Pedro J. Bondaczuk
O cinema é o tipo de arte mais novo – aliás novíssimo se comparado à Literatura, teatro, música, pintura, escultura etc.etc.etc. – e provavelmente o mais debatido nos meios culturais, por uma série de razões. Muitos o encaram, apenas, pelo seu aspecto, digamos, recreativo, de diversão. Outros tantos vêem nele só lado industrial, o de carro-chefe de uma poderosa indústria de entretenimento. Estes não percebem o quanto de talento e de criatividade o cinema requer, para que se possam produzir bons filmes, os de qualidade superior que, a exemplo de determinados livros, se tornam anos depois clássicos desta há muito chamada de “A Sétima Arte”.
Há escritores que detestam cinema e consideram-no superficial e vazio. Entendem que pouco, ou nada, ele acrescenta à reflexão, ao debate e, consequentemente, ao progresso intelectual, cultural e estético das pessoas. Discordo, óbvio, e veementemente, dessa postura até tacanha e que reflete, no mínimo, carência de informação a propósito, para não dizer ignorância (e, claro, de capacidade de análise, com conhecimento de causa e com isenção). Compreendo, até certo ponto, essa posição de algun, caso se leve em conta, “apenas”, determinadas produções comerciais, que só visam “fazer dinheiro”, a um custo o mais baixo possível, para que o lucro seja garantido e máximo, e destinado a um público sem o menor senso crítico, despreparado e inculto, com capacidade de raciocínio igualável (se não inferior) ao de um chimpanzé e cujo senso estético orbita ao redor de zero, por falta, digamos, de “treinamento”.
Há filmes ruins? Sem dúvida, e muitos. Como, aliás, há livros que não justificam sequer o gasto com o papel em que são impressos. Como há pinturas que não passam de caricatos e horríveis borrões, sem nada de artístico. Como há músicas que “surram” os ouvidos com suas desagradáveis dissonâncias, verdadeiras agressões às pessoas de bom gosto. E vai por aí afora.
Todavia, como nas outras artes, há produções cinematográficas que ampliam o campo do nosso intelecto, nos induzem a profundas meditações sobre o mundo, a vida e tudo o que nos cerca e de beleza tão profunda, que chega a ser pungente, e mais, comovente, não raro nos levando às lágrimas, dada a emoção que despertam.
O cinema é manifestação artística que reúne todas as outras artes para se fazer concreto. É feliz síntese delas. Da literatura, por exemplo, requer o roteiro, o enredo, a história, o conteúdo que se quer comunicar. A música integra a trilha sonora e muitas composições, feitas exclusivamente para determinados filmes, são tão boas, que seguem trajetórias “solos” na sequência, dada sua inegável qualidade. Das artes plásticas, empresta a técnica para a composição de determinados cenários. Do teatro, óbvio, herdou a complicada arte da representação. Sem fotografia, por sua vez, não há filme. Até a moda (ou principalmente esta) entra na composição de qualquer produção cinematográfica, de boa ou de má qualidade, não importa.
Quem coordena tudo isso, e lhe dá coerência, é o diretor. Não se pode dizer que ele seja o autor de determinado filme, já que este é produto coletivo, que depende de atuação eficiente, no mínimo competente, de todos os profissionais convocados para a empreitada.
Embora amante fiel da literatura e comprometido, desde que me conheço por gente, com essa manifestação artístico-intelectual, gosto também de cinema, posto que não com idêntica paixão que as letras me despertam. Muito da experiência que adquiri ao longo da vida devo, sem dúvida, à Sétima Arte. É verdade que já fui mais apaixonado por ela.
Houve épocas em que não perdia um só lançamento, mas desses que minha intuição sugeria que podiam ser de alta qualidade. Às vezes, esses filmes confirmavam minhas expectativas e eu saía das salas de projeção realizado, quando não inebriado. Outras tantas... eram rotundas decepções.
Fui daqueles cinéfilos de não perder uma única exibição de películas, notadamente do que se convencionou chamar na ocasião de “filmes de arte” (todos são, até mesmo baboseiras do tipo “Sexta-feira treze”, “Rambo” e assemelhados). Nesse caso a referência era às produções (geralmente de baixo custo) que não concentravam seu foco num enredo, numa história específica com começo, meio e fim, mas em que esta era, somente, sutilmente sugerida. O fulcro eram idéias, comportamentos, tipos de personalidade etc.
Colecionei, por anos, os “Cahiers du cinema”, revista que era, notadamente nos anos 50, 60 e 70 do século XX, uma espécie de “bíblia” dos inveterados cinéfilos. Embora essa publicação ainda exista, e seja sucesso na Europa, convém abrir um parêntese para tratar dela, já que no Brasil não mais ostenta a mesma popularidade e prestígio que tinha nos chamados “anos dourados” e por isso, talvez, muito leitor a desconheça. Para não escrever besteira, não posso e não vou confiar na memória, que costuma me trair, quando mais preciso dela. Por isso, recorro à enciclopédia eletrônica Wikipédia (mais uma vez!), para dar a informação com a precisão que um texto correto e responsável sempre requer.
“Cahiers du cinema” circulou, pela primeira vez, na França, em março de 1951. Foi fundada por Jacques Doniol-Valcroze, André Bazin e Lo Duca. Surgiu quando alguns críticos e escritores de cinema resolveram expressar suas opiniões e mais, se tornar também diretores, produzindo e dirigindo os próprios filmes. Não tardou para que, entre outros colaboradores, se juntassem à equipe editorial, jovens promissores, que recém estavam incursionando pela direção de filmes, ensaiando os primeiros passos nesse sentido e que, anos depois, se consagrariam na função. Foram os casos de Claude Chabrol, François Truffaut e Jean Luc Goddard, entre tantos outros. É a propósito deste último que me proponho a escrever uma série de reflexões, que peço, humildemente, licença para partilhar com vocês, por se tratar de personalidade controvertida, polêmica, no entanto genial.. Mas... não será hoje que escreverei a respeito. Será nos próximos dias.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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