Wednesday, July 22, 2015

Empregados do saber


Pedro J. Bondaczuk


O presente século começou com dois sistemas políticos, filosóficos, econômicos e sociais antagônicos, disputando espaço entre os povos: capitalismo e comunismo. Um, teoricamente, atribuía ao Estado o papel secundário, de mero árbitro nas relações entre as diversas classes sociais e agentes econômicos. O outro, considerando-o um verdadeiro Deus, um senhor absoluto das mentes e vontades das pessoas que pretensamente seriam niveladas por cima, mas que, literalmente, escravizou multidões.

Ambos faliram, só que, enquanto os comunistas já sabem disso – embora chineses e cubanos teimem em negar a evidência – os capitalistas ortodoxos, rotulados de “selvagens”, ainda não chegaram a essa descoberta.

O norte-americano Peter F. Drucker, lançador da chamada “Terceira Onda”, vislumbra o surgimento de algo novo na sociedade, uma espécie de redivisão de papéis, uma virtual autogestão dos vários setores que a compõem.

Em recente trabalho, o escritor constatou: “O novo pluralismo da sociedade tem a forma de organizações de objetivo único, cada uma voltada para uma tarefa social: criação de riquezas, educação, saúde ou formação de valores ou hábitos da juventude. É totalmente apolítico”.

Mais adiante, Drucker explica onde está a diferença dessas entidades com o sistema tradicional. Escreve: “As novas instituições não são baseadas no poder e sim na ‘função’. Entretanto, embora não políticas – aliás, apolíticas – cada uma tem que possuir considerável grau de poder sobre as pessoas – poder de contratar, de colocar, de transferir, de demitir, poder de atribuir tarefas, de estabelecer padrões de funcionamento, de manter a disciplina e de fiscalizar as horas de serviço. Cada vez mais essas instituições proporcionam às pessoas nos países desenvolvidos meios de subsistência, profissões e oportunidade para contribuírem, serem bem-sucedidas e produtivas”.

Este novo sistema, tão recente que os sociólogos e cientistas políticos sequer tiveram tempo, ainda, de rotular, já finca raízes, inclusive em países mais organizados do Terceiro Mundo, embora enfrentando as dificuldades naturais neles existentes, como suas oligarquias e elites aferradas ao poder.

Drucker, no texto mencionado, avança mais detalhes sobre esse fenômeno e classifica essa sociedade emergente de “empregados do saber”. E detalha: “Não são nem explorados, nem exploradores, que individualmente não são capitalistas, mas que, coletivamente, possuem os meios de produção através de seus fundos de pensão para a compra de títulos, e suas poupanças; que são subordinadas, mas também muitas vezes patrões. São pessoas ao mesmo tempo independentes e dependentes. Têm mobilidade, mas também precisam de acesso a alguma organização – como consultores senão como empregados – para demonstrar qualquer eficiência”.

A porta de acesso a esse novo sistema, evidentemente, é a educação, a formação profissional, a informação farta e precisa, que os povos do Terceiro Mundo, evidentemente, não dispõem. Daí, mais uma vez, por omissão das suas elites – ou talvez proposital, quem sabe – parte considerável da humanidade está em vias de permanecer à margem do progresso, do bem-estar e da própria civilização”.      

(Artigo publicado na página 3, Opinião, do Correio Popular, em 28 de junho de 1992)


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