Friday, July 31, 2015

ONU só autoriza libertar Kuwait


Pedro J. Bondaczuk


O saudoso jornalista David Nasser afirmou, certa feita, num de seus comentários na extinta revista “O Cruzeiro” que “é difícil alguém saber se uma guerra é ou não necessária. Mas sabemos que todas as guerras são desnecessárias”.

A que está sendo travada no Golfo Pérsico, por conseqüência, também poderia (e deveria) ser evitada pela sua desnecessidade. As conseqüências desse conflito se farão sentir por muitos e muitos anos. A destruição do Iraque, por exemplo, tenderá a trazer desequilíbrios muito mais perigosos para a região do que as atuais ambições hegemônicas de Saddam Hussein. Isto, porém, é omitido.

Além disso, sob o pretexto de “estratégia de combate”, a resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas que autorizou o uso de força para libertar o Kuwait vem sendo usada de maneira distorcida pela coalizão anti-Bagdá, sem que o organismo se manifeste a respeito.

O desabafo feito por uma cidadã iraquiana, na semana passada, cujas palavras foram veiculadas para o mundo todo através da cadeia de televisão a cabo CNN, dos Estados Unidos, será uma das imagens marcantes desta guerra quando ela terminar.

Mostra que, ao contrário daquilo que ocorria tempos atrás, só mesmo os alienados, aqueles que se encontram na contramão da história, ainda acham que o recurso às armas solucione qualquer coisa. Hoje em dia fica cada vez mais difícil os propagandistas da “pax romana”, a dos cemitérios, convencerem quem quer que seja da justiça de suas teses.

Sua defesa do uso dos avanços tecnológicos financiados com os esforços de tantos para destruir cidades, extirpar vidas, impor situações, são como uma patética mensagem de um demente, um confuso discurso de algum paranóico, tão carente de lógica e sentido ela se mostra ser.

A referida cidadã iraquiana alertou para um fato que tem fugido da atenção dos “analistas”, engajados numa causa que não é a de defesa do ser humano (que é  concreto), mas de sistemas e de ideologias (que não passam de abstrações). Disse que a ONU autorizou a expulsão das tropas iraquianas do Kuwait e não a destruição de Bagdá e outras cidades do Iraque. E esta é a pura verdade.

Os políticos mostraram, no correr deste século, especialmente agora quando as notícias chegam aos lares das pessoas praticamente no instante em que os fatos ocorrem – quando se permite o trabalho abnegado dos que as reportam – sua absoluta incompetência.

A Alemanha conseguiu sua reunificação muito mais em virtude dos alemães orientais terem saído às ruas das grandes cidades para dar um basta ao comunismo, do que por decisões de estadistas do Oriente e do Ocidente. Os checos reconquistaram sua autonomia através da “Revolução de Veludo”, movida por seus cidadãos e não por seus parlamentares ou militares.

David Nasser foi extremamente oportuno quando ressaltou: “A única forma de manter o mundo de liberdade em que vivemos não será o silêncio mas o grito. Nós vamos ganhar a batalha democrática no grito”. Serão pessoas, e não sistemas, que irão implantar uma nova ordem mundial, em que as guerras serão consideradas o que de fato são: crimes contra a humanidade.

(Artigo publicado na página 15, “A Guerra no Golfo”, do Correio Popular, em 5 de fevereiro de 1991).
  

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