Sunday, April 21, 2013


Posição iraniana é ambígua


 Pedro J. Bondaczuk

 A evasão de cerca de 100 aviões iraquianos – os melhores que esse país possui em sua Força Aérea – rumo ao território do Irã, além de causar naturalmente grande surpresa no mundo todo, vem provocando indagações e especulações. Afinal, a República Islâmica controlada pelos aiatolás assegurou a sua neutralidade na guerra do Golfo Pérsico e todos acreditaram nessa garantia, tendo em conta que o país travou um sangrento conflito de  oito anos com o Iraque.

O presidente Saddam Hussein, na entrevista exclusiva que concedeu ao repórter Peter Arnett, da rede de televisão norte-americana CNN na segunda-feira, num de seus “bunkers” secretos nos arredores de Bagdá, insinuou que o pouso de suas aeronaves em solo iraniano foi uma ajuda providencial do seu inimigo de ontem.

O líder iraquiano chegou a insinuar que os ressentimentos deixados pela guerra não extinguiram o espírito de solidariedade entre duas comunidades muçulmanas. Fica, porém, a pergunta no ar: o Irã está ou não neutro nesta guerra? Caso os aviões tenham pousado em seu território sem a autorização das autoridades iranianas e estas cumpram a promessa de sua retenção até o final do conflito, nem assim o episódio ficará de todo explicado.

Por que os caças e bombardeiros não pousaram, por exemplo, na Jordânia? O jornal “Times”, de Londres, que circulou ontem, levantou a tese de fuga de pilotos com suas respectivas aeronaves. Disse, baseado em fontes do serviço secreto inglês, que o fato pode ter ligação com uma suposta conspiração fracassada para assassinar Saddam Hussein.

Se a versão tem fundamento, por que somente os aviões mais modernos e caros foram buscar refúgio no Irã? O “The New York Times”, por sua vez, expressa desconfiança quanto à propalada neutralidade da República Islâmica. Aliás, esta nem seria a primeira vez na história em que dois adversários declarados se uniriam para combater o inimigo comum.

Recorde-se que durante a Segunda Guerra Mundial, a União Soviética, ao menos ideologicamente, era ferrenha antagonista dos Estados Unidos. Todavia, as circunstâncias do conflito fizeram com que as duas superpotências atuais se aliassem para pôr fim ao perigo que Adolf Hitler representava para a ordem mundial que se pretendia estabelecer.

É verdade que os dois gigantes militares não haviam guerreado entre si. Mas a história registra muitas outras alianças que antes de serem feitas eram consideradas impossíveis e que acabaram ocorrendo. Portanto, não será nenhuma surpresa se iranianos e iraquianos, a despeito de ressentimentos mútuos, dependendo do curso da guerra, vierem a lutar lado a lado na mesma trincheira, contra as forças multinacionais.

(Artigo publicado na página 14, “A Guerra no Golfo”, do Correio Popular, em 31 de janeiro de 1991).

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