O cerne da
personalidade
Pedro
J. Bondaczuk
O “Pai da Psicanálise”,
Sigmund Freud, em seus estudos da racionalidade humana – e de seus desvios, ou
seja, da irracionalidade – identificou, (recapitulemos o que já refletimos
juntos até aqui), três níveis de
consciência. Denominou-os, como já informei, de “ID”, “Ego” e “Superego”. Na
sequência, resumi no que consiste esse primeiro substrato. Em poucas palavras,
é, de acordo com Freud, a fonte de energia psíquica, que se pode chamar de
“libido”. É completamente inconsciente. Caracteriza-se pelos impulsos,
motivações e desejos mais primitivos e selvagens do ser humano. É nesse
substrato que se localizam as pulsões de vida e de morte. É irracional. Não faz
planos, não espera, não admite frustrações e não tem nenhuma inibição.
Funciona, exclusivamente, tendo por objetivos a busca do prazer (não importa
por quais meios) e a fuga da dor.
Pois bem, o nível
seguinte da consciência que Freud identificou é o “Ego” (em alemão, “ich” ou
eu). Desenvolve-se a partir do ID e atua como uma espécie de censor deste.
Define se os impulsos e desejos irracionais e instintivos são factíveis ou não,
se são positivos ou destrutivos (da própria pessoa e de terceiros), de acordo
com o mundo externo, ou seja, com o “princípio da realidade”.
O Ego não é totalmente
consciente, porquanto conta com mecanismos de defesa que integram um nível do
inconsciente. É certo que a maior parte dos seus processos são conscientes. Nem
todos, no entanto, o são. Freud chegou a esta conclusão ao observar que em
certas ocasiões alguns desejos instintivos procedentes do Id são rejeitados ou
reprimidos por esse substrato da mente sem que o sujeito sequer tenha
consciência ou dos desejos ou da sua rejeição ou repressão. É mediante o
princípio da realidade que o Ego introduz, em nosso comportamento, a razão, o
planejamento e a espera.
Sua principal função é
a de buscar harmonizar os desejos do ID e sua possibilidade de concretização,
sem se chocar com as exigências do Superego. Atua como mediador, como
facilitador da interação entre o nível primitivo e instintivo da consciência e
as circunstâncias do mundo externo. É
nesse substrato que estão as funções básicas da racionalidade humana, como as
da percepção, do conhecimento, da linguagem e da aprendizagem. Ou seja, todos
os recursos através dos quais o homem se adapta ao meio ambiente.
Seu próprio nome (Ego, ou “Eu”) sugere
do que se trata. É o que chamamos, comumente, de “personalidade”. É o que nos
caracteriza e nos faz ser o que somos. Ou seja, originais e únicos. Freud
imaginava constante luta interna, dentro da nossa mente. O ego é continuamente pressionado por
forças contrárias insistentes. Por um lado, tem que tentar retardar os ímpetos
agressivos e sexuais do ID. Compete-lhe perceber e manipular a realidade para
aliviar a tensão resultante. Mas tem que lidar, também, com a busca do superego pela perfeição. E, quando é
pressionado demais por essas duas forças, quase sempre antagônicas, o resultado
é a condição definida por Freud como “ansiedade”.
É relativamente fácil ao psicanalista
distinguir um ego amadurecido de um infantil e neurótico. No primeiro caso, ele
não se assusta com os desejos do ID, selvagens, instintivos e irracionais, que
não medem conseqüências, assim que se cientifica deles. Analisa-os à luz da
realidade e, se forem positivos e factíveis, se forem racionais, os satisfaz.
Caso contrário, elimina-os. Já o Ego infantil ou neurótico resiste em sequer
trazer esses desejos do ID à consciência, sem o menor julgamento ou análise.
Defende-se contra eles através da repressão (recalque) e de outros tantos
mecanismos. E, com isso, torna-se fonte de desarranjos mentais, que se
refletem, invariavelmente, no corpo.
Freud aconselhou, certa
feita, as pessoas a agirem da seguinte maneira: “Volte seus olhos para dentro,
contemple suas próprias profundezas, aprenda primeiro a conhecer-se! Então,
compreenderá por que está destinado a ficar doente e, talvez, evite adoecer no
futuro”. Quando fez essa recomendação, estava pensando, óbvio, na atuação do Ego.
Notaram o quanto somos complexos?
Perceberam o quão difícil, posto que necessária (diria indispensável) é a busca
do conhecimento mais importante que devemos perseguir incansavelmente, que é o
autoconhecimento? Contudo, ao tentarmos fazê-lo, certamente chegaremos à mesma
conclusão de Sigmund Freud, a que o levou a exclamar: “Cada pessoa é um abismo!.
Dá vertigem olhar dentro delas!”. Pode dar vertigem, de fato, mas... considero
que aceitar esse desafio é um ato de coragem e de grandeza que nos caracteriza
como “homens” em seu sentido mais amplo.
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