Momento decisivo
A União Soviética vai viver,
hoje, um dia decisivo em sua história, quando um projeto de reforma econômica,
o verdadeiro cerne da perestroika de Mikhail Gorbachev, vai chegar ao Soviete
Supremo, encontrando resistência antecipada dos parlamentares.
É verdade que o plano é mais suave do que o original, esboçado em dezembro de 1989. Ainda assim, é muito duro, pois vai implicar em medidas sumamente impopulares, num período em que o presidente ostenta os mais baixos índices de popularidade desde que chegou à liderança nacional, em março de 1985.
Prevê, por exemplo, a dispensa de
até 50 milhões de trabalhadores, uma quantidade mais do que suficiente para
provocar uma convulsão social em qualquer outro país que não esteja passando
pelas agudas contestações que a superpotência do Leste passa agora.
Além de tudo, vão dobrar os
preços dos alimentos. Os economistas do Cremlin asseguram que todo esse
contingente que será despedido não ficará entregue à própria sorte. Prometem
criar frentes de trabalho que absorvam todos os que ficarem desempregados, em
obras de infra-estrutura espalhadas por todo o país.
Falam, inclusive, num “ne4w
deal”, citando, textualmente, o programa adotado pelo ex-presidente
norte-americano Franklin Delano Roosevelt, que ajudou a população dos EUA a
atravessar a duríssima fase da Grande Depressão e partir para uma etapa de
imensa prosperidade de que goza há já 60 anos.
Quem diria que um dia nós
ouviríamos soviéticos não somente elogiar, mas copiar algum modelo do seu
adversário da guerra fria! Pois isto tornou-se possível graças ao realismo e à
enorme coragem de um homem tido em seu país como lunático e que o Ocidente, com
muita justiça, aprendeu a admirar. Claro que me refiro a Mikhail Gorbachev.
Aliás, vindo desse estadista,
nada mais surpreende. Nem o falo dele estar custeando as despesas de uma
delegação de empresários e economistas norte-americanos, da qual um dos membros
é Jeffrey Sachs (considerado o menino prodígio da sua profissão na atualidade)
e assessorada (pasmem) pelo ultraconservador Milton Friedman, para orientar os
técnicos soviéticos na implantação das reformas em sua arrebentada economia.
Além do que, pessoas que, no
passado, haviam caído em desgraça no Leste europeu, ou que eram freqüentadoras
de cadeias, por divergirem de Moscou, agora já passaram pelos gabinetes do
Cremlin, e recebidas com respeito e
cordialidade. Sinais dos tempos!
Por exemplo, Lech Walesa, Vaclav
Havel e, mais recentemente, Alexander Dubcek estiveram com Gorbachev e saíram
impressionados com a humanidade do presidente soviético.
A população da URSS, portanto, ou
é suicida, ou ela, sim, ficou totalmente lunática por repudiar esse homem que
está procurando trazer sua sociedade para a dura realidade e acabar com o “país
das maravilhas” das Alices comunistas.
(Artigo publicado na
página 15, Internacional, do Correio Popular, em 24 de maio de 1990).
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