Crise
do Golfo beneficia oportunistas
Pedro J. Bondaczuk
A relação de líderes políticos, países e
organizações que de alguma maneira obtiveram vantagens com a guerra do Golfo
Pérsico é muito mais extensa do que se possa imaginar antes de uma meticulosa
análise a respeito. Além dos presidentes George Bush, dos Estados Unidos, e
Mikhail Gorbachev, da União Soviética, e François Mitterrand, da França e do
primeiro-ministro britânico John Major; ou de sociedades nacionais como Israel,
Arábia Saudita, Egito, Síria e emirados da zona de conflito, isto sem nunca
esquecer o Irã, o mais beneficiado de todos; além das Nações Unidas e das
entidades que atuam na intermediação da venda de petróleo, há uma extensa lista
de beneficiários a ser avaliada.
Nela, por exemplo, estão a China e a Turquia.
Incluem-se os fabricantes de armas, em especial do Primeiro Mundo e os
free-lancers do comércio armamentista mundial, aqueles que nunca têm causa,
ideologia, pátria ou fronteira e que fornecem seus produtos aos que os possam pagar.
Diversos ex-políticos, já obscurecidos pela bruma do
tempo, tiveram um breve instante de glória ao longo da crise. Casos específicos
foram os dos ex-primeiros-ministros da antiga Alemanha Ocidental, Willy Brandt
e do Japão, Noburo Takeshita, que obtiveram, junto a Saddam Hussein, a
libertação de inúmeros reféns de seus países que serviam de “escudos humanos”
ao presidente iraquiano para evitar algum ataque de surpresa da coalizão
militar liderada pelos Estados Unidos.
A China permaneceu, literalmente, “em cima do muro”
no correr de toda a questão surgida no Golfo Pérsico com a invasão e anexação
do Kuwait. Como membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas,
portanto com poder de veto, poderia impedir a aprovação de muitas das 12 resoluções
contra Bagdá, principalmente a que se referia ao uso da força para expulsar as
tropas invasoras do emirado ocupado. Não o fez.
“Lavou as mãos”, como se costuma dizer, numa
analogia com o gesto de Pôncio Pilatos em relação a Jesus Cristo. Ou seja,
absteve-se em todas as votações. Dessa maneira, ficou bem com os países
ocidentais, junto aos quais sua imagem havia ficado extremamente desgastada
depois da sangrenta repressão ao movimento pró-democracia da Praça da Paz
Celestial de Pequim, em junho de 1989, sem deixar de lado aquela aura que
sempre procurou explorar, de potência “alinhada” com os “não-alinhados”.
De quebra, a linha-dura chinesa aproveitou o fato
das atenções da opinião pública internacional estarem voltadas para o drama que
se desenrolava no Golfo Pérsico, para promover arremedos de julgamentos de seus
dissidentes, mandando a grande maioria para campos de trabalhos forçados,
eufemisticamente denominados “centros de reeducação ideológica”.
A China acabou não ficando mal com ninguém e, aos
poucos, os dólares que haviam parado de entrar no país em virtude da
truculência do governo do primeiro-ministro Li Peng, recomeçam a pingar,
devolvendo um pouco de saúde à sua abalada economia.
Nesse aspecto, Cuba agiu com menor senso de
oportunismo. Foi, durante toda a crise, o voto discordante no Conselho de
Segurança, onde não tem poder de veto e é membro temporário do organismo.
É provável que, politicamente, o gesto de Havana
tenha sido equivocado e até desastroso, mas eticamente foi de enorme coerência.
Por isso, o regime de Fidel Castro, pelo menos no curto prazo, nada lucrou com
a guerra.
(Artigo publicado na página 13, Internacional, do
Correio Popular, em 7 de maio de 1991)
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