Pedro J. Bondaczuk
O criador do Prêmio Nobel – dividido em quatro grandes categorias, ou seja, científica (Medicina, Física e Química), econômica (Economia), política (da Paz) e literária (Literatura) – é conhecido mundialmente pelo seu principal invento: a dinamite. Mas ele inventou muitas coisas mais. Os “puristas” (ou mal informados?) torcem-lhe o nariz por esse invento. Outros não conhecem sequer esse aspecto da sua vida e de suas atividades. Na verdade, passado mais de um século da sua morte (ocorrida em 10 de dezembro de 1896), seu nome tornou-se meramente uma “grife” e poucos sabem detalhes, mesmo que mínimos, sobre quem ele de fato foi e o que fez.
Uma coisa que a imensa maioria desconhece é que a principal invenção de Alfred Nobel, a da dinamite, ocorreu praticamente por acaso. Deveu-se, na verdade, a um acidente. Claro que contou muito a ousadia e, sobretudo, a capacidade de observação do inventor. Mas, para que o leitor entenda como as coisas aconteceram, é indispensável narrar os fatos com coerência. Pois vamos a eles.
Alfred, depois de algumas viagens ao exterior, para adquirir experiência, acompanhou o pai, também inventor e poderoso industrial, a São Petersburgo, então capital da Rússia imperial, quando este resolveu instalar ali uma fábrica de nitroglicerina. Esse explosivo havia sido inventado não fazia muito pelo químico italiano Ascanio Sobrero, detentor da patente desse invento. A cidade, destaque-se, lhe era sumamente familiar. Fora lá que fizera seus estudos, junto com o irmão mais novo.
Desde cedo Alfred revelou vocação para a Química, embora tivesse grande interesse (e dizem que grande talento) pela Literatura e escrevesse muito bem (como atestam as cartas que escreveu, que foram reunidas em um livro). Entre as duas carreiras, escolheu a do pai. Certamente tinha lá suas razões para a escolha. É provável, porém, que se optasse pelas letras, seria tão bom escritor como foi notável químico. Mas... Vá se saber!
Alfred conheceu Ascanio em Paris e ficou fascinado pelo poder da nitroglicerina. Na sequência, seu pai adquiriu o direito de fabricação desse produto, em sua fábrica de São Petersburgo. Todavia, esse explosivo tinha sério inconveniente, que dificultava seu uso, quer em minas, quer na engenharia pesada, para facilitar a remoção de enormes volumes de pedras e de terra. Era (e é, pelo fato de ser líquido) sumamente instável. Basta pequena agitação no recipiente em que é contida, mesmo que não muito brusca, para explodir. O perigo era tão grande, que autoridades de vários países chegaram a cogitar da sua proibição.
O número de acidentes com mortes multiplicava-se em todos os lugares em que a nitroglicerina era utilizada. Esse fator inflacionava os salários dos que a manipulavam. Só mesmo mediante a oferta de altíssimas remunerações era possível encontrar quem se dispusesse a usar o explosivo, cujo manejo exigia rigorosa especialização. O pai de Alfred também tinha dificuldades para contratar operários para suas usinas na produção desse explosivo. Pudera! O nível de cautela exigido para evitar acidentes era absurdo. Volta e meia alguém morria, a despeito das rígidas medidas de segurança adotadas.
Alfred, aliás, era uma das vítimas da nitroglicerina. Felizmente (para ele) não foi por causa de nenhuma explosão. Certa feita, inspecionando a produção, inalou a fumaça do produto, altamente tóxica. Essa inalação, que poderia ser fatal, comprometeu, para sempre, seu aparelho digestivo e ele teve que conviver com as seqüelas do acidente por toda a vida.
Certa ocasião, o jovem inventor observou algo que considerou bastante curioso na usina de produção do pai em São Petersburgo. Notou que a nitroglicerina, derramada acidentalmente de um garrafão rachado, se infiltrava na terra, que a estabilizava e por isso não explodia. Na verdade, formava uma massa espessa, de fácil manejo, que não causava explosão, mesmo que agitada intensamente. E nem por isso perdia seu potencial explosivo. Contudo, só explodia quando quem a manipulava quisesse. Estava “inventada” a dinamite.
Entusiasmado com a descoberta, puramente acidental, Alfred Nobel patenteou, em 1867, na Inglaterra, o novo produto, que lhe deu fama mundial e multiplicou exponencialmente a fortuna da família. Ou seja, acaso e circunstância agiram a seu favor. De um garrafão rachado “nasceu” um explosivo que para o jovem químico equivaleu à descoberta de inesgotável mina de ouro. Não satisfeito com esse golpe de sorte, continuou suas pesquisas. E, dessa forma, nove anos depois, pôde patentear novo produto: a gelatina explosiva.
Esta reunia, simultaneamente, a facilidade e relativa segurança de manejo da dinamite à enorme potência explosiva da nitroglicerina. Treze anos depois, Alfred inventaria um terceiro produto da mesma linha, a “balistita”. Tratava-se de uma das primeiras variedades de pólvora sem fumaça, que seria amplamente utilizada na indústria bélica, na produção de munições. Essa invenção, todavia, acabou se constituindo no foco de longa e intensa batalha judicial com o governo inglês.
O motivo dessa demorada e desgastante querela nos tribunais prendeu-se a uma questão de interpretação da lei de registro de inventos (que, como quase toda legislação, não importa de que natureza ou país, também apresentava brechas, pela maneira vaga em que estava redigida). Nobel, ao inventar a balistita, acreditava que o produto estaria automaticamente patenteado, incluído na patente da dinamite. Não foi assim que a Justiça inglesa interpretou. Depois de dois anos de discussões nos tribunais, os juízes, afinal, deram ganho de causa à Coroa Inglesa. E a patente ficou com o governo da Inglaterra.
O inventor sueco realizou, ainda, outras pesquisas, a maioria no campo dos explosivos, posto que não todas. Pesquisou, por exemplo, placas de blindagem, a erosão em armas de fogo e até chegou a desenvolver, em caráter experimental, uma espécie de borracha sintética que, se levasse adiante e patenteasse, lhe daria muito mais dinheiro (e certamente menos dores de cabeça) do que a dinamite. Todavia... não persistiu nas pesquisas desse produto. Ele seria desenvolvido, na versão definitiva como conhecemos hoje (e patenteado) pelo norte-americano Charles Goodyear. Curiosamente, o processo de vulcanização também foi descoberto por acidente. Dessa vez, porém, o acaso e as circunstâncias agiram contra Nobel. Afinal, raramente alguém ganha todas. O beneficiado, no caso, foi o inventor norte-americano.
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