Pedro J. Bondaczuk
As sociedades democráticas contemporâneas têm discutido, cada vez mais, sobre se uma democracia autêntica comporta ou não lideranças fortes. Uma das reclamações recorrentes refere-se à suposta ausência de estadistas que coloquem o bem comum acima de quaisquer ambições ou pretensões pessoais. O debate a propósito é não apenas válido como, no meu entender, indispensável. Há os que temem líderes carismáticos (entre os quais me incluo), por causa de certa tendência que eles manifestam para o culto à personalidade, que em geral descamba para a ditadura.
Mas o problema precisa ser, igualmente, dividido com os liderados. Estes têm que ter tirocínio para não se deixarem conduzir por qualquer megalomaníaco que fale bem, exponha com razoável clareza e lógica planos evidentemente mirabolantes (e, portanto, inexeqüíveis) e que, sobretudo, assumam postura de "salvadores da pátria". O melhor meio de prevenir erros crassos na identificação de lideranças autênticas e positivas e distingui-las das tirânicas e malévolas, é a informação: farta, livre, correta e coerente.
O historiador norte-americano Arthur M. Schlesinger Jr., em recente trabalho que publicou a respeito, constatou: "A liderança pode modificar a história para melhor ou para pior. São os líderes os responsáveis pelos crimes mais horríveis e as loucuras mais extravagantes que desgraçaram a raça humana. Mas a eles também se credita terem induzido a humanidade a lutar pela liberdade individual, a justiça social e a tolerância religiosa e racial". Um corpo é absolutamente incapaz de sobreviver sem uma cabeça. O mesmo vale para uma sociedade. Caso seja acéfala, acaba por se desagregar e desaparecer.
Mikhail Gorbachev e Saddam Hussein são, ambos, líderes. O segundo já morreu, executado após ser condenado por crimes contra a humanidade, o que ocorreu pouco depois da invasão do Iraque por tropas norte-americanas, como represália (se justa ou injusta é outra questão) ao atentado de 11 de setembro de 2001, que resultou na destruição das torres gêmeas do World Trade Center de Nova York. O primeiro continua vivo, posto que já esquecido pela opinião pública internacional, contando tanto com ferozes detratores, quanto com fiéis admiradores.
Todavia, é possível, coerente e justo igualar ambos, em suas respectivas atuações? Claro que não! São como água e óleo: imiscíveis. Vaclav Havel e Muammar Khadafy também foram líderes, assim como Adolf Hitler e Mohandas Karamanchand Gandhi. Mas as diferenças saltam à vista, sem que seja preciso lembrar a história para estabelecer diferenciações. Há, pois, líderes e líderes. Uns são fatores de progresso e de satisfação de suas respectivas sociedades. Outros são causas de desgraças e ruínas.
Nas democracias, as lideranças não se impõem (ou não são impostas) através de golpes, conchavos, massacres, torturas e prisões em massa. Os líderes precisam mostrar clarividência e competir com outros que tenham a mesma pretensão e presumível aptidão. Submetem-se à escolha popular, correndo o risco de serem preteridos, através de indispensáveis mecanismos de voto, que entre nós boa parte dos cidadãos ainda não entendeu a relevância. A conscientização política demanda tempo e paciência. E, claro, informação farta, livre, universal, correta e a salvo de manipulação.
O pensador norte-americano Ralph Waldo Emerson explicou a razão de precisarmos de pessoas íntegras, de pulso forte e coração compassivo, que nos conduzam. Escreveu: "Nós nos nutrimos de gênio. Os grandes homens existem para que existam homens maiores".
Os liderados precisam, reitero, desenvolver aptidão especial para identificar corretamente seu líder. Numa democracia, os erros podem ser corrigidos pelo exercício periódico do voto. Se o sujeito frustrou expectativas e mostrou-se ineficaz e inadequado, basta não reelegê-lo nunca mais. Numa tirania, porém... isso, óbvio, não é possível. Esta, portanto, é um mal que, forçosamente, tem que ser cortado pela raiz, antes que se desenvolva e prospere.
Alexis de Tocqueville alertou para os riscos de lideranças inaptas, ou desonestas, ao afirmar: "Uma democracia só pode obter a verdade como resultado da experiência; e muitas nações podem perecer enquanto aguardam as conseqüências do seu erro". Não é mais sábio e prudente evitar esse risco, identificando líderes autênticos, idealistas e justos, que nos conduzam com segurança e correção e lhes entregando a responsabilidade de gerir nossos destinos? E como fazer isso? Reitero, pela informação farta, livre, universal, correta e a salvo de manipulações. Ademais, encontrar esses líderes adequados e ideais requer aguçada capacidade de observação, senso crítico e, sobretudo, isenção. Daí a escolha de candidatos nos quais votar não poder ser feita com base em critérios subjetivos, como a maioria, mundo afora, ainda faz.
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