Thursday, November 24, 2016

A diferença da era Gorbachev


Pedro J. Bondaczuk


Os ditadores não têm qualquer consideração pelo ser humano, enquanto indivíduo, vendo nele somente um instrumento para incensar a sua paranóia, que costuma ser ilimitada. Ontem, as autoridades soviéticas revelaram um dado estarrecedor acerca de Joseph Stalin. Que ele foi o responsável direto ou indireto pela morte de 20 milhões de compatriotas, durante os expurgos da década dos 30s, isto não é novidade para ninguém.

Que fez pactos indecentes, até com o "diabo", também é de conhecimento público. Que encarcerou milhões, removeu povos inteiros de seus locais de origem para outras partes e cometeu toda a sorte de abusos contra os cidadãos, são fatos vindos à tona, principalmente nesta época de "glasnost", de transparência na União Soviética, nos últimos tempos, em profusão.

Mas essa notícia do terremoto de 1948 na Armênia, a mesma república afetada por um devastador sismo na quarta-feira passada, confirmada ontem pela chancelaria em Moscou, é absoluta novidade. E é aí que se diferencia, basicamente, o estadista (no caso o atual presidente soviético Mikhail Gorbachev) do ditador. Enquanto este interrompeu uma importante viagem diplomática, num momento de triunfo pessoal (bastante merecido) para coordenar as tarefas de socorro aos flagelados, aquele simplesmente impediu que o mundo tomasse ciência da morte de 100 mil criaturas humanas.

Para ele, afinal, essa gente toda não passava de meros números estatísticos, mão de obra barata para atingir as metas de produção de seus mirabolantes planos qüinqüenais. Enquanto o atual líder do Cremlin aceitou de bom grado a ajuda internacional, que veio generosa, já que cerca de 50 países participaram das tarefas de assistência às vítimas da tragédia, o de 40 anos atrás escondeu o desastre da opinião pública.

Certamente tinha vergonha de mostrar seu país à comunidade mundial, já que ele não passava de um Estado policial, dos mais terríveis que já se teve notícia na história humana, que deixou toda uma geração profundamente aterrorizada com os métodos brutais então praticados. Por isso, o presidente norte-americano, Ronald Reagan; a primeira-ministra britânica, Margaret Thatcher; o mandatário francês, François Mitterrand; o chanceler alemão ocidental, Helmut Kohl e tantos outros líderes e estadistas internacionais torcem pelo sucesso de Gorbachev.

Para que a União Soviética jamais volte a viver outro período de terror, pior do que aquele que sucedeu a Revolução Francesa em fins do século XVIII, e deixe de ser uma ameaça à humanidade por causa do seu expansionismo, para se tornar uma parceira na construção de um mundo melhor. E, convenhamos, o atual líder do Cremlin, em apenas três anos de gestão, deu passos gigantescos nessa direção.

(Artigo publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 13 de dezembro de 1989)


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