Thursday, July 23, 2015

Nova versão do crime organizado


Pedro J. Bondaczuk


As declarações do presidente norte-americano Ronald Reagan, feitas anteontem, durante um discurso na Ordem dos Advogados dos Estados Unidos, denunciando a existência de uma nova versão do que classificou de “Assassinato Sociedade Anônima”, atingiu, em cheio, o alvo desejado.

Certamente o objetivo era o de alertar alguns Estados, tidos e havidos como patrocinadores do terrorismo internacional, que Tio Sam, mais uma vez humilhado por grupelhos extremistas, recentemente, no Líbano, não iria tolerar a repetição desses verdadeiros atos de guerra.

A declaração, entretanto, conforme observadores já esperavam, revelou-se inócua, contraproducente e até provocativa. As inúmeras vítimas de seqüestros (e há sete norte-americanos em mãos de extremistas, provavelmente no vale libanês do Bekkaa) esperam atos concretos em seu favor e não diatribes de efeito retórico, mas sem qualquer sentido pragmático.

Dos Estados mencionados por Reagan, como patrocinadores do terrorismo, dois são tidos, na maior parte dos círculos políticos, como tal: o Irã e a Líbia. Entretanto, nenhuma prova concreta foi, ainda, reunida contra eles, que permitisse que uma autoridade do porte do presidente dos EUA fizesse uma afirmação categórica dessa natureza, em público.

De fato, alguns incidentes, registrados do ano passado para cá, implicam os regimes do aiatolá Ruhollah Khomeini e, especialmente, do controvertido coronel líbio, Muammar Khadafy. Até hoje, por exemplo, não foram explicadas, convincentemente, as sucessivas explosões ocorridas em 1984 no Golfo de Suez e no Mar Vermelho, atribuídas a detonação de minas.

O governo egípcio, na oportunidade, acusou a Líbia de ter espalhado esses artefatos (nunca encontrados) naquela importante via de navegação. Pelo menos 14 embarcações foram avariadas, entre as quais alguns navios soviéticos.

Um caso que repercutiu bastante, também, foi o ocorrido em maio do ano passado, na embaixada Líbia em Londres. Naquela ocasião, tiros foram disparados da sede diplomática em questão contra um grupo de manifestantes anti-Khadafy. Um deles alvejou a policial britânica Yvonne Fletcher, gerando um sério incidente internacional, que redundou no rompimento de relações entre a Grã-Bretanha e a Líbia.

Quanto ao Irã, o país é freqüentemente acusado de apoiar as ações de xiitas radicais no Líbano, especialmente dos grupos “Jihad Islâmica” e “Hezbollah”. Mas círculos diplomáticos ocidentais admitiram, recentemente, que o presidente do Parlamento iraniano, Hashemi Rafsanjani, teve uma importante participação para o fim do cativeiro de 39 reféns norte-americanos, recentemente, em Beirute.

Admitindo o apoio desses Estados ao terrorismo, é caso da denúncia ser feita em fóruns internacionais mais amplos e que medidas coordenadas sejam tomadas pela comunidade mundial. Afinal, apesar dos Estados Unidos, pela importância e projeção do país, serem os mais atingidos pelos atos bárbaros dos extremistas, eles estão muito distantes de serem as únicas vítimas desse flagelo dos dias atuais.

Quanto à inclusão da Nicarágua e da Coréia do Norte na relação dos Estados terroristas, a afirmação soa a exagero. E mais do que isso, a incontido rancor. Nenhuma prova concreta foi ainda apresentada contra os regimes de Manágua e de Pyongyang de que, de alguma forma, eles estejam patrocinando, ou ajudando, ou escondendo atos de extremistas.

Há suspeitas, é verdade, que pelo território nicaragüense passem rotas de abastecimento de armas para rebeldes salvadorenhos. Ora, se as autoridades conhecem o caminho, não seria  nada difícil fazerem pelo menos uma apreensão do carregamento que passasse por ali, desmascarando os sandinistas.

Se nada disso foi feito, em cinco anos, a conclusão a que se pode chegar é a da inocência nicaragüense nesse caso. Até porque, o princípio mais comezinho do Direito preceitua que uma pessoa, ou governo ou regime devem ser considerados inocentes, até que se prove o contrário. E até aqui, ninguém provou a culpabilidade da Nicarágua.

(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 10 de julho de 1985).



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