Tuesday, April 16, 2013


Estrela de Hart brilha mais do que nunca


Pedro J. Bondaczuk


O presidente norte-americano Ronald Reagan, após muito tempo sem enfrentar a imprensa do seu país, concedeu, anteontem, na Casa Branca, uma concorrida entrevista coletiva, de pouco mais de meia hora de duração. Em substância, ao responder as perguntas de argutos jornalistas, não disse praticamente nada que já não tivesse dito anteriormente acerca do escândalo “Irangate”.

Repetiu que a operação de venda de armas para o Irã teve como objetivo inicial uma reaproximação com as alas moderadas dessa estratégica República do Golfo Pérsico. Admitiu que no curso das transações, o negócio descambou para a mera troca de armas pelos reféns. Assegurou desconhecer que os lucros obtidos junto aos iranianos estavam sendo desviados para os “contras”. E disse que se pudesse voltar tudo atrás, não repetiria essa forma de agir.

Até aí, tudo bem. Isto ele já havia dito, desdito, depois dito novamente, nos vários pronunciamentos que fez pela televisão, após o escândalo ter vindo a furo. Mas ao responder a uma pergunta, aparentemente inocente, Reagan introduziu um fato novo na questão, que se os democratas souberem explorar, poderá render polpudos dividendos ao partido em termos de eleições presidenciais do próximo ano.

O presidente, proposital ou inadvertidamente (esta hipótese é a mais viável), praticamente “bombardeou” a candidatura de seu vice, George Bush, à sua sucessão. Garantiu que seu companheiro de governo, e eventual substituto, “não fez qualquer objeção à venda de armas para o Irã”.

Isto está em completa contradição com o que o político texano vem reiteradamente asseverando, procurando se eximir de sua responsabilidade no escândalo. Dito pelo próprio presidente que ele participou, pelo menos por omissão, dessa estranha e controvertida transação, o que pode ter ficado implícito para a opinião pública?

Algo bastante comprometedor para as suas pretensões de chegar à Casa Branca. Ficou subentendido que Bush ou foi desleal com o seu chefe, ao permitir que fizesse algo que ele, na qualidade de ex-diretor da CIA achava errado. Ou, o que é pior, mentiu o tempo todo, para manter intacta apenas a sua imagem, às custas do desgaste da do presidente.

Anteontem não foi mesmo o melhor dos dias para George Bush. Enquanto Reagan deixava escapar essa inconfidência, acerca do seu comportamento, o corretor de armas saudita, Adnan Kashogui, veio a público para dizer que o vice-presidente lhe havia pedido, em 1985, quando pesava uma proibição do Congresso sobre a ajuda aos “contras”, que desse uma contribuição pessoal aos rebeldes anti-sandinistas.

Isto demonstra que o político texano está mais envolvido no caso do que quer admitir. Quem deve estar vibrando com os dois episódios é o ex-senador pelo Colorado, Gary Hart, que esteve até outro dia entre nós e visitou, inclusive, o novo governador de São Paulo, Orestes Quércia, já com ares de futuro presidente do seu país.

A estrela desse político democrata, preterido, surpreendentemente, nas primárias de 1984 pelo inexpressivo ex-vice-presidente de Carter, Walter Mondale, agora está brilhando mais do que nunca. No mês passado, o seu potencialmente maior rival dentro do próprio partido, o governador de Nova York, Mário Cuomo, desistiu, com enorme antecedência, de postular uma candidatura.

Com isso, o seu caminho ficou mais livre do que nunca. Agora, o outro lado lhe oferece, de bandeja, a cabeça do maior nome que os republicanos dispõem para o enfrentar. É verdade que as alamedas e vielas da política apresentam inúmeros meandros e obstáculos insuspeitados. Mas se as coisas continuarem como estão, dificilmente Hart terá qualquer adversário que possa ameaçar, sequer de longe, a sua trajetória rumo à Casa Branca.

(Artigo publicado na página 9, Internacional, do Correio Popular, em 21 de março de 1987).

  Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk 

No comments: