Pedro J. Bondaczuk
A sabedoria e a astúcia raramente andam de mãos dadas. O ideal é que andassem. Aliás, não raro, são condições até antagônicas. Muitos consideram-nas sinônimas. Acham que se trata da mesma coisa, apenas com nomes diferentes. Ou seja, entendem que se trate tão somente de questão de semântica. Enganam-se, todavia.
Posso, por exemplo, ser sábio e, no entanto, despido de esperteza (esta sim sinônima de astúcia). Aliás, a fama de que gozam os notórios luminares da sabedoria, os gênios, os gigantes intelectuais da espécie, é a de serem ingênuos. Nem todos, óbvio, o são. Mas o fato de serem não os tornaria e nem os torna menos sábios.
O astuto é aquele sujeito que deseja, e tenta levar vantagem em tudo. Não lhe importa os meios que venha a empregar para isso. A ele qualquer um a que recorra justifica os fins. E estes são, sempre, os de se sair bem, mesmo que para isso prejudique multidões, não raro um país inteiro.
Reitero, isso não é sabedoria. O sábio faz da astúcia, quando se vale dela, mera estratégia, mas tem em mente que se causar prejuízos ou qualquer espécie de dano a alguém, fatalmente terá que arcar com as conseqüências. Por isso, não os causa. Já o tolo não tem essa preocupação. E sua astúcia, desacompanhada de sabedoria, invariavelmente o leva a trocar os pés pelas mãos. Via de regra, quem quer levar vantagem em tudo, finda por não levar vantagem em nada. Pode até se dar bem por certo tempo. Mas no final, sempre acaba desmascarado, pagando o preço por sua “esperteza”.
O filósofo inglês Francis Bacon advertiu, ainda no século XVI: “Nada provoca mais danos num Estado do que homens astutos a quererem passar por sábios”. Suas palavras são para lá de atuais e oportunas; Soam como se fossem ditas hoje pela manhã. Quem acompanha de perto a política, ou por gosto (o que se torna cada vez mais raro), ou por necessidade profissional, e não importa em que lugar do mundo viva, identifica isso com a maior facilidade.
Detecta os danos de homens astutos, querendo se passar por sábios, que enganam os simples e ingênuos (que constituem absoluta maioria e são tão maleáveis a ponto do seu conjunto ser classificado, pejorativamente, de “massa”), e fazem estragos, não raro irreparáveis, em áreas fundamentais do Estado, como Finanças, Saúde, Educação, Justiça etc.
Lá um belo dia são pegos com a boca na botija e alguns (não todos) são punidos. Outros escapam ilesos, embora caiam na boca do povo com a pecha que merecem, a de corruptos. Porém os males que causaram ficam sem reparação e geram efeitos perversos por anos, ás vezes até por séculos, atravessando gerações.
Claro que há políticos sábios e honestos (posto que, infelizmente, se tornem cada vez mais raros), já que não se pode e não se deve generalizar. Mas... os meramente astutos, mesmo que não sejam maioria, são sumamente daninhos quando, ou se atingem seus objetivos. Nem se trata, sequer, de questão de quantidade. Afinal, uma única maçã podre, em um cesto de frutas sadias, tende a contaminar boa parte do lote, quando não sua totalidade.
Acho sumamente interessante, e inteligente, a forma como o escritor francês Anatole France – pseudônimo literário de Jacques Anatole François Thibault, ganhador do Prêmio Nobel de Literatura de 1921, pelo conjunto de sua obra – traçou a diferença entre o sábio e o tolo que se faz astuto. Escreveu: “Na noite onde todos estamos, o sábio esbarra com a parede, enquanto o ignorante fica tranqüilamente no meio do quarto”.
Ao desavisado, parece que o primeiro age de forma imprudente e tola e o segundo é que está certo. Afinal, com sua inércia, evita o risco de se ferir. Todavia, o sábio age, no sentido de encontrar uma saída e escapar da escuridão, mesmo que dê um encontrão ou outro em obstáculos, no caso, a parede. Depende, pois, apenas dele, do seu senso de orientação para encontrar uma solução. Já o ignorante, oportunista, fica na dependência do outro para se livrar da incômoda situação. Às vezes, se livra. Mas...
Se o sábio encontra a saída, o astuto aproveita-se do seu êxito, sem ter se esforçado para tal. Caso contrário... ambos podem morrer de inanição, esquecidos pelo mundo, no meio da escuridão. Com uma diferença fundamental. O primeiro (no caso, o sábio), pelo menos tentou, com chances razoáveis de conseguir. Já o segundo (o ignorante, porém astuto), pode morrer sem sequer haver tentado coisa alguma para se salvar, na dependência exclusiva de terceiros. Viram como as meras aparências enganam?
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