Sunday, June 16, 2013

Assassinatos impunes


Pedro J. Bondaczuk


A sociedade reclama, e com razão, da impunidade dos chamados crimes de colarinho branco, caracterizados por negociatas e falcatruas cometidas por figurões, mas nem sempre cobra punição para um outro tipo de delito, muito mais hediondo, em relação ao qual a Justiça tem passado ao largo.

Tratam-se dos assassinatos de crianças e adolescentes, denunciados em várias ocasiões pela Anistia Internacional, mas cujos autores acabam sendo esquecidos e deixados em paz. A maior parte desses massacres é cometida contra meninos e meninas abandonados, principalmente na violentíssima Baixada Fluminense.

Tais atos, em geral, são praticados por grupos de assassinos frios, maníacos que precisam ser tirados das ruas, com urgência, dada sua paranóia, que se auto-intitulam de "Vigilantes".

Apenas entre março e agosto do corrente ano, 424 delitos do tipo foram cometidos. Destes, todavia, só 17 tiveram seus autores identificados. Tais dados constam de relatórios de Análises Sociais e Econômicas e Movimento Nacional dos Meninos de Rua.

Está aí uma situação em que seres humanos, que não pediram, evidentemente, para virem ao mundo em que foram colocados por pais absolutamente irresponsáveis, são tratados de forma pior do que animais. Para a proteção destes últimos, a sociedade até que tem se mobilizado a contento.

É freqüente exibirem-se reportagens mostrando cidadãos sendo presos por manterem aves ou macacos ou outros tipos quaisquer de bichos que estejam em risco de extinção em cativeiro. No entanto, o mesmo não acontece em relação aos que exploram crianças – inclusive sexualmente – maltratam esses pequenos seres humanos e, o que é muito mais grave, os assassinam, sem nenhuma contemplação, como se estivessem matando pardais, formigas ou gafanhotos.

Os menores abandonados, se cometem delitos para sobreviver, estão agindo por instinto. Se a sociedade pretender se proteger contra a sua ação, deve deixar de lado seu cinismo e traçar um programa de assistência. Mas não se concebe, em nenhuma circunstância, que simplesmente feche os olhos para o que está acontecendo, como se a agressão contra seus semelhantes fosse algo que em absoluto não lhe dissesse respeito.

Ignorar a questão não significa resolver o terrível drama. A omissão somente conseguiu multiplicar o número de crianças absolutamente abandonadas que hoje já são, conforme estimativas até otimistas, mais de sete milhões. As escolas que se deixarem de construir hoje, serão os presídios que se terão de erguer amanhã. Negar esta verdade é esconder o sol com a peneira.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 10 de novembro de 1990).


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