Decisão equivocada de Kohl
Pedro J.
Bondaczuk
O chanceler alemão-ocidental Helmut Kohl, muito a
contragosto, anunciou, ontem, no Parlamento do seu país, aquilo que já havia
deixado filtrar para a imprensa internacional na semana passada. Ou seja, que Bonn
aceita a retirada de mísseis de curto e médio alcance da Europa, à exceção de
72 Pershings 1-A, para pequenas distâncias.
O pronunciamento foi bastante
festejado pelo presidente norte-americano, Ronald Reagan, que está em Veneza, à
espera do início da reunião de cúpula dos sete países mais industrializados do
mundo ocidental, e por outros círculos políticos e principalmente militares
ligados ao Ocidente.
Entretanto, a decisão de Kohl, ao
contrário de resolver, vai, na verdade, complicar a chamada “Opção Duplo Zero”,
que prevê a eliminação de todos os mísseis das superpotências (exceto os
intercontinentais) do solo europeu.
O Cremlin já havia anunciado,
através de seus negociadores em Genebra, que a proposta do líder Mikhail
Gorbachev, feita em março passado ao secretário de Estado norte-americano
George Shultz, quando da ida deste a Moscou, que não admitia exclusões.
Portanto, o anúncio de ontem, do chanceler alemão-ocidental, se não foi de todo
decepcionante, também não foi caso de ser muito festejado.
Dessa maneira, ao que tudo
indica, um acordo de desarmamento nuclear, entre a União Soviética e os Estados
Unidos, se vier a ser obtido, ficará restrito, somente, a mísseis de médio
alcance. Ou seja, àquilo que ficou mais ou menos estabelecido entre Washington
e Moscou após a reunião de cúpula informal entre Ronald Reagan e Mikhail
Gorbachev, levada a efeito em 10 e 11 de outubro de 1986, em Reykjavik.
É verdade que há balísticos de
pequena distância em menor número na Europa do que os de alcance intermediário.
O estranho, em tudo isso, é que nesse tipo de arma, o Ocidente leva nítida
desvantagem em relação ao Leste Europeu, na proporção de cinco por um.
O chanceler alemão-ocidental, ao
comentar sua exigência, mencionou a superioridade soviética em termos de forças
convencionais na Europa. Ora, considerando que a Organização do Tratado do
Atlântico Norte está perdendo nesse quesito, nos parece um duplo equívoco da
Alemanha Ocidental de exigir a permanência dos 72 Pershings. Dessa forma, o
poderio do Pacto de Varsóvia não ficará diminuído. Ao contrário, vai ficar
ainda maior.
O bloco soviético continuará
detendo a hegemonia em armas não nucleares e terá um arsenal de mísseis de
pequeno alcance capaz de assustar a maioria dos países europeus. Não seria,
pois, mais sensato impor ao Cremlin outro tipo de condição? Ao invés de querer
um enganador guarda-chuva atômico, que os alemães-ocidentais têm consciência
que de nada lhes adiantará em caso de uma guerra nuclear, Kohl agiria com maior
prudência se negociasse a equiparação de armas e de tropas entre as duas
alianças militares antagônicas.
Aliás, já que se está abordando
esse assunto, envolvendo a segurança continental, o ideal, mesmo, seria acabar
de vez com os dois pactos, que mal podem dissimular seu ranço de odiosos
produtos dos penosos tempos de guerra fria.
O líder soviético, Mikhail
Gorbachev, insinuou, em várias ocasiões, que está disposto a dissolver a
aliança militar comunista, se o Ocidente fizesse o mesmo em relação à Otan. No
complexo mundo atual, onde tudo se interrelaciona, se interpenetra, quando
foguetes russos estão na iminência de colocar satélites de empresas
norte-americanas em órbita, em que o comércio entre as duas superpotências fica
a cada dia mais intenso, esse tipo de organização se mostra um grande, cro e
inútil anacronismo.
A dissolução, tanto do Pacto de
Varsóvia, quanto da Otan, resolveria uma série de problemas, desde econômicos
até os atinentes a desarmamento nuclear, além de ter o efeito psicológico de
desarmar, também, os espíritos.
Quem sabe, na evolução dos
acontecimentos, isso não venha ainda a acontecer?! Por enquanto, a decisão
alemã-ocidental só conseguiu introduzir uma variável complicadora numa questão
que estava próxima de ser resolvida.
(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 5
de junho de 1987).
No comments:
Post a Comment