Wednesday, July 01, 2015

Decisão equivocada de Kohl


Pedro J. Bondaczuk


O chanceler alemão-ocidental Helmut Kohl, muito a contragosto, anunciou, ontem, no Parlamento do seu país, aquilo que já havia deixado filtrar para a imprensa internacional na semana passada. Ou seja, que Bonn aceita a retirada de mísseis de curto e médio alcance da Europa, à exceção de 72 Pershings 1-A, para pequenas distâncias.

O pronunciamento foi bastante festejado pelo presidente norte-americano, Ronald Reagan, que está em Veneza, à espera do início da reunião de cúpula dos sete países mais industrializados do mundo ocidental, e por outros círculos políticos e principalmente militares ligados ao Ocidente.

Entretanto, a decisão de Kohl, ao contrário de resolver, vai, na verdade, complicar a chamada “Opção Duplo Zero”, que prevê a eliminação de todos os mísseis das superpotências (exceto os intercontinentais) do solo europeu.

O Cremlin já havia anunciado, através de seus negociadores em Genebra, que a proposta do líder Mikhail Gorbachev, feita em março passado ao secretário de Estado norte-americano George Shultz, quando da ida deste a Moscou, que não admitia exclusões. Portanto, o anúncio de ontem, do chanceler alemão-ocidental, se não foi de todo decepcionante, também não foi caso de ser muito festejado.

Dessa maneira, ao que tudo indica, um acordo de desarmamento nuclear, entre a União Soviética e os Estados Unidos, se vier a ser obtido, ficará restrito, somente, a mísseis de médio alcance. Ou seja, àquilo que ficou mais ou menos estabelecido entre Washington e Moscou após a reunião de cúpula informal entre Ronald Reagan e Mikhail Gorbachev, levada a efeito em 10 e 11 de outubro de 1986, em Reykjavik.

É verdade que há balísticos de pequena distância em menor número na Europa do que os de alcance intermediário. O estranho, em tudo isso, é que nesse tipo de arma, o Ocidente leva nítida desvantagem em relação ao Leste Europeu, na proporção de cinco por um.

O chanceler alemão-ocidental, ao comentar sua exigência, mencionou a superioridade soviética em termos de forças convencionais na Europa. Ora, considerando que a Organização do Tratado do Atlântico Norte está perdendo nesse quesito, nos parece um duplo equívoco da Alemanha Ocidental de exigir a permanência dos 72 Pershings. Dessa forma, o poderio do Pacto de Varsóvia não ficará diminuído. Ao contrário, vai ficar ainda maior.

O bloco soviético continuará detendo a hegemonia em armas não nucleares e terá um arsenal de mísseis de pequeno alcance capaz de assustar a maioria dos países europeus. Não seria, pois, mais sensato impor ao Cremlin outro tipo de condição? Ao invés de querer um enganador guarda-chuva atômico, que os alemães-ocidentais têm consciência que de nada lhes adiantará em caso de uma guerra nuclear, Kohl agiria com maior prudência se negociasse a equiparação de armas e de tropas entre as duas alianças militares antagônicas.
Aliás, já que se está abordando esse assunto, envolvendo a segurança continental, o ideal, mesmo, seria acabar de vez com os dois pactos, que mal podem dissimular seu ranço de odiosos produtos dos penosos tempos de guerra fria.

O líder soviético, Mikhail Gorbachev, insinuou, em várias ocasiões, que está disposto a dissolver a aliança militar comunista, se o Ocidente fizesse o mesmo em relação à Otan. No complexo mundo atual, onde tudo se interrelaciona, se interpenetra, quando foguetes russos estão na iminência de colocar satélites de empresas norte-americanas em órbita, em que o comércio entre as duas superpotências fica a cada dia mais intenso, esse tipo de organização se mostra um grande, cro e inútil anacronismo.

A dissolução, tanto do Pacto de Varsóvia, quanto da Otan, resolveria uma série de problemas, desde econômicos até os atinentes a desarmamento nuclear, além de ter o efeito psicológico de desarmar, também, os espíritos.

Quem sabe, na evolução dos acontecimentos, isso não venha ainda a acontecer?! Por enquanto, a decisão alemã-ocidental só conseguiu introduzir uma variável complicadora numa questão que estava próxima de ser resolvida.

(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 5 de junho de 1987).

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