Vitória de Rama-II
Pedro J. Bondaczuk
(Poema inspirado na epopéia indiana, “A Ramaiana”)
Continuação...
(...) Rama, inclinando-se, consola o pai,
com respeito, e ternura sem igual,
sem manifestar revolta, ou ai,
sem expressar a dor emocional.
Consola sua mãe, que fora ofendida,
lesada por uma bela raposa.
“Neste seu amor por mim, ó rainha,
- amor igual ninguém teve ou tem –,
não se revolte com a sorte minha,
nem com a vontade do rei, também”.
Aos amigos, ordenou lealdade
e compreensão para a injusta sentença
do pai, debilitado pela idade,
e respeito à sua augusta presença.
Solicitou que se cumprisse a lei
do irmão, do sucessor de Daçarata,
que todos acatassem, como rei,
o imberbe, inexperiente Barata.
E, para completar sua desdita,
sentindo na garganta grande nó,
Rama despediu-se da bela Sita,
porquanto pretendia partir só.
Explicou: “Mil perigos vou correr
nas florestas onde vou habitar.
Não suportaria vê-la sofrer,
se desesperar ou então chorar
por causa das infaustas contingências,
quando me vir faminto e macerado,
consumido por minhas penitências,
sentindo-me ofendido e humilhado.
Não quero as suas cores afetadas
pelo vento e crestadas pelo sol,
seu corpo exausto pelas jornadas
e seus olhos, que são meu arrebol,
tumefactos pelas noites de insônia.
Testemunhar, frustrado, seus tormentos,
ver os seus trajos rotos, qual campônia,
sem os seus principescos paramentos,
hão de multiplicar a minha dor,
esposa adorada, nobre princesa,
encherão a minha alma de horror,
só vão causar desespero e tristeza.
Por isso eu quero ir só. Vou partir
e encarar, só, tamanho sofrimento,
que, esteja certa, irei resistir,
com sua imagem em meu pensamento”.
Mas Sita retruca: “Não temo nada,
nem tigres, javalis e nem leões,
não temo as asperezas da jornada,
dores, vigílias e desilusões.
Como posso temer bestas ferozes
ou cobra venenosa que desprende
veneno, ou o suplício de algozes
se a força do seu braço me defende?
Meus temores, há muito, já venci
ao abandonar meu pai, meu irmão,
grande amor por você sempre senti
não o abandonarei à solidão!
Compartilharemos, juntos, a sorte,
meu esposo adorado, amo e rei,
juntos, desafiaremos a morte,
onde você for, lá, também, irei”.
Diante de tanto amor, e sem malícias,
de tanto sacrifício e lealdade,
Rama, vencido, cobre-a de carícias,
já sentindo antecipada saudade.
“Com sua lealdade eu já contava”,
Rama observa, bastante comovido,
“e se eu lhe disse que me recusava
a, em fim, ser por você convencido
e levá-la ao exílio detestável,
contra a vontade do meu pai ancião,
queria assegurar-me, ó notável
princesa, da sua resolução.
Pois, se no seu amor você despreza
todos perigos que o destino instala
e que em seguir meus passos muito preza,
bem doloroso seria deixá-la.
Um dia vamos cantar a vitória,
A injustiça cega logo passa,
não é sábio repudiarmos a glória
com que cobriremos a nossa raça!”
Convictos da sua ternura, partiram,
alegres, os esposos, Sita e Rama,
para o exílio, que ambos repartiram
com o irmão, voluntário, Lakshmama.
Transpuseram o Iamuna em jangada
de bambus e, ao monte Tchitrekorita
chegaram, após penosa jornada,
onde a beleza luxuriante habita.
Recoberto de fechadas florestas,
trepadeiras desenhando um dossel,
aves mais aves gorjeando, em festas,
era paradisíaco vergel.
Pavões, de longas plumas, marchetadas,
misturavam-se a trêfegas gazelas
e as árias das “kokilas”, alternadas,
ecoavam, entre flores amarelas.
Os bramidos troantes de elefantes
ouviam-se ao longo de estreitas trilhas,
as luzes deslumbravam os amantes
encantados com tantas maravilhas.
No cenário de selvagem verdor
o casal venerava a natureza,
original paraíso de cor,
que era digno da sua realeza!
“Você vê, ó princesa bem-amada?
Vê este alegre festival de cores?
A natureza semeou sob cada
árvore místico leito de flores!
Às margens da mandeki acontece
das flores, encantado festival,
seu ninho de amor cada ave tece,
visões do Paraíso original!
Sita dos grandes olhos, junto ao rio,
você vê kiçonkas, que estão floridas,
animais copulando em pleno cio
e as regras da vida sendo seguidas?
(...)
Continua
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