Oposição trapalhona
Pedro J. Bondaczuk
A parcela lúcida da oposição
romena, aquela composta por políticos que realmente merecem esse nome, soube
extrair lições da contundente derrota sofrida nas urnas, nas eleições de
domingo passado, para a Frente de Salvação Nacional, integrada por
ex-comunistas.
Foram a impaciência e os exageros
cometidos por alguns oposicionistas os principais responsáveis pela surpresa
que o eleitorado lhes reservou. As seguidas manifestações em praça pública, as
expressões de intransigência e confrontação e a postura de donos da verdade de
muitos deles assustaram a população, ainda traumatizada pela sangrenta
revolução de dezembro de 1989.
Nenhum romeno sentiu-se confiante
em entregar os destinos do país, que vive duríssima crise econômica, nas mãos
de pessoas que mostraram inexperiência até mesmo para administrar mera campanha
eleitoral.
Pode-se dizer, portanto, sem
fugir muito da verdade, que não foi bem a Frente de Salvação Nacional que
venceu as eleições, mas, sim, a oposição que as perdeu. E não adianta lançar
suspeitas sobre a lisura do processo eleitoral, como vem sendo feito até aqui.
Em primeiro lugar, a votação foi
supervisionada por cerca de 500 observadores internacionais, de 12 países, a
maioria dos Estados Unidos, representada por experientes deputados do Congresso
norte-americano.
Em segundo, o número de votos
obtido pelo grupo governista, que agora se transforma em partido, equivaleu a
85% do total. Mesmo que tenha havido, portanto, alguma irregularidade, num país
onde a trapaça eleitoral jamais foi novidade, as coisas erradas não foram de
tal monta a ponto de propiciar aos supostos fraudadores um massacre tão
contundente nas urnas.
O que ocorreu na Romênia foi que
os opositores foram com muita sede ao pote e o acabaram quebrando. No afã de
mostrarem seu repúdio aos comunistas e que não tinham nada a ver com o regime
do deposto ditador Nicolae Ceausescu, acabaram se aproximando mais do que de fato se distanciando das práticas
do sistema que procuravam condenar.
As imagens de televisão
mostraram, na terça-feira, uma tentativa de linchamento do novo ministro da
Justiça, então sequer empossado, e que se dispôs a ir à Praça da Universidade
de Bucareste, onde os opositores radicais estão acampados há quase um mês, para
iniciar negociações com os manifestantes.
Quantos atos mais, deste tipo,
não aconteceram? Inúmeros, certamente. Muita gente pacata não expressou em
público seu repúdio por essa baderna, certamente, por timidez, quando não por
medo de represálias. Preferiu, no entanto, usar a grande arma da democracia
contra os despreparados para o seu exercício: o voto. Daí a eleição de Íon
Iliescu para a Presidência romena, com devastadores 85% de votos, sequer poder
ser classificada de “surpresa”.
(Artigo publicado na página 10,
Internacional, do Correio Popular, em 26 de maio de 1990).
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