Wednesday, July 15, 2015

Dólar forte


Pedro J. Bondaczuk


A simples indicação dada pelo presidente norte-americano Ronald Reagan --- quando da sua primeira aparição em rede nacional de TV após a posse na Casa Branca --- de que possui a chave para a crise econômica que seu país atravessa, provocou no mundo todo uma nova "corrida ao dólar". De uma hora para outra a moeda dos EUA conheceu uma brusca e surpreendente revalorização. Na Itália, por exemplo, bateu todos os recordes em relação à lira. Na Alemanha Ocidental, voltou a ser cotada, diante do marco, no mesmo nível de três anos atrás. Até a libra esterlina --- em franca recuperação face às recentes medidas econômicas adotadas pela primeira-ministra Margaret Thatcher, e ao sucesso da Inglaterra na exportação petrolífera do Mar do Norte --- quedou vencida diante da espetacular ascensão do dólar.

O novo entusiasmo dos especuladores para com a moeda norte-americana colocou em xeque o outrora orgulhoso marco alemão. E forçou o Banco Central da Alemanha Ocidental a uma nova operação de emergência. Levou-o a descarregar milhões de dólares de suas imensas reservas monetárias na praça, para controlar o seu irresistível fluxo ascendente. Os cambistas europeus, que em julho do ano passado haviam experimentado um prejuízo com a moeda dos EUA em relação a 16 outras, da ordem de 20%, não apenas recuperaram seus investimentos em fevereiro de 1981, como ainda, de quebra, lucraram 5,5%. E acreditam que vão ganhar muito mais.

No meio do ano passado, por seu turno, o ouro havia alcançado a astronômica cifra de US$ 698 a onça. E atingiu o pique no mês de setembro, com o início da guerra entre o Iraque e o Irã no Golfo Pérsico. O metal, em decorrência daquele conflito, alcançou, na oportunidade, uma cotação superior à casa dos US$ 710 a onça.

Os europeus temiam que os combates no Oriente Próximo poderiam envolver em confronto direto as superpotências. O clima de tensão mundial era indisfarçável. O Irã ameaçava bloquear o estratégico Estreito de  Ormuz, na entrada do Golfo Pérsico. Aquela passagem marítima, como é do conhecimento geral, se constitui na rota obrigatória dos superpetroleiros ocidentais que demandam da Arábia Saudita, Kuwait e Emirados Árabes Unidos. Por isso é considerada uma artéria petrolífera vital para todo o Ocidente. Temia-se por uma invasão norte-americana ao Irã, já que além da ameaça iraniana de bloqueio da passagem oceânica, estava em pleno andamento a prolongada e desgastante crise dos reféns. Como conseqüência, era aguardada, também, uma represália soviética, pois todos acreditavam --- e acreditam --- que Moscou não se dispõe a permitir a presença de tropas dos EUA em seus dois mil quilômetros de fronteiras com a rebelde República Islâmica de Khomeini.

Mas o bom senso e o pragmatismo econômico de Teerã e Bagdá superaram os seus ódios e paixões ideológicas. E nada disso aconteceu, restringindo-se a guerra a simples ações de desgaste mútuo. O ouro então acumulado --- ele que é o lastro para todas as moedas e o meio de pagamento mais seguro em períodos de conflito armado --- começou novamente a ser vendido, especialmente pela Europa que o havia estocado.

O dólar voltou outra vez a se constituir no dinheiro quase oficial do chamado "mundo livre". Passou a atrair novamente os europeus, que começaram a acumulá-lo a todo o vapor para saldar os seus compromissos externos, especialmente com as maciças importações de petróleo feitas no início da guerra do Golfo Pérsico.

Quando Ronald Reagan assumiu a presidência dos EUA, em 20 de janeiro passado, o precioso metal estava em franca queda. O mercado de Londres registrava na oportunidade uma imensa oferta contra baixa e decrescente procura. Pela lei natural que regula automaticamente as compras e vendas, a cotação do ouro só tinha mesmo é que cair. Seu preço, então, já estava reduzido a irrisórios US$ 500 a onça.

Desde quando assumiu a Casa Branca, o novo presidente norte-americano --- com muita habilidade, por sinal --- vem aproveitando o seu extraordinário poder de comunicação para transmitir confiança ao mundo capitalista. Acima de qualquer providência de caráter prático --- que, diga-se de passagem, não foi tomada --- incutiu uma elevada dose de otimismo nos financistas internacionais. A própria admissão de que os EUA estão "à beira de uma catástrofe econômica sem precedentes desde a Grande Depressão" da década de 1930, serviu mais como um alerta estimulante do que como motivo de pânico ao mundo financeiro.

A crença de que ele possuía uma "solução mágica", escondida na manga, para os problemas econômicos do Ocidente, tornou-se generalizada nas casas de câmbio européias. Um especulador de Paris chegou a dizer --- conforme assinalou a revista "Newsweek" de 16 de fevereiro passado --- o seguinte a esse respeito: " Há uma sensação geral de que alguma coisa nova está acontecendo. De que Reagan está sinalizando o início de uma nova era".

O incrível fortalecimento do dólar, motivado exclusivamente por fatores externosà economia norte-americana, é, por si só, o maior voto mundial de confiança --- principalmente da Europa --- à nova política econômica preconizada pela Casa Branca. Mas os homens de negócio não estão, certamente, se guiando apenas pelo instinto. O seu otimismo quanto a um revigoramento da economia de todo o Ocidente está sendo muito bem estimulado de Washington. Ainda recentemente o diretor da Reserva Federal dos EUA, Paul Volcker, um dos estrategistas do novo plano de Reagan, depondo na Comissão de Finanças do Congresso, garantiu uma sensível queda nas taxas inflacionárias norte-americanas ainda até o final do corrente ano de 1981. E afirmou que o sucesso será total no domínio do "monstro" da inflação, se as medidas de contenção dos gastos públicos, exigidas pelo presidente, forem rigorosamente postas em execução.

É muito cedo para prever o sucesso ou o fracasso das providências saneadoras de Ronald Reagan. Entretanto, se tudo depender do carisma do novo governante para dar certo, o êxito certamente deverá ser espetacular. A prova inequívoca disso é a atual recuperação do dólar, surpreendente e alentadora para aqueles que dependem economicamente da superpotência do Ocidente.

(Artigo publicado na página 4 do jornal "Fatos & Negócios! em 15 de março de 1981)


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