Nova versão do crime organizado
Pedro J.
Bondaczuk
As declarações do presidente norte-americano Ronald
Reagan, feitas anteontem, durante um discurso na Ordem dos Advogados dos
Estados Unidos, denunciando a existência de uma nova versão do que classificou
de “Assassinato Sociedade Anônima”, atingiu, em cheio, o alvo desejado.
Certamente o objetivo era o de
alertar alguns Estados, tidos e havidos como patrocinadores do terrorismo
internacional, que Tio Sam, mais uma vez humilhado por grupelhos extremistas,
recentemente, no Líbano, não iria tolerar a repetição desses verdadeiros atos
de guerra.
A declaração, entretanto,
conforme observadores já esperavam, revelou-se inócua, contraproducente e até
provocativa. As inúmeras vítimas de seqüestros (e há sete norte-americanos em
mãos de extremistas, provavelmente no vale libanês do Bekkaa) esperam atos
concretos em seu favor e não diatribes de efeito retórico, mas sem qualquer
sentido pragmático.
Dos Estados mencionados por
Reagan, como patrocinadores do terrorismo, dois são tidos, na maior parte dos
círculos políticos, como tal: o Irã e a Líbia. Entretanto, nenhuma prova
concreta foi, ainda, reunida contra eles, que permitisse que uma autoridade do
porte do presidente dos EUA fizesse uma afirmação categórica dessa natureza, em
público.
De fato, alguns incidentes,
registrados do ano passado para cá, implicam os regimes do aiatolá Ruhollah
Khomeini e, especialmente, do controvertido coronel líbio, Muammar Khadafy. Até
hoje, por exemplo, não foram explicadas, convincentemente, as sucessivas
explosões ocorridas em 1984 no Golfo de Suez e no Mar Vermelho, atribuídas a
detonação de minas.
O governo egípcio, na
oportunidade, acusou a Líbia de ter espalhado esses artefatos (nunca
encontrados) naquela importante via de navegação. Pelo menos 14 embarcações
foram avariadas, entre as quais alguns navios soviéticos.
Um caso que repercutiu bastante,
também, foi o ocorrido em maio do ano passado, na embaixada Líbia em Londres.
Naquela ocasião, tiros foram disparados da sede diplomática em questão contra
um grupo de manifestantes anti-Khadafy. Um deles alvejou a policial britânica
Yvonne Fletcher, gerando um sério incidente internacional, que redundou no
rompimento de relações entre a Grã-Bretanha e a Líbia.
Quanto ao Irã, o país é freqüentemente
acusado de apoiar as ações de xiitas radicais no Líbano, especialmente dos
grupos “Jihad Islâmica” e “Hezbollah”. Mas círculos diplomáticos ocidentais
admitiram, recentemente, que o presidente do Parlamento iraniano, Hashemi
Rafsanjani, teve uma importante participação para o fim do cativeiro de 39
reféns norte-americanos, recentemente, em Beirute.
Admitindo o apoio desses Estados
ao terrorismo, é caso da denúncia ser feita em fóruns internacionais mais
amplos e que medidas coordenadas sejam tomadas pela comunidade mundial. Afinal,
apesar dos Estados Unidos, pela importância e projeção do país, serem os mais
atingidos pelos atos bárbaros dos extremistas, eles estão muito distantes de
serem as únicas vítimas desse flagelo dos dias atuais.
Quanto à inclusão da Nicarágua e
da Coréia do Norte na relação dos Estados terroristas, a afirmação soa a
exagero. E mais do que isso, a incontido rancor. Nenhuma prova concreta foi
ainda apresentada contra os regimes de Manágua e de Pyongyang de que, de alguma
forma, eles estejam patrocinando, ou ajudando, ou escondendo atos de
extremistas.
Há suspeitas, é verdade, que pelo
território nicaragüense passem rotas de abastecimento de armas para rebeldes
salvadorenhos. Ora, se as autoridades conhecem o caminho, não seria nada difícil fazerem pelo menos uma apreensão
do carregamento que passasse por ali, desmascarando os sandinistas.
Se nada disso foi feito, em cinco
anos, a conclusão a que se pode chegar é a da inocência nicaragüense nesse
caso. Até porque, o princípio mais comezinho do Direito preceitua que uma
pessoa, ou governo ou regime devem ser considerados inocentes, até que se prove
o contrário. E até aqui, ninguém provou a culpabilidade da Nicarágua.
(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 10
de julho de 1985).
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