Sunday, January 06, 2013

Operação legal, mas imoral

Pedro J. Bondaczuk

Os governantes dos países com grande tradição democrática, aqueles nos quais sequer se cogita na possibilidade de uma ruptura institucional, têm, como tarefa adicional às suas funções normais de governo, a escolha criteriosa de seus ajudantes. Isto porque, um equívoco nesse sentido, pode redundar na sua queda. É o que está acontecendo, por exemplo, agora com o primeiro-ministro japonês, Noboru Takeshita, que conquistou grande respeito pelas suas posturas em âmbito internacional, mas que está na iminência de ter que renunciar por causa de um escândalo doméstico: o das ações. É que um seu secretário cismou de enriquecer da noite para o dia. Adquiriu títulos da "Recruit Company", uma importante editora japonesa, antes deles serem postos à venda ao público.

Através da sua posição, ele tinha acesso aos balanços da empresa. Portanto, sabia que ela era lucrativa. A operação, frise-se, não foi ilegal, embora imoral. Quando as ações foram colocadas no mercado, imediatamente tiveram uma valorização de 400%. E o "esperto" funcionário embolsou um polpudo lucro, negociando os títulos que possuía.

O caso vazou para a imprensa e, em pouco tempo, o atingido passou a ser Takeshita. Aliás, algo parecido já havia ocorrido na década de 70 com o então chanceler alemão-ocidental, Willy Brandt. E por ironia do destino, após ele ter posto em prática a sua "Ostpolitik", a ofensiva diplomática rumo ao Leste europeu, que foi a primeira iniciativa realmente efetiva de distensão na Europa, numa época caracterizada pela Guerra Fria.

Seu empenho pacifista valeu-lhe, com justiça, o Prêmio Nobel da Paz. Ele ganhou manchetes no mundo todo e foi, por algum tempo, uma das personalidades mais admiradas e respeitadas internacionalmente. Mas eis que se descobriu que o seu secretário particular, ou seja, o homem da sua inteira e irrestrita confiança, Güenther Guilhaume, era um espião da Alemanha Oriental.

Brandt, por causa disso (e guardadas as devidas proporções) teve, então, uma trajetória semelhante à do atleta canadense Ben Johnson: passou, da noite para o dia, da glória ao repúdio geral. Teve que reununciar ao posto, que nunca mais logrou conseguir.

Takeshita, por muito menos do que isso, está correndo risco semelhante. O escândalo das ações vem crescendo rapidamente e por causa dele, um importantíssimo projeto de reforma tributária está sendo bloqueado pela oposição na Dieta, o Parlamento japonês.

Quem dera que a mesma postura ética vigorasse nas incipientes democracias terceiromundistas! Mas para que se chegue a um estágio como este, é necessário um longo e penoso aprendizado. E que os governados aprendam a governar os seus governantes.

(Artigo publicado na página 12, Internacional, do Correio Popular, em 12 de outubro de 1988)

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