A crítica que vale a
pena
Pedro
J. Bondaczuk
A crítica, seja lá a o
que e a quem for – a uma pessoa, uma ideologia, uma situação qualquer, uma
pintura, um livro etc.etc.etc. – é, antes e acima de tudo, ato de coragem.
Sobretudo se quem critica o faz assiduamente. Ou seja, se a torna atividade
profissional. Quem faz essa opção tem que ter nervos e estômago fortes. Deve
estar consciente (e geralmente está) que fará muitos desafetos (para não dizer,
inconciliáveis inimigos). No fundo, no fundo, ninguém gosta de ser criticado,
mesmo que diga o contrário ou que tenha plena consciência de que o mereça (o
que, certamente, não revela a ninguém). Mais complicado ainda é criticar
artistas de qualquer arte, cuja característica principal (salvo raríssimas
exceções) é a vaidade, posto que em graus de intensidade dos mais variáveis.
Alguns são vaidosos ao extremo. Outros nem tanto. Mas todos, em certa medida, o
são.
É errado ter orgulho do
que se é ou do que se faz? Depende! Se não se incorrer em exagero, entendo que
não. Defendo a postura do indivíduo que raciocina da seguinte maneira: “Fulano,
Sicrano e Beltrano são bons, mas também sou”. Claro, se for de fato. Isso é
mais do que mera vaidade. É autoconfiança. Em contrapartida condeno quem se
ache o suprassumo da excelência, aquele que considere que ninguém pode sequer
igualá-lo, quanto mais superá-lo. Há muita gente assim e, por estranho que
pareça, quase sempre são pessoas que podem ser tudo, menos excelentes. Não são
sequer competentes. Dá para se prever no que essa vaidade exacerbada irá
resultar, não é mesmo? Mais cedo ou mais tarde, as circunstâncias acabarão
esfregando no nariz desses vaidosos extremados a verdade nua e crua. A decepção
será tão grande, que provavelmente irão recorrer ao álcool e/ou às drogas na
tentativa vã de minorar o que poderia ser evitado com um tiquinho só de
autocrítica honesta e sensata.
Não se pode colocar
todo e qualquer tipo de crítica num mesmo e único balaio. Depende, por exemplo,
de quem critica e de a o que tem restrições. E, principalmente, de como o faz.
O pressuposto mínimo que o bom senso exige é o de que o crítico tenha
conhecimento de causa do que se propõe a criticar. Se não tiver... ficará claro
que sua intenção é a de somente ofender. Correrá, todavia, o risco de cair em
ridículo (e dificilmente escapará disso), caso quem ou o que critique não seja
criticável. Outra condição é que fundamente sua avaliação. Não deve, pois,
criticar tendo por parâmetro exclusivamente o gosto pessoal, na base do “não
gostei”, ou do “gostei”. E no caso de não gostar daquilo que está criticando (e
nem toda a crítica que se preze é, ou tem que ser necessariamente negativa),
aponte as razões objetivas para desgostar ou para gostar. Que mostre as falhas
ostensivas, se for o caso de fazer restrições, até para que o autor da obra
criticada repare o erro (caso ainda for possível a reparação).
Atendidos esses
pressupostos, vem a parte mais importante de tudo: o “como” criticar. Qual a
linguagem a ser utilizada? Se você tiver restrições a fazer a uma obra (ou a
uma ideologia, uma causa, uma pessoa etc. não importa), e se for instado a
emitir opinião a propósito, profissionalmente ou não (muitas vezes nem é), não
precisa, por isso, recorrer a termos ofensivos, chulos, e muito menos a
ostensivos xingamentos. Sua crítica terá muito mais força e credibilidade se
feita de forma educada, respeitosa, ponderada e inteligente. A menos que você
queira desafiar o criticado para uma briga, o que será outra coisa e terá que
arcar com as consequências.
Alguns recorrem à
ironia, achando que não irão ofender o criticado. Depende. Este não é recurso
para “amadores”. Exige talento de quem o utiliza, pois é muito fácil, facílimo,
descambar-se para a mordacidade e o deboche, que equivalem a dizer ou a
escrever impropérios, posto que não dos “cabeludos”, já que em linguagem
supostamente “elegante”. No caso de críticos literários, pouquíssimos foram
acatados pelos escritores cujos livros criticaram. Não digo que não tenham
existido. Existiram e ainda existem. Mas... são relativamente poucos.
Eu, por exemplo,
acataria de muito bom grado (e me sentiria honrado) críticas aos meus livros ou
textos esparsos vindas de Machado de Assis, caso isso fosse possível. Claro que
não é! Embora não tenha firmado reputação nesse gênero, nosso maior escritor
foi um dos primeiros (muitos asseguram que foi o primeiro) a exercitar essa
(convenhamos, antipática) atividade. Preenchia todos os requisitos de uma
crítica literária honesta, inteligente, isenta, competente e, sobretudo,
construtiva. Ainda assim... granjeou uma grande legião de desafetos. Pena que
tenha se constituído em rara exceção.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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