Thursday, June 07, 2012

Vitória de Rama-III

Pedro J. Bondaczuk



(Poema inspirado na epopéia indiana, “A Ramaiana”)



Continuação

(...) Vê, de karnikeras iluminada

esta floresta, de folhas douradas,
cintilantes, luminosa alvorada,
e as silvas, bhallatakas envergadas
ao peso dos seus frutos saborosos
com polpas agridoces, sumarentas,
repastos especiais e suntuosos
de deuses audazes, deusas ciumentas?”
Do exílio, Sita e Rama esqueceram,
não sentiam rancor e nem saudade,
nos bosques se embrenharam, se perderam:
viviam em plena felicidade.

Contudo, Rama teve, certo dia,
estranha, irresistível tentação
a qual, se ele caísse, poderia
trazer-lhe sobre-humana danação.
Na floresta, em que se refugiara,
certa feita ouviu sons de homens marchando
e, subitamente, o herói se depara
com bem armado e poderoso bando.
Voltou a sentir a inquietação de antes,
assim que colocou o ouvido à terra.
Vinham marchando dez mil elefantes
e mais de sessenta mil cães de guerra.

Cem mil cavaleiros ajaezados
penetravam, céleres, nessa mata,
eram, garbosamente, comandados,
pelo próprio irmão de Rama, Barata.
Ao reconhece-lo, ficou feliz,
entendeu que a ocasião era boa,
pois não vislumbrou intenções hostis:
“Ele vem para entregar-me a coroa”.
Daçarata, rei de nove mil anos,
descansara ainda recentemente
e Barata, pra desfazer o engano
de estar reinando ilegitimamente,

porque era leal e justiceiro,
quis entregar, ao legítimo dono,
o cetro, mas a coroa primeiro
e empossar Rama no de Aiodia trono.
Nosso herói ficou muito comovido
com esta nobre, altruística ação
do jovem príncipe desprendido,
leal amigo e amantíssimo irmão.
A princípio pareceu vacilar,
tomado por uma intensa emoção,
mas consultou Sita, com um olhar,
e, por fim, tomou sua decisão.

“A vontade do meu pai é sagrada.
por isso, é você que deve reinar”,
disse Rama, com a voz embargada,
sem poder a emoção disfarçar.
“Se a sua nobre mãe foi ambiciosa,
só o foi pelo amor que lhe dedica,
fique atento, não a deixe ansiosa,
e reine, com justiça, na pátria rica.
Retorne para o nosso reino belo,
para que os vassalos não se amotinem,
e concretize o maternal anelo,
fazendo com que os seus sempre o estimem”.

Barata recusou-se a conservar
a coroa, o governo da cidade
e fez-se asceta, para meditar,
para buscar a eterna verdade.
E assim Aiodia ficou sem senhor,
pois o rei, pelo povo desejado,
evitou usufruir do esplendor
do poder, pois sentia-se exilado.
Ao pé do trono as sandálias reais
Passaram a simbolizar nobreza
até que, deste exílio, triunfais,
retornassem o príncipe e a princesa.

Dias passavam, sem dores, sem prantos,
sem que qualquer tragédia os alcançasse,
a existência era plena de encantos
sem que ciúme e inveja a empanassem.
Parecia-lhes que em seus corações
nunca abrigariam canto guerreiro
e nem o travo das desilusões
acenderia, do ódio, o braseiro.
A paz total, plenitude do riso,
a suave ternura, jamais perdida,
e todas alegrias do paraíso
de Indra, lhes animavam a vida.

Da profunda beleza que os rodeava,
da que emanava de Rama e de Sita,
do seu amor, que apenas aumentava,
evolava uma volúpia infinita.
Porém, na floresta encantada, um dia,
onde ninguém, ainda, penetrara,
do casal, destruiu a alegria,
o gigante Ravana, rei Rakshara.
Raksharas desmanchavam matrimônios,
porque se alimentavam de desgostos,
pois eram gênios maus, eram demônios,
monstros horrendos que tinham dez rostos.

Ravana, à vista da mui bela Sita,
pequena e frágil, como uma kokila,
fica doido de paixão e se excita:
maquina raptá-la e possuí-la.
Sabedor da invencível coragem
de Rama, de braço forte e viril,
que era imune ao vício da beberagem,
engendra armar-lhe um hábil ardil.
Consegue afastar Rama e Lakshmana,
que levaram todas armas consigo,
e à princesa apresentou-se Ravana
habilmente disfarçado em mendigo.

Sem conseguir dominar as paixões,
Tartamudeia palavras sem nexo,
E simula recitar orações.
Tencionava, porém, possuir seu sexo.
“Ó mulher, de sorriso encantador,
que desperta eróticas fantasias”,
balbucia o pérfido tentador,
“você nasceu pra todas alegrias
da carne, para prazeres sem fim,
para um sexo viril e entumescido,
como se contenta viver assim,
por que razão você tem consentido

(...) Continua

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1 comment:

Edir Araujo said...

Confesso que desconhecia esta fabulosa epopéia indiana, A Ramaiana. Tão magnífica quanto a Ilíada ou Os Lusíadas. Estou acompanhando. Desde já parabéns pelo conjunto e beleza do poema. Forte Abraço !