Thursday, July 02, 2015

Machado de Assis e o jornalismo


Pedro J. Bondaczuk

A vida e, principalmente, a obra de Machado de Assis são tão ricas e fascinantes que comportam toda uma biblioteca, de grossos e alentados volumes para relatá-las e, ainda assim... muitas coisas, certamente, restarão omitidas, sem serem abordadas. Sempre sobrará um episódio específico, um ângulo determinado, um texto esquecido para quem detectar essas omissões abordar caso queira. O prolífico escritor foi uma das personalidades públicas brasileiras sobre a qual mais se escreveu (e se continua escrevendo). Só dos títulos que consegui levantar, de autores das mais diversas tendências e estilos, pude apurar uma bibliografia de mais de três centenas de livros, cada qual abordando algum aspecto curioso ou essencial de sua vida e de sua obra. E é como ele mesmo observou, no conto “As primas de Sapucaia”: “Palavra puxa palavra, uma idéia traz outra, e assim se faz um livro, um governo, uma revolução; alguns dizem mesmo que é assim que a natureza compõe suas espécies”. No seu caso, assim se fez e assim se faz uma biblioteca específica sobre Machado de Assis.

Exagero? Longe disso. Vejam o meu caso. Fui pautado por leitores a escrever sobre ele. Cogitava redigir cinco, no máximo (exagerando muito) dez textos a propósito. E o que ocorreu? Já escrevi VINTE E OITO (este é o vigésimo nono) comentários e não abordei sequer dez por cento, se tanto, do mínimo que se deva abordar para fazer uma resenha minimamente decente do que foi, do que fez, do que pensou e, sobretudo, para lhe fazer justiça. Quando penso interromper a série a passar para outro assunto, eis que vem à mente outro ângulo, e mais outro, e mais outro, que deva, necessariamente, ser abordado. E lá vou eu debruçar-me sobre as fontes para formar opinião, já que estes “rabiscos” não são nem biografia, nem crítica literária, mas talvez, forçando a barra, possam ser classificados como ensaios, se tanto.

Uma das questões que os leitores mais me cobram refere-se à forma como Machado de Assis encarava a política e, por extensão, os políticos. Recorde-se que, antes mesmo de publicar qualquer texto literário (em prosa, já que publicara um ou outro poema, sobretudo na “A Marmota Fluminense”)  ele já escrevia candentes artigos para jornais abordando o panorama institucional da época. Considerava-se (e era considerado, pois de fato era) jornalista. Quando Machado iniciara-se nas lides jornalísticas, com vinte e um anos (ou em torno disso, mas tomemos essa idade por base), em 1860, o jornalismo brasileiro mal “engatinhava. O primeiro jornal genuinamente nacional, “A Gazeta do Rio de Janeiro”, começara a circular em 10 de setembro de 1808, seis meses após a chegada da família real portuguesa à cidade, que ocorreu em março daquele ano.

Quando Machado de Assis engajou-se ao jornalismo, portanto, essa atividade tinha cinqüenta e dois anos de existência no País. Ou seja, um quase nada, em termos históricos. Pode-se dizer, portanto, que de certa forma ele foi um dos pioneiros do jornalismo brasileiro. E o que ele pensava desse veículo tão novo para a realidade nacional? Machado de Assis escreveu a propósito: “O jornal é a verdadeira forma de república do pensamento. É a locomotiva intelectual em viagem para mundos desconhecidos; é a literatura comum, universal, democrática, reproduzida todos os dias, levando em si a frescura das idéias e o jogo de convicções”. E não é?!!! Por também pensar dessa forma, embora sem a mesma competência para expressá-la, é que fiz do jornalismo mais do que mera profissão, simples meio de assegurar meu sustento e o de minha família. Fiz dele missão de vida.

Aos 21 anos, Machado de Assis foi convidado por ninguém menos do que Quintino Bocaiuva para atuar no “Diário do Rio de Janeiro”, onde trabalhou por um período de sete anos, de 1860 a 1867. Supervisionado pelo mito do jornalismo de então, Saldanha Marinha, atuou intensamente na empresa. Fez um pouco de tudo. Foi repórter, articulista e até revisor de textos. Nessa época, o jovem jornalista escrevia pequenas peças e panfletos para o teatro. Quintino Bocaiuva apreciava esses textos, embora os considerasse interessantes apenas para leitura, e não para encenação. Mas o jovem ganhava destaque como articulista político. Seus artigos eram tão vibrantes e idealistas, que ele chegou a ter o nome anunciado como candidato a deputado pelo Partido Liberal do Império.

Aquele foi um momento de decisão para Machado de Assis. Cabia-lhe definir se queria seguir carreira política ou não. Poderia ter sido excelente parlamentar? Quem sabe? Optou, todavia, pela retirada da candidatura, sob o pretexto de que pretendia comprometer toda sua vida exclusivamente com as letras (e não somente como escritor, mas também como jornalista). Literatura e política, no entanto, não eram (e nem são), a rigor, atividades incompatíveis. Afinal, seu grande amigo José de Alencar exercia-as simultaneamente, sem que uma comprometesse a outra. Era senador, sem deixar de ser o romancista que inscreveu seu nome na história da Literatura Brasileira, sobretudo pela temática indigenista que adotou e que desenvolveu com maestria. Aliás, foi com ele que Machado aperfeiçoou seu inglês.         


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