Juros penalizam microempresários
O presidente José Sarney e vários de seus ministros,
especialmente os da área econômica, têm vindo a público, desde o início do
atual governo, para garantir à sociedade que a base da sua política é a garantia
do crescimento brasileiro (sem recessão), conjugada a um combate inteligente à
inflação. No entanto, na prática, o que está se vendo é algo muito diferente.
O segmento que é responsável por
80% dos empregos neste País está sendo duramente penalizado e está à beira de
um verdadeiro colapso. Trata-se do microempresário, esse indivíduo abnegado e
criativo, que tem servido de tema para tanto político demagogo e que no entanto
está arcando com a maior parte, senão com a totalidade, da atual crise que vem
assolando a nossa economia, principalmente em decorrência do fracasso do Plano
Cruzado.
O principal problema dessa faixa
produtiva nacional (embora n ao o único) reside nas absurdas taxas de juros que
estão sendo praticadas na atualidade. Se muitas empresas médias e de grande
porte, com um capital enorme e com uma soma de recursos internos e externos
quase inesgotável, vêm passando por grandes dificuldades, em razão da brutal
elevação de seus custos financeiros, imagine o leitor o que está acontecendo com
as pequenas e micros.
O pior é que ninguém sabe com
exatidão de quem é a responsabilidade por tamanho descontrole. Se do governo ou
do mercado. O fato é que o nicroempresário há tempos vem emitindo um
desesperado “SOS”, lutando com todas as forças pela sua sobrevivência, e
ninguém o ouve e nem o acode.
Não seria sequer necessário
lembrar para ninguém como nascem estes pequenos, mas sumamente valiosos
empreendimentos. Em geral eles são frutos do espírito criativo do brasileiro.
Muitas dessas empresas surgem apenas da vontade de se fazer algo por própria
conta. Ou seja, são criadas virtualmente do nada.
O capital inicial desse negócio
quase sempre é constituído por algumas parcas economias, juntadas com ingentes
sacrifícios durante anos, e às vezes com o Fundo de Garantia por Tempo de
Serviço, quando seus empreendedores se desligam de seus empregos para enfrentar
esta fascinante aventura, este magnífico desafio.
Boa parte dos microempresários
começa a trabalhar com máquinas que eles próprios inventaram, desenharam e
construíram artesanalmente, com as próprias mãos. Eles já partem, portanto, de
um ponto bastante positivo para o País. Desenvolvem, na pura raça, uma
tecnologia toda nacional, rústica, é verdade, mas muito funcional, economizando
preciosas divisas que deixam de ser gastas no Exterior com o seu instrumental.
Nesta circunstância, nada lhes é
mais vital do que o crédito bancário barato. Se corretamente apoiada, essa
empresa, nascida inúmeras vezes em fundo de quintal, cresce, se desenvolve, se
moderniza e em pouco tempo se torna emérita exportadora.
O microempresário, portanto,
simboliza, com a sua coragem e sua confiança no eterno futuro deste “Gigante
Deitado”, o verdadeiro espírito do brasileiro. Não somos todos uns “Macunaímas”
da vida, estereótipo que nós mesmos nos impomos e até exportamos, criando a
idéia generalizada de que a totalidade dos cidadãos deste País (ou pelo menos a
maioria), só quer saber de carnaval, futebol, cachaça e muita “sombra e água
fresca”.
Há milhões e milhões de pessoas
empreendedoras e corajosas, que não conhecem sábados, domingos e feriados,
descanso ou esmorecimento. Trabalham, trabalham e trabalham e muitas vezes em
vão, por absoluta falta de respaldo oficial.
Ninguém acreditou mais, por
exemplo, no Plano Cruzado, do que o microempresário. O crescimento do poder
aquisitivo de algumas faixas da população (que não foi tão alto quanto
demagogicamente se procurou dar a entender), fez com que houvesse uma explosão
de consumo. Isso levou muita gente a se decidir a criar o seu próprio negócio,
para suprir um mercado hiperaquecido, mas que não podia ser saciado pelo parque
produtivo nacional, defasado em virtude de uma recém superada era de recessão
econômica. Pequenas firmas foram abertas aos milhares em todo o território
nacional e os índices de desemprego, em conseqüência disso, foram emagrecendo,
emagrecendo, até quase desaparecerem.
Os juros praticados então eram
pelo menos racionais e muitos (senão a maioria) desses microempresários
resolveram pensar com grandeza. Fizeram investimentos consideráveis, de
maturação de médio prazo, cujos resultados, caso eles fossem apoiados por uma
política econômica que de fato merecesse este nome e não se resumisse em
apressadas e impensadas improvisações, seriam magníficos.
O Brasil vivia o período
pré-eleitoral e isso parece ter subido à cabeça da equipe governamental. A
súbita popularidade adquirida junto à população cegou nossos dirigentes, que
não fizeram as indispensáveis correções que o programa decretado em 28 de
fevereiro de 1986 requeria. E o barco começou a fazer água.
Quem tinha mais recursos, e que,
portanto, investiu o seu próprio capital, pressentiu a débâcle e teve condições
de se acautelar. Desmobilizou setores inteiros de suas fábricas, dispensou
pessoal e tornou a jogar seu rico dinheirinho na jogatina financeira.
As dispensas não se refletiram
nas taxas de desemprego, porque os grandes empregadores sempre foram os
microempresários (pelo menos em volume). E estes continuaram confiando no
governo até o fim.
E no que resultou essa confiança?
Eles foram “apunhalados” pelas costas. Em questão de dias, os juros
enlouqueceram. Os compromissos a pagar multiplicaram-se por mil, enquanto que
os rendimentos ficaram fixos, congelados. E um magnífico esforço de redenção
econômica nacional foi transformado por um conjunto de pacotes desastrados num
doloroso pesadelo para estes brasileiros que mereceriam estátuas em praça
pública e nunca protestos, concordatas, falências e execuções. Como evitar,
pois, uma recessão numa circunstância dessas?!
(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 8 de março
de 1987).
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment