Wednesday, November 09, 2016

Trapalhada de Itamar



Pedro J. Bondaczuk


A demissão do ministro da Fazenda, Paulo Haddad, embora tenha surpreendido o País, pela maneira que ocorreu, já era um fato para lá de esperado. O economista mineiro suportou reprimendas públicas do presidente Itamar Franco em, no mínimo, quatro ocasiões, sem que se mostrasse abalado. E o motivo oficial da sua saída nem mesmo foi esse.

Ele deixou o governo em conseqüência do “loteamento” de cargos feito no Banco Central, inclusive com a indicação do deputado Paes de Andrade para um posto que, é evidente, ele não tem preparo técnico para exercer. E provavelmente nem foram as nomeações que tiraram Haddad do sério. Foi a maneira como ele ficou sabendo delas: através de terceiros.

Não poderia, portanto, haver manifestação maior do desprezo do presidente por seu ministro do que esta. “É o estilo Itamar”, tentam justificar os defensores do chefe de governo. Nem todos, contudo, (para não dizer ninguém) estão dispostos a exercer uma função de tamanha relevância como se fossem robôs. É verdade que os antecessores no Ministério da Fazenda, pelo menos durante a gestão de Fernando Collor, dispunham dos rumos da economia a seu bel-prazer, sem consultar quem quer que fosse. Decidiam em nome do presidente e este, em geral, era o último a saber das decisões e muitas vezes até por jornais e noticiários de televisão.

O “estilo Itamar”, todavia, exagera na outra ponta. O presidente parece desconhecer o que seja delegação de tarefas. Representa, para quem não convive no dia-a-dia de Brasília, que ele está perdido, sem um programa que se preze, com um Congresso extremamente lerdo para aprovar medidas urgentíssimas (que quando proteladas, perdem o impacto desejado) e sem grandes conhecimentos da mecânica econômica. Percebe-se, pelas entrevistas que concede, que está angustiado, vendo a inflação fugir do controle e sem saber como deter esta perversa escalada.

As cobranças que Itamar certamente recebe, de todas as partes, devem ser imensas. Daí o presidente querer fazer tudo sozinho, o que, convenhamos, é uma missão literalmente “impossível”. A pergunta que fica no ar é: como será seu relacionamento com o novo ministro, Eliseu Resende?

A escolha dividiu opiniões. De um lado, estão as chamadas “forças conservadoras”, que se desmancham em elogios para cima do novo comandante da economia brasileira. De outro lado, estão os sindicatos e a chamada “esquerda”, temendo que a inflação, que ameaçou fugir do controle neste início de 1993, descambe, de vez, e se instale no País um processo hiperinflacionário.

O temor maior é o de o governo se deixar levar pela tentação de recorrer novamente ao já tão desmoralizado expediente do choque econômico, com congelamento de preços e de salários. Por quanto tempo duraria uma medida desse tipo? Certamente, por menos de 90 dias.

Não há a mínima condição, neste instante, para qualquer tentativa aventureira. Até quando vai durar a lua-de-mel de Itamar com Resende? A de Gustavo Krause não chegou a “emplacar” dois meses. A de Paulo Haddad durou pouco mais, cerca de 150 dias.

O cargo de ministro da Fazenda é tão importante, que já foi ocupado por dois ex-presidentes da República, Rodrigues Alves e Getúlio Vargas e, no período republicano, teve como primeiro titular ninguém menos do que Ruy Barbosa. Seu novo ocupante conseguirá, pelo menos, esquentar o lugar?           

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 3 de março de 1993)


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