humanos num estudo tanto de anatomia quanto de
histologia. Dentre estes, o que mais o fascinou foi o cérebro. Na oportunidade,
pôde, até mesmo, identificar semelhanças na estrutura cerebral de humanos e de
répteis.
Já formado, Freud
continuou trabalhando no laboratório de Bückner. Mas o salário que recebia era
muito baixo, diria que irrisório ou pífio. Mal dava para seu sustento pessoal.
Tudo estaria bem, no aspecto financeiro, se o jovem recém-formado permanecesse
só. Todavia... Cupido, o mitológico deus do amor, entrou em cena. Foi quando
conheceu Martha Bernays. Foi amor à primeira vista e recíproco. Mas como
poderia se casar com a miséria que recebia como salário? Não poderia. Seu
mestre, a contragosto, mesmo satisfeito com o desempenho do jovem auxiliar,
aconselhou-o a mudar de emprego. Ponderando na sua deprimente situação
financeira e na falta de perspectiva, de futuro, na pesquisa científica, Freud
resolveu seguir o caminho mais lógico.
Conseguiu colocação no
Hospital Geral de Viena, a mais importante instituição do gênero da cidade,
onde além de salário muito maior do que no emprego anterior, teria perspectivas
de fazer carreira, como médico. Mas...
As coisas não ocorreram como sonhava. Principalmente em decorrência de algumas
desilusões profissionais, causadas por experiências mal sucedidas, dir-se-ia
desastradas, que fez. A principal referia-se aos supostos efeitos terapêuticos
do uso da cocaína no tratamento de determinadas doenças mentais. A gota d’água
foi a morte, por overdose da droga, de um amigo da época em que trabalhava no
laboratório de Brücker. Talvez para abafar o escândalo (mas esta é uma
suposição minha, sem nenhuma comprovação), Freud decidiu pedir licença
temporária do Hospital Geral, no que foi prontamente atendido. .
Decidiu viajar para a
França, para conhecer o já famoso psiquiatra francês, Jean-Martin Charcot,
consagrado, ao lado de Guillaume Duchene, como um dos fundadores da neurologia
moderna. Esse contato, deu mais um “empurrãozinho” (na verdade um
“empurrãozão”) na carreira e no futuro de quem viria a se transformar, um dia,
no “Pai da Psicanálise”. Passou a
trabalhar com o consagrado cientista no Hospital Psiquiátrico Saltpétriére, que
na ocasião estudava a histeria. Freud entusiasmou-se com o mestre e com as
descobertas que este fez desse desarranjo psicológico, até então pouco
conhecido, posto que bastante comum.
Finda a licença,
retornou a Viena e retomou suas funções no Hospital Geral. Agora, sentia-se
muito mais confiante e mais experiente após o estágio que fez com Charcot.
Decidiu, então, colocar em prática tudo o que havia aprendido. Passou a atender
jovens senhoras, na maioria judias, que sofriam de sintomas aparentemente
neurológicos, mas que Freud desconfiava que fossem de fundo psicológico, como
perda de controle motor, alucinações, cegueira parcial e até paralisia. Os
exames convencionais dessas pessoas nada revelavam. Não evidenciavam qualquer
problema físico. Por isso, os que tinham esses sintomas eram tratados com
massagens, recomendações de repouso e hipnose. Em alguns casos, essas terapias
davam resultado, mas... nem sempre. É aí que começa a atuação de Freud, que o
levou à criação da Psicanálise.
Mas, antes de encerrar
estas reflexões à margem de hoje, querem saber o que aconteceu com os
“pombinhos apaixonados”, Freud e Martha?
A despeito do salário do hospital ser muito maior do que o do
laboratório de Brücker, não era suficiente para custear o casamento do jovem
médico com sua musa.Surgiu, porém, uma solução inesperada e providencial O romance do casal apaixonado teve, afinal, o
“happy end”. E foi, graças à providencial ajuda dos amigos do tempo de
faculdade, daqueles mais abastados, claro, principalmente de Josep Breuer
(outra das tantas influências na vida do futuro “Pai da Psicanáslise”.Dessa
forma, Freud e Martha juraram fidelidade eterna um ao outro em setembro de 1886,
“até que a morte” os separasse..
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